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Processos Criminais e Jurisprudências


Luchiano

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Senhores(as)

Aqui será postados acompanhamentos processuais bem como informações complementares e jurisprudência em segunda instâncias, para ajudar os advogados dos usuários em sua peça de defesa.

Como aborda assunto técnico-jurídico, os textos serão ou não, extensos em seu conteúdo.

Serão aceitos tópicos com jurisprudência, sentenças de primeira e segunda instâncias, bem como reportagens de magistrados, promotores e juristas que defendam ou não, a descriminalização da Cannabis.

Fazendo assim, poderemos coletar dados e chegar a um concenso sobre a legislação atual, apontando a sua defasagem com a real conjectura atual, da nossa sociedade.

Obrigado por colaborarem.

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  • Usuário Growroom
Tratamento arcaico

Usuário de drogas não pode ser tratado como traficante

por Edna Dantas

O criminalista Wanderley Rebello Filho, de 48 anos, é casado e tem três filhos. Todos na idade mais temida pelos pais: a adolescência. Formado pela PUC do Rio de Janeiro, o advogado não bebe e não fuma. Mesmo tendo convivido durante anos de sua vida com um grupo barra pesada de Copacabana, bairro da Zona Sul carioca, onde cresceu, garante que nunca experimentou sequer um cigarro de maconha.

Apesar do perfil ortodoxo, Rebello lança nesta segunda-feira, 27, na sede da OAB-RJ, o livro Drogas: por quem nunca usou! – um arrazoado à liberação do uso de entorpecentes. Um paradoxo? Não, responde o advogado. Apenas um apelo ao fim da hipocrisia de quem enfrenta no dia-a-dia dos tribunais o rigor da lei condenando à cadeia jovens usuários, dependentes ou não.

Wanderley Rebello Filho é vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ e idealizou, no ano de 2000, a criação da Comissão de Combate às Drogas e à Dependência Química da entidade que começou a funcionar em 2001. Atualmente é membro do Conselho Penitenciário do Estado do Rio de Janeiro.

No livro de 238 páginas, o autor defende que o uso de qualquer substância entorpecente deve ser liberado, por uma questão de se tratar de auto-lesão, e de isonomia de tratamento, haja vista que outras drogas que causam dependência e são entorpecentes têm seu uso permitido e incentivado, caso do álcool e do cigarro. Além de versar sobre os efeitos das drogas no organismo e de dar dicas de como os pais podem perceber que seu filho é usuário, o advogado conta 11 histórias reais envolvendo o consumo de maconha ou cocaína.

Nesta entrevista à revista Consultor Jurídico, ele defende que o uso de entorpecentes saia da lei, critica o Judiciário por suas posições retrógradas e afirma: “estou pouco me lixando para o traficante. Eu estou preocupado é com o usuário”.

Leia a entrevista

Conjur – Por que o senhor decidiu escrever um livro defendendo a liberação do uso de drogas?

Rebello Filho – Uma das razões são meus filhos adolescentes. Tenho três filhos nessa faixa etária. É sempre um incentivo a gente mostrar um outro lado dessa história. No entanto, o principal motivo é que eu milito na área criminal e já vi muita injustiça acontecer por causa dessa diferença entre crime de tráfico e crime de uso de entorpecentes. Além disso, perdi mais de dez amigos que morreram por causa do uso de drogas. Eu sempre pensei que um dia iria escrever um livro com a visão de alguém que nunca usou. Queria contar como consegui escapar, falar do que pode ter contribuído para que eu escapasse, apesar de ter convivido de perto, a vida inteira e principalmente na adolescência, com o uso de substâncias entorpecentes.

Conjur – O senhor nunca usou?

Rebello Filho – Nunca usei nem experimentei. Eu andei numa turma muito barra pesada em Copacabana e mesmo assim sempre escapei. Nunca sequer provei maconha, cocaína. Não bebo, não fumo. Não consumo drogas lícitas nem drogas ilícitas. E nunca entendi essa diferença.

Conjur – O senhor é favor da liberação do uso de drogas?

Rebello Filho – Eu sou a favor da liberação de qualquer droga. Independentemente de eu ser ou não favorável, de ser ou não crime, as pessoas vão consumir do mesmo jeito. Isto está na história do ser humano. Isso vem de milhares de anos. Não é de agora. A única diferença de centenas de anos atrás para agora é que alguém resolveu que determinados tipos de drogas não podem ser usados, é crime, e outras, podem. Eu não consigo entender isso. Já procurei pessoas que pudessem me explicar – médicos, juristas, psiquiatras, ministros –, mas ninguém me dá uma explicação lógica. Por exemplo: por que o álcool que está enquadrado na lei de crimes não é proibido. Porque a lei diz o seguinte: usar ou traficar substância entorpecente que possa causar dependência física ou química é crime. O álcool é substância entorpecente que pode causar dependência, e causa. Então por que ele não é proibido e a maconha é? E a maconha tem muito mais dificuldade em causar dependência do que o álcool. E ela é muito menos entorpecente do que o álcool.

Conjur – Como o senhor analisa a legislação brasileira que trata desse assunto?

Rebello Filho – Na minha opinião, a legislação, assim como o nosso comportamento, e eu me incluo aí, é hipócrita. Eu sou advogado de dezenas de rapazes, de adultos, que compraram droga para consumir com a namorada, com os amigos, e foram acusados de tráfico de entorpecente. Isso porque a lei diz que você dar, fornecer gratuitamente, trazer consigo, emprestar, isso é tráfico. No ano passado, eu defendi um garoto de 18 anos que viajou de carro para Cabo Frio (RJ), fumou maconha, chegou lá e como sobrou um pedacinho de cigarro, ele deu para um amigo. A polícia deu uma batida na casa, encontrou aquele cigarro de maconha, perguntou de quem era e o amigo disse que tinha sido o meu cliente que tinha dado. A pessoa que ficou com o cigarro para usar não foi nem processada. O meu cliente foi preso por tráfico de entorpecente por causa de um cigarro de maconha que ele deu para o amigo.

Conjur – Ele ficou preso?

Rebello Filho – Ficou. Ele foi acusado de tráfico e ficou quase três meses preso. Até o juiz se tocar que ele não era traficante e desclassificar para o uso.

Conjur – No seu livro, o senhor fala sobre a questão da corrupção policial e as conseqüências disso na aplicação da lei.

Rebello Filho – Esse é o lado mais perigoso dessa história. Porque fica a critério da autoridade policial dar a primeira definição jurídica ao fato. O que acontece muitas vezes é que se numa situação como a vivida pelo meu cliente o policial fosse corrupto, ele diria: “olha aqui, eu vou te enquadrar no uso e você me dá uma vantagem qualquer”. E se o rapaz não tiver para dar, o que acontece? E isso ocorre várias vezes. O policial vai enquadrá-lo como tráfico de entorpecentes. Porque além da hipocrisia, além da corrupção, existe a maldade. Muita gente continua sendo presa ou extorquida por causa dessas falhas gritantes na lei.

Conjur – O que o senhor propõe?

Rebello Filho – O uso de substância entorpecente tem que ser tratado pela área de saúde. Seja pelo ministério da Saúde, pelas secretarias de saúde. Quem tem que ver isso não é juiz nem promotor. Eles não têm preparo para avaliar isso. Tem preparo para julgar, para avaliar leis. A lei não pode tratar de usuário. Ela tem que tratar do traficante. Uma figura que vai continuar existindo de qualquer forma.

Conjur – Qual seria, então, a definição de traficante?

Rebello Filho – O traficante vive do comércio da droga. Não é o garoto que pegou no morro para fumar com os amigos. Isso não é tráfico. Ele não está obtendo vantagem pecuniária. O traficante vive da mercancia, do mercado do tráfico, da compra e venda. É totalmente diferente. A polícia sabe quem é traficante e quem não é. Só que em razão dessa lei absurda que está aí, eles continuam prendendo garotos que não são traficantes. São usuários que compraram e dividiram com os amigos. E o que eu ouço de juízes e promotores até hoje? Lei é lei. Dura Lex Sed Lex. Outro dia mesmo, no Conselho Penitenciário, eu ouvi de um promotor de Justiça que para o usuário essa lei era muito branda. Que o usuário tinha que estar na cadeia juntamente com o traficante. Essa mentalidade ainda existe. Mas nada impede que aquele mesmo promotor que teve aquela opinião saia dali e tome um porre. Eu não entendo isso. A única explicação que me dão é que álcool paga imposto. Eu quero que me digam qual é a diferença. A hora que acabarem com a maconha e a cocaína, inventa-se outro tipo de droga. Vão produzir drogas sintéticas. Hoje em dia tem o ecstasy, tem uma nova que é feita de fita cassete. A criatividade do ser humano para se dopar existe desde que o mundo é mundo.

Conjur – Mas afinal, o que o senhor defende de fato: uma lei que apenas diferencie o traficante do usuário ou a simples liberação? Ou seja, seria possível comprar maconha ou cocaína como se compra álcool?

Rebello Filho – Uso de substâncias entorpecentes sai da lei. Isso é caso de hospital público: federal, estadual e municipal. E quem vai cuidar do traficante é juiz e promotor. Pode trancar na cadeia e jogar a chave fora que eu concordo. Esquece o usuário. O usuário, se ele estiver usando na rua, a polícia não pode prender. A minha sugestão é que no futuro o poder público, através de suas clínicas credenciadas, de seus hospitais credenciados vendam essas substâncias. O que ele apreender na mão dos traficantes, pega aquela mercadoria, se ela for boa, e vai negociar.

Conjur – O senhor está falando do usuário dependente?

Rebello Filho – Não. Estou falando de todos. Do usuário social, do esporádico, do dependente. Se ele quiser comprar a maconha dele, ela vai no lugar certo. Na farmácia, na clínica, no hospital. Isso teria, claro, que ser regulamentado. Qual o ponto positivo nisso tudo? A partir do momento que não é mais crime, esse usuário pode comprar em um lugar credenciado, e pode receber um panfleto educacional como acontece com o cigarro. As pessoas descobriram que o cigarro é uma substância que causa dependência e mata. Fora as doenças decorrentes – todos os tipos de câncer. Hoje em dia não se vê mais anúncio de cigarro na televisão. O álcool mata mais do que todas as outras drogas. Talvez menos do que o cigarro. As crianças estão começando a beber com 10, 12 anos. Está nas estatísticas. Maconha, cocaína, vai tudo pagar imposto também. Só que vai possibilitar a aproximação do usuário. Ele vai ser mais facilmente educado, vai mais facilmente receber a mensagem negativa com relação àquela droga, vai mais facilmente se submeter a um tratamento. Todos os usuários dependentes que eu conheço têm medo de se credenciar numa clínica, de se inscrever em um programa. Por quê? Ele não quer se identificar. Afinal, ele é um criminoso. Então, no momento que deixar de ser crime, o usuário se aproxima. Eu estou pouco me lixando para o traficante. Eu estou preocupado é com o usuário.

Conjur – O senhor acredita que a sociedade aceitaria uma proposta como esta sua?

Rebello Filho – Dificilmente. Nós temos um Poder Judiciário muito retrógrado. A gente vê jovens promotores e juízes com esse pensamento arcaico. Assim como eu canso de ver juiz que eu sei que fumou maconha, cheirou cocaína, que eu conheço, e que hoje condena um usuário na maior tranqüilidade. Qual o argumento que ele dá: “mas eu não fui preso”. Não dá para aceitar esse tipo de coisa. Nós temos dogmas religiosos, religião nenhuma aceita isso. Eu sei que essa minha posição é perdida. Vai ser muito difícil combater esse pensamento já arraigado contrário ao qualquer liberação, mas de uma coisa eu tenho certeza: o sistema atual que combate entorpecente é completamente falido. Ninguém tem dúvida disso. Ninguém se recuperou indo para a cadeia. Isso é indiscutível. O sistema prisional brasileiro é falido e ninguém procura opções. Eu tenho certeza, e talvez eu nem esteja vivo para ver, mas esse pensamento vai mudar em relação ao consumo de drogas. Primeiramente porque é um direito de escolha, é uma opção, é garantia constitucional essa liberdade de escolha, e o uso de entorpecentes é no máximo uma auto-lesão.Você não prejudica ninguém usando entorpecente. Muito pelo contrário. Você prejudica muito mais bebendo álcool e dirigindo do que fumando maconha ou cheirando cocaína.

Revista Consultor Jurídico, 26 de junho de 2005

Edna Dantas: é editora especial da revista Consultor Jurídico no Rio de Janeiro

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Justiça Terapêutica

Juiz e promotor defendem não prender usuários de drogas

O juiz Luiz Felipe Paim Fernandes defendeu nesta terça-feira (27/5), em Cuiabá (MT), a aplicação da Justiça Terapêutica como uma solução para o problema do crescente uso de drogas no Brasil. O juiz, que responde pela 8ª Vara Criminal de Porto Alegre (RS), chegou a afirmar que não tem sentido colocar o usuário de drogas no presídio. Para ele a Justiça Terapêutica, um instrumento previsto na Lei 6.368/76 já previa o tratamento do usuário como política pública. "Não é a descriminalização mas a adoção de uma pena que seja o tratamento visando a recuperação", defendeu.

Durante a II Capacitação em Justiça Terapêutica, um treinamento que visa aprimorar as relações de pequenos infratores com a Justiça, Paim Fernandes disse acreditar que a mudança de consciência que se nota no Brasil de hoje é favorável à mudança de atitude com os viciados. "Não tem sentido colocar o usuário de drogas no presídio", admite. Para ele os presídios superlotados não oferecem condições de recuperação.

"Temos que pensar que ao aplicarmos uma pena que remete ao tratamento estaremos resolvendo não apenas o processo, mas também o problema", argumentou, explicando que esta é uma situação moderna para um velho problema.

Outro juiz de Direito presente no evento, Mário Kono, do Juizado Especial Criminal de Cuiabá, defendeu a alternativa de pena contra a descriminalização do uso de drogas. "Tenho o entendimento de que a coercividade da lei vai levar ao tratamento porque o que faz o usuário se tratar, normalmente é o medo de ir para a cadeia", disse.

Na mesma linha de opinião, o promotor de Justiça Rui Paulo Nazário defendeu a Justiça Terapêutica como o desvio de um processo punitivo para processos terapêutico e pedagógico. "Nossas prisões superlotadas são uma escola do crime. E aí está nosso problema. O usuário de drogas infringiu a lei mas não agrediu a sociedade tão violentamente e nós vamos mandá-lo para o presídio?" Para ele isto cria um drama de consciência em juízes e promotores de todo o país.

"Este dilema é resolvido com a Justiça Terapêutica porque tudo o que o usuário de drogas precisa é se tratar. É uma medida que dê condições a ele de se livrar do vício", sustentou.

Ricardo de Oliveira Silva, procurador de Justiça do Rio Grande do Sul e presidente da Associação Nacional de Justiça Terapêutica, acredita que alternativa poderia resultar até em economia do Estado. "Quando se aplica a pena o que pode se antever é a reincidência. No entanto, quando se encaminha para o tratamento a pessoa não volta a delinqüir, na medida em que o problema que o levou ao delito está resolvido", argumentou.

"O problema é a dependência e é isto que temos que resolver através da Justiça Terapêutica", afirmou a psiquiatra Carmen Có Freitas. Segundo ela, "ninguém fica dependente com um copo de bebida ou uma experimentação de droga. A dependência se dá quando este ato se torna repetitivo. Então é precisa promover uma mudança de hábitos no usuário para afastá-lo da dependência. E a Justiça Terapêutica pode contribuir muito para isso."

O presidente do Conselho Estadual de Entorpecentes (Conen) de Mato Grosso, José Antônio Vieira, justificou o evento como uma forma de debater a importância de um processo de tratamento em vez da simples desintoxicação. "Este processo será colocado em prática no Centro de Tratamento de Reeducandos de Álcool e Outras Drogas, uma instituição que além de fornecer o diagnóstico por meio de um corpo clínico de profissionais da área de Saúde, também irá desenvolver o processo de tratamento a partir de atividades que culminem na reinserção social do usuário abusivo de álcool e outras drogas". O Centro está com suas instalações físicas prontas e agora define uma equipe para compor o corpo de saúde. (Conem-MT)

Revista Consultor Jurídico, 27 de maio de 2003

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Configura crime descrito no art. 12, § 1.º, II, da Lei n. 6.368, de 21 de outubro de 1976, manter plantação de maconha para uso próprio?

Há três orientações na jurisprudência:

1.ª) Tendo em vista que a Lei n. 6.368/76 não define expressamente a ação de semear, cultivar ou fazer a colheita de substância destinada à preparação de entorpecente para uso próprio (1), o fato subsume-se na figura do art. 16 (porte para uso próprio) e não no 12, § 1.º, II (cultivo para uso próprio) (2). Essa corrente jurisprudencial, amplamente vencedora, aplica, segundo seus fundamentos, a analogia in bonam partem (3).

2.ª) O fato se enquadra no art. 12, § 1.º, II, da Lei n. 6.368/76 (4). Para essa orientação, a "lei não distingue se o agente semeia, planta e colhe para seu uso ou para terceiros" (5).

3.ª) O fato é atípico. Para os partidários dessa posição, o juiz não pode lançar mão da analogia para criar delito que não esteja expressamente previsto em lei. Não está descrita na lei penal a conduta de cultivar maconha etc., para uso próprio, por isso não há crime (6).

Para nós, a conduta de semear, cultivar ou fazer a colheita, para uso próprio, de substância destinada à preparação de entorpecente, como a maconha, não está tipicamente definida como crime no art. 12 da Lei Especial. É atípica (7). E não há crime sem lei que o defina (CF, art. 5.º, XXXIX; CP, art. 1º). Além disso, não se pode enquadrá-la no art. 16 por analogia in bonam partem. A analogia empregada não é in bonam mas sim in malam partem. Sendo atípico o fato, enquadrá-lo no art. 16 por semelhança é prejudicial. E a analogia não pode ser empregada para prejudicar o autor de crime. Ademais, havendo dúvida, deve ser adotada a interpretação mais favorável ao agente.

isto segundo Damasio E. de Jesus

"... o simples usuário de um produto entorpecente não é um delinqüente e não pode ser tratado como um bandido. Aliás, sob este aspecto, é bom lembrar que, na maioria das vezes, adolescentes tornam-se delinqüentes para saciar a ânsia da dependência que, por certo, os atormenta." (Brayan Akhnaton)

A Lei n.º 6.368, de 21 de outubro de 1976, mais conhecida como Lei Antitóxicos, oferece em seu bojo um tema cada dia mais atual e preocupante, exigindo seriedade no seu tratamento por parte das nossas autoridades pátrias. Este diploma legal, de maior interesse no cenário jurídico e político contemporâneo deve ser discutido à luz das crescentes tratativas dispensadas pelos nossos tribunais e a necessidade de uma maior atenção e dedicação do Poder Público no controle do tráfico e uso de substâncias entorpecentes.

Este tratado legal dispõe sobre medidas de prevenção e repressão ao tráfico ilícito e uso indevido de substâncias entorpecentes ou que determinem dependência física ou psíquica.

Grande objeto de discussão doutrinária passou a ser o artigo 16 desta lei, que devido a sua redação pouco esclarecedora e porque não dizer, confusa, leva às pessoas as mais variadas interpretações, inclusive, levando os doutrinadores mais renomados defender posições completamente diferentes entre eles.

Em se tratando desta problemática, o objetivo deste estudo será analisar estas diferentes correntes doutrinárias de forma sucinta e clara, buscando subsídios junto à jurisprudência e ao final expressarmos nossa opinião pessoal.

Preceitua o artigo 16 da mencionada lei :

" Adquirir, guardar ou trazer consigo, para uso próprio, substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar :

Pena – detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e pagamento de 20 (vinte) a 50 (cinqüenta) dias-multa."

Em uma primeira análise superficial, parece que o legislador quis punir com este artigo o usuário, diferentemente do artigo 12, onde procurou punir o traficante.

Mas, será que é bem isto. Vejamos outras questões :

a) Quem o legislador esta querendo punir com o delito do art. 16 da lei antitóxicos ? É a pessoa do viciado, ou seja, o dependente da droga ? Ser viciado é crime ?

cool.gif Se não for o viciado, quem está querendo punir ?

c) Ou o legislador quer punir a divulgação dos tóxicos ?

d) Afinal, o que o legislador pretende com este artigo ?

As condutas típicas deste delito são adquirir, quer dizer obter gratuita ou onerosamente, isto é, passar a ter a posse de (algo) mediante compra, troca, oferta, etc.. Guardar, significa conservar, manter, vigiar com o fim de defender, proteger ou preservar. Trazer consigo, indica o porte da substância. Há, porém, uma grande distinção doutrinária, no verbo adquirir o delito é instantâneo; nas condutas de guardar e trazer consigo, é permanente.

O sujeito ativo deste delito pode ser qualquer pessoa; o sujeito passivo, a coletividade e a consumação ocorre com a realização das condutas definidas no tipo. A tentativa pode ser admitida na aquisição, porém é inadmissível nas hipóteses de guardar e trazer consigo.

Vicente Greco Filho, em seu livro Tóxicos-Prevenção-Repressão, faz menção a Lei n.º 5.726, que por sua vez, repete a fórmula do Decreto-lei n.º 385, eliminando a dificuldade de enquadramento deste delito.

A nova lei buscou dar àquele que pratica uma das condutas tipificadas neste artigo, um tratamento mais benigno do que àquele que pratica os mesmos atos, porém com outra finalidade, p. ex., tráfico.

Entretanto, como defende o autor, não se trata de punição mais branda para o viciado. Como pode-se perceber, a lei não pune o vício em si mesmo, pois não há uma tipificação da conduta de "usar"(1).

Situação semelhante ocorre com aquele indivíduo que faz uso de entorpecentes em momento anterior à sua prisão; se a droga não estiver sob sua "guarda" ou vigilância - "trazer consigo", impossível será enquadrá-lo na ação típica incriminada(2).

O mesmo acontece com a conduta de fumar maconha. O simples ato de consumir a erva e ter a sorte de não ser surpreendido com a mesma em seu poder, também não há como enquadrá-lo no tipo penal(3).

A razão jurídica implícita no artigo 16 da lei é a caracterização do perigo social que esta conduta representa. É de bom alvitre, que aquele usuário, detentor da droga, mesmo sem tê-la consumido, coloca a saúde pública em perigo, pois torna-se um fator decisivo na difusão/distribuição dos tóxicos. Entretanto, acolhendo a posição sustentada pelo Desembargador José Luiz Vicente de Azevedo Franceschini (in RT, 476:287), apenou com considerável brandura aquele que traz consigo para uso próprio, aceitando que este perigo social supra-mencionado é menor que o causado pelo traficante.

A solução é justa, entretanto traz dificuldades jurídicas na prática, havendo um concurso de infração entre os arts. 12, 13 e 16 quando a pessoa do viciado se confundir com a do traficante. Neste caso, prevalece o delito mais grave, ficando absorvido o delito de menor potencial ofensivo, no caso o tipificado neste art. 16.

A incidência deste artigo só pode ocorrer nas condutas de "adquirir", "guardar" e "trazer consigo" quando a finalidade for exclusiva para uso próprio e não quando desviada para fornecimento à terceiros.

Outro problema a ser mencionado, é o referente à prova da destinação para uso próprio. O próprio Decreto-lei n.º 385, tinha como critério único de distinção a quantidade, o que não deixa de ser um critério muito relativo. Porém, como bem frisa Vicente Greco, que as maiores dificuldades que a própria jurisprudência enfrenta é o fato de que nem a pequena quantidade nem o exame psiquiátrico é suficiente para a conclusão a respeito da finalidade que determina a incidência da infração mais leve(4).

Portanto, os tipos penais deste artigo, segundo o ilustre autor Vicente Greco, são comportamentos que geram um perigo à sociedade que a norma penal procura evitar. Por sua vez, a conduta "plantar" pode ser enquadrada como crime do art. 16, desde que se prove que seja para consumo próprio.

A objetividade jurídica deste delito inclui-se, da mesma forma que o artigo 12, entre os que ofendem a segurança pública, sob o particular aspecto da saúde pública. Este crime é descrito como de perigo abstrato, pois não exige a ocorrência do dano, sendo, portanto, o vício por si não passível de punição.

Será sujeito ativo qualquer pessoa que pratique uma das condutas tipificadas no tipo penal, portanto não se trata de crime próprio, isto é, a ação não é exclusiva de determinadas pessoas.

Por sua vez, sujeito passivo é toda a sociedade (coletividade).

Com base em decisão do Supremo Tribunal de Justiça(5), o fato de alguém portar entorpecente, mesmo que não tenha experimentado, configura a infração do artigo 16 da lei, sendo que a quantidade da droga não desnatura o delito, mesmo sendo ínfima. Neste sentido, transcrevemos o julgado do TJRGS, Terceira Câmara Criminal, Apelação crime n.º 694182106).

"Réu que portava um cigarro de 0,5g de maconha, para uso próprio. Crime de perigo que é, vinculado que está ao risco social que pode causar, pondo em ameaça a saúde pública, independentemente da lesividade que possa ter, no caso concreto, desimporta a quantidade da droga, para caracterizar-se o crime. Precedentes jurisprudenciais. Apelo desprovido."(6)

A lei de tóxicos não foi suficientemente clara com relação ao ato de "fumar" ou "utilizar" as substâncias entorpecentes. Ocorre que, o indivíduo que "fuma um cigarro de maconha", necessariamente está "trazendo consigo", o que já basta para enquadrá-lo no tipo penal(7). A não ser que, em uma hipótese remota, alguém estaria segurando o cigarro de maconha para outra pessoa se drogar, neste caso, não haveria como enquadrá-lo no tipo do delito. Em sentido contrário, considera o fato atípico Damásio de Jesus, como veremos mais adiante.

Em se tratando de fato pretérito, muitos julgados(8) têm considerado como sendo fato atípico a responsabilização a título do artigo 16, sem que tenha havido a apreensão do objeto material, jamais seria possível a tipificação exigida por lei, pois não haveria como comprovar a natureza entorpecente da substância, o que poderia ocorrer mediante exame químico-toxicólogico, buscando identificar a presença do princípio ativo da droga.

Como já falamos anteriormente, trata-se de crime de perigo abstrato, todavia a consumação deste artigo ocorre quando a conduta do agente consubstancia-se com um dos verbos do tipo penal(9), independente da ocorrência de dano físico ou psíquico a alguém.

Com relação a pena, existia uma divergência jurisprudencial sobre a possibilidade de aplicação do § 2º do art. 60 do código penal neste artigo da lei 6.368/76, angariando a substituição da pena privativa de liberdade por pena de multa, o que foi solucionado com a edição da Sumula n.º 171 do Superior Tribunal de Justiça, que preceitua :

"Cominadas cumulativamente, em lei especial, penas privativas de liberdade e pecuniária, é defeso a substituição da prisão por multa."

Por sua vez, Damásio de Jesus defende que a Lei n.º 8.072/90 (crimes hediondos) não se aplica às figuras típicas do artigo 16, em razão destas não se enquadrarem na qualificação de "tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins" (arts. 2º, caput e 8º da Lei dos Crimes hediondos).

Há, neste artigo, a caracterização de uma norma penal em branco, pois o legislador quando mencionou "... substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica ...", não especificou nesta norma quais seriam as tais substâncias, deixando, portanto, para ser feito em leis esparsas, portarias, etc. Com relação a nomenclatura da substância, é irrelevante o seu nome comercial, devendo se considerado a composição química, portanto, o princípio ativo.

Para configurar o crime, é preciso que esta conduta seja praticada " ... sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar ...". Contudo, não existindo estes preceitos, estamos diante de um fato atípico, sem previsão legal. Por exemplo, se um indivíduo adquirir droga com receita médica(10).

Em se tratando de elementos subjetivos do tipo penal, podemos separá-los em dois grandes pontos : 1º Dolo e o 2º "para uso próprio". No primeiro deles deve levar-se em consideração o conhecimento; conhecimento este de que se trata de substância entorpecente e de que o ato esteja sendo praticado sem a devida autorização ou em desacordo com determinação legal. Seguindo esta linha, faz-se necessário que o agente saiba de que se trata de entorpecente ou afins. O segundo elemento subjetivo do tipo, é imprescindível caracterizar-se que seja para uso próprio, senão estaremos diante da previsão legal do artigo 12 e não deste artigo 16(11).

Poderíamos ainda indagar se a intenção de usar, adquirir ou guardar a droga, configuraria o delito ora mencionado. Intenção significa vontade, desejo, propósito, portanto, em nenhuma destas condutas, desde que por si mesmas e não seguidas de atos executórios, de forma alguma poderiam ser punidas, pois a simples vontade não configura crime algum. Neste sentido, (RT 616:350 e RT 583:333).

Muito interessante ressaltar as considerações feitas pelo Prof. Damásio, no que se refere ao simples uso da droga. Neste sentido, há duas hipóteses a serem discutidas : 1º O fato é atípico, portanto o simples uso do entorpecente ou substância análoga não constitui delito; 2º O fato constitui a infração do artigo 16. O ilustre professor defende a posição levantada na primeira hipótese, da seguinte forma : "Se o uso pessoal constituísse delito não seria preciso definir como crime o fato de induzir ou instigar alguém a utilizar-se da droga (art. 12, § 2º, I, desta lei), uma vez que aplicar-se-ia ao indutor ou instigador a norma do art. 29 do CP (concurso de pessoas). Ele seria partícipe do crime de uso (se a conduta de uso estivesse descrita no art. 16"(12).

Ocorre que esta consideração do Prof. Damásio leva em conta o uso da droga em um meio onde estão 2 ou mais pessoas, o que poderá configurar o induzimento ou instigação ou até o concurso de pessoas. Mas vejamos, e o usuário; o verbo "usar" no tempo presente, via de regra, pode ser interpretado como "trazer consigo", salvo exceções em que no indivíduo é injetado droga sem estar na posse dela.

E, afinal, como devemos tratar o uso passado. Há duas correntes neste sentido: 1ª) Não há delito, pois inexistiria um perigo atual à saúde pública(13); e 2ª) Há crime(14). Damásio defende sua posição de que tecnicamente a 1ª corrente é a mais correta, pois não existe um perigo atual à saúde pública, mas o passar do tempo não exclui o fato de que a sociedade em algum instante foi lesada.

O que ocorre na prática, é a real dificuldade de obter-se prova do crime, exigindo exames periciais e toxicológicos que demonstrem a existência do princípio ativo da droga.

Com relação a este aspecto fica uma questão : O delito sendo praticado no verbo passado não configura crime por não haver previsão legal, contudo o intuito da norma é preservar a saúde pública e a sociedade, logo não configura um risco à sociedade o indivíduo estar sob efeito de tóxicos ? Mais à frente voltaremos a este tópico, em nossas conclusões.

A excelente obra Leis penais especiais e sua interpretação jurisprudencial, coordenada pelos mestres Alberto Silva Franco e Rui Stoco nos auxilia em preciosas conclusões.

Como já comentamos anteriormente, a razão jurídica da sanção prevista neste artigo, é ditada pelo perigo social que a conduta do agente representa. Este tipo penal, alcança tão somente o usuário, podendo ser habitual ou eventual, ou até o experimentador primário, sujeitos a uma apenação mais branda.

A tipicidade da conduta deste delito foi muito bem exposta pelos autores desta obra, como vejamos :

" As drogas não causam apenas dano pessoal, mas também social. O perigo que a lei pretende tutelar é primordialmente o coletivo. É crime de perigo abstrato. Se o tráfico criminoso alimenta e difunde o vício, este, sem dúvida, àquele mais acoroçoa. Ademais, a prevenção e repressão do tráfico ilícito e do uso indevido de tóxicos é dever de ordem geral, segundo dispõe o art. 1º da Lei especial. O alcance da norma incriminadora foi ampliado, agasalhando as condutas adquirir e guardar, além de trazer consigo, o que denuncia a preocupação do legislador quanto ao objeto do delito."(15)

Entretanto, alguns julgados entendem que o simples ato de alguém ser surpreendido, por exemplo, "fumando droga" configura uma atipicidade da conduta, pois partem do princípio de que o uso por si só é irrelevante sob o ângulo penal. Assim, se o agente for surpreendido consumindo droga, desde que não detém, porta ou traz consigo a substância proibida, levando-se em conta a previsão legal, o fato é penalmente atípico, portanto inexistindo risco para a coletividade ou saúde pública, lesionando-se a si próprio.

Vejamos as opiniões/estudos sustentados pelos professores Menna Barreto e o Desembargador Luiz Vicente Franceschini em conjunto com o Juiz Euclides B. de Oliveira. O primeiro observa que este dispositivo legal atém-se ao infrator que é levado, influenciado ao uso da droga "por curiosidade, influência do grupo afinitário, necessidade de escapismo ou qualquer outra causa, mas que não apresenta a periculosidade daquele que trafica nem a compulsoriedade física ou psicológica de dependente". Os demais defendem em estudo publicado "Das penas na legislação antitóxicos – Sugestões para o aperfeiçoamento do sistema", tratamento especial para os chamados "experimentadores primários" – ou para o infrator que traz consigo o tóxico, para o próprio consumo.

Na minha opinião, esta síntese do parágrafo acima é de uma enorme riqueza, ou seja, se o legislador não quis punir o usuário, mas evitar que a sociedade e a saúde pública sofra danos maiores causados por este, porém, sem sombra de dúvida este consumidor da droga direta ou indiretamente causa um desconforto aos cidadãos, nada mais racional de que o legislador auxilie, dê condições e oportunidades para maiores esclarecimentos àquele usuário que está começando a consumir ou experimentando a droga.

Por sua vez, citando Heleno Cláudio Fragoso, o usuário deve ser punido, seja ou não viciado, como transcreve "trata-se de um dos lamentáveis equívocos", da lei especial.

Vejamos a posição de Heleno Fragoso, este usuário deve ser punido, mas de que forma ? A simples punição adiantaria alguma coisa ? O indivíduo deixaria de ser viciado se fosse punido ? Continuo a sustentar que a solução não é tão simples. Se fosse simplista assim, bastaria inserir um parágrafo neste artigo ou mudar sua redação, que tudo estaria resolvido. Simplista por simplista, sou mais da opinião de incluir nos currículos escolares, durante o ano letivo, uma matéria sobre toxicologia, que abordasse todos os aspectos referentes às drogas e seus impactos.

Na obra de Brayan Akhnaton(16), o autor levanta algumas questões atuais, que enriquece sobremaneria este estudo.

Em uma primeira análise, detêm-se à questão sob seu prisma jurídico, diante do conflito que se apresenta ao Promotor de Justiça, responsável por denunciar ou não o dependente; e ao Magistrado, por condená-lo ou absolvê-lo. Por força da legislação vigente, não cabe a eles, discutir se o dependente é transgressor ou vítima. Vítima da família, dos amigos, da sociedade ou dele mesmo. Provado o fato previsto no tipo penal da legislação especial, deve o Promotor de Justiça oferecer a peça inicial da ação penal e ao Magistrado condená-lo.

Entende o autor, que o simples usuário de um produto entorpecente não é um delinqüente e não pode ser tratado como um bandido. Aliás, sob este aspecto, é bom lembrar que, na maioria das vezes, adolescentes tornam-se delinqüentes para saciar a ânsia da dependência que, por certo, os atormenta.

Em uma outra análise, o portador de grande quantidade de substância entorpecente seria qualificado como traficante e o que detêm pequena quantidade, dependente. Entretanto, esta separação não pode ser encarada como uma verdade absoluta, pois comporta as suas exceções, nem sempre solucionando a dúvida por completo.

A lei antitóxicos, por si só, não equipara a figura do traficante com o usuário, entretanto, na sua opinião, com a qual somos partidários, o consumidor deve ser auxiliado, não perseguido.

O usuário, previsto no art. 16, está sujeito a uma pena reduzida de 6 meses a 2 anos de detenção. Como não existe o mesmo rigor estabelecido para os traficantes, o consumidor preso em flagrante pode obter liberdade provisória, com ou sem fiança, sendo esta arbitrada pela autoridade policial, logo após a prisão. Ou seja, fica livre enquanto o processo estiver em andamento. A prisão preventiva, neste caso é praticamente impossível, tomando por base o artigo 313 do código de processo penal.

Mesmo condenado, dificilmente o usuário cumpre a pena privativa de liberdade. Isso porque pode obter a suspensão condicional da pena (sursis), ou a substituição da prisão por restrição de direitos, ou até por multa (esta, aceita parcialmente pela jurisprudência).

O que expomos acima, fica claro visualizar neste seguinte julgado :

"Tóxico – Lei 6368/76 – Pena – Substituição da pena privativa de liberdade por multa – Admissibilidade – Incluída a multa substitutiva entre os preceitos gerais do Cód. Penal, é mais do que evidente que tal instituto, desde que não contrariado expressamente em qualquer lei penal, se estende supletivamente a todo direito penal não codificado. ( ... ) os preceitos secundários do Art. 16 da Lei 6368/76 (posse de entorpecente), porque a pena de 6 meses, sendo aplicada, e o réu reunindo as condições de natureza subjetiva estabelecidos nos incs. II e III do Art. 44 do CP deve ser favorecido com tal hipótese. Neste caso, impossibilitada a cumulação da multa substitutiva com a pena pecuniária cominada no tipo especial, pois isto significaria evidente contradição com a própria idéia de suficiência e evidente exagero punitivo."(17)

Reproduzimos a seguir, o julgado RT 557 de março de 1982 do Tribunal de Justiça de São Paulo, que entendemos contribuir com idéias/posições atuais acerca deste controvertido assunto :

" CRIME CONTRA A SAÚDE PÚBLICA - Porte de entorpecente – Delito não configurado – Acusados detidos quando se dispunham a fumar cigarro de maconha fornecido pelo co-réu – Fato atípico – Absolvição decretada – Voto vencido – Inteligência do art. 16 da Lei 6.368/76."

"Fumar maconha ou outro produto entorpecente não se enquadrava na proibição do art. 281 do CP e nem se enquadra na do art. 16 da vigente Lei Antitóxicos, que, em sua longa enumeração taxativa de ações que emoldura, não inclui aquela. O verbo "Fumar" em momento algum é mencionado no dispositivo legal citado. ( ... )

Ao tempo em que o delito em exame estava enquadrado no Código Penal decidiu este Tribunal que "não pune a lei o agente por haver feito uso de entorpecente em momento anterior à sua prisão, mas, sim, pela posse do mesmo, ainda que para uso próprio. Se alguém fuma maconha, mas, quando surpreendido, não a conduz consigo, nem a guarda, impossível será enquadrá-lo na ação típica prevista no art. 281 do CP." (RT 431/281) ( ... )

Comentando a Lei 6.368/76, observa Vicente Greco Filho que o diploma antitóxicos, da mesma forma que a legislação anterior, não pune o vício em si mesmo, porque não tipifica a conduta de "usar" (Tóxicos, p. 99).

( ... ) Subscreveu numerosas decisões absolutórias em favor de réus encontrados, a fumar, de boca em boca, um único cigarro de maconha, sem possibilidade de apurar-se qual o fornecedor do "fininho". Acompanhou sempre a orientação, sem dúvida dominante na doutrina e na jurisprudência, segundo a qual o uso de entorpecente ou psicotrópico, surpreendentemente, não foi incluído na legislação antitóxicos, sendo atípico o ato daquele que é surpreendido fumando maconha, aspirando cocaína, autoministrando-se droga ou sendo injetado por outrem.

Acórdão da 5ª Câmara do Tribunal de alçada, relatado pelo eminente e saudoso Juiz Fernando Prado, sustentou, alto e bom som, que "o uso de entorpecente só é punido quando há também o porte."

Configura o crime do art. 281 do CP o trazer consigo substância entorpecente, conduta que gera um perigo que a norma legal procura evitar: mas não se pune a conduta de usá-la em si próprio (RT 449/446). ( ... ) o fato de fumar maconha não é o que constitui o delito previsto no art. 281 do CP, e sim o de possuir o entorpecente. ( ... )" Este foi o entendimento do Des. Andrade Junqueira, vencido em parte, cuja condenação manteve.

Continuando, "( ... ) O artigo 16 reza : "adquirir, guardar ou trazer consigo, para uso próprio"; ora, por "adquirir", se entende "obter, conseguir, alcançar, comprar, tomar, passar a ter, vir a ter"; todos esses atos são transeuntes, passageiros, de modo que para o viciado vir a fumar cigarro de maconha necessidade houve de, previamente, adquirir a maconha por qualquer daquelas formas sem o que jamais conseguiria usá-la. ( ... )

O mesmo artigo não pune tão somente o "porte" de maconha pelo viciado; o porte, isto é, o "trazer consigo", é somente uma das modalidades previstas no art. 16, mas o "adquirir" a substância entorpecente tem significado literal e jurídico muito mais extenso do que o "porte" ao qual se apega a jurisprudência invocada pelo v. acórdão. ( ... )

Vê-se, por aí, que a citada jurisprudência inexplicavelmente reduziu o campo de atuação do art. 16 ao "porte", quando, na verdade, o dispositivo penal é de largo espectro de ação, alcançando o próprio fumante de maconha, pois, se ele está fumando o cigarro de maconha ou fazendo uso de qualquer entorpecente foi porque, num estádio anterior, "adquiriu" a maconha e o entorpecente, não importando ao aplicador da lei investigar como, quando e em que condições o fez, porquanto a lei se contenta com o "adquirir".

O objetivo do legislador, com a legislação antitóxicos, foi procurar evitar a disseminação dessa calamidade pública, em que está se tornando o uso do tóxico, principalmente no meio estudantil. ( ... ), porquanto o tráfico sem o uso seria inócuo e nenhum mal causaria ao indivíduo. ( ... )

Portanto, a finalidade da Lei Antitóxicos é coibir o uso e para isso proíbe não somente o tráfico como, também, a produção da substância entorpecente, por qualquer forma que seja (Art. 2º da Lei 6.368/76).

Com essas premissas, ressalta evidente que o uso de substância entorpecente é proibido por lei, pois essa é a finalidade principal da Lei Antitóxicos.

Daí por que o legislador adotou a fórmula mais genérica possível, qual seja, "adquirir", que engloba todas as modalidades possíveis e imagináveis de o indivíduo obter o entorpecente "para uso próprio".

Se o indivíduo obtém, consegue, alcança, compra, toma, passa a ter a maconha para uso próprio e é encontrado usando-a, não importa a modalidade, pois pode usá-la em forma de cigarro ou em forma líquida para a via intramuscular, ou endovenosa, ou subcutânea, não há dúvida de que incidiu no art. 16. ( ... )

O "uso" do entorpecente está previsto expressamente no art. 1º como sendo objeto de prevenção e repressão pela lei.

E não será pelo fato de o legislador não haver empregado o vocábulo "usar" no art. 16 que se há de decidir que a mais nociva das finalidades do entorpecente não seja objeto de repressão penal, quando é certo que o legislador, após mencionar que o uso do entorpecente é objeto de prevenção e repressão (art. 1º da Lei 6.368/76), foi explicito no art. 3º ao instituir um sistema de repressão ao uso de tóxicos em geral, encarecendo, no art. 4º, a necessidade de as autoridades ali mencionadas colaborarem com a prevenção ao uso de entorpecentes.

Tudo está a evidenciar, portanto, que ao vocábulo "adquirir" se há de dar o significado próprio e jurídico, de modo a alcançar, sem sombra de dúvida, o usuário de tóxico. ( ... )

Quem usou entorpecente foi porque conseguiu adquiri-lo, isto é, obtê-lo por qualquer forma.

O resto é questão de prova, isto é, saber se o indivíduo fez ou não uso do entorpecente, isto é, se o indivíduo adquiriu ou obteve, ou conseguiu o entorpecente de que fez uso.

A tese de que "sem apreensão de droga não pode haver denúncia" (RT 424/295) é conclusão que não se compadece com a letra nem com o espírito das leis que disciplinam a repressão ao tóxico.

Se a própria lei penal dispõe sobre a verificação médica da dependência física ou psíquica aos entorpecentes (art. 19, do parágrafo único, da lei 6.368/76), porque tal verificação não pode ser feita para averiguação de que o réu fez uso ou não do entorpecente?

É inacreditável que, quando as investigações científicas chegaram ao mais alto grau de sofisticação em matéria de exames para verificação de dependência física ou psíquica, mediante exames de laboratório e psicossomáticos, se conclua que "sem apreensão da droga não pode haver denúncia".

E mais inacreditável, ainda que, mesmo na hipótese de os réus haverem confessado terem feito uso da maconha, isto é, terem confessado a "aquisição de maconha de que fizeram uso, ainda assim foram absolvidos porque só poderá ser condenado quem ainda trazia alguma quantidade de erva", pois o uso do entorpecente só é punido quando há também o porte ou guarda (cf. ac. Cit. Por Azevedo Franceschini in tóxicos, p. 75).

Essa jurisprudência, data venia, levaria o julgador a absolver o assaltante porque não se encontrou o dinheiro por ele roubado, dinheiro, esse, que ele consumiu, gastando-o ou inutilizando-o; ou então, levaria o julgador a absolver o homicida que haja consumido com o corpo da vítima, jogando-o ao mar, de modo a não ser encontrado, ou, então, queimando-o de tal modo a não deixar resíduo algum.

Ora, interpretação de tal jaez não se compadece mais com o adiantamento da Ciência Penal, cujo fulcro é a repressão aos atos anti-sociais, atos, esses, catalogados nas leis penais; o resto é questão de prova, isto é, saber se realmente houve ou não um assalto, ou, ainda, se houve ou não um homicídio; deixa-se o principal, que é a repressão ao crime, para se apegar ao acessório, concernente a prova do corpo de delito, quando é certo que há centenas de meios para se comprovar a existência do assalto ou do homicídio.

No caso da repressão ao entorpecente a questão é a mesma, pois tudo se resume em fazer-se a prova sobre se o réu fez ou não uso do entorpecente, pouco importando que ele, pelo uso dele, fez desaparecer os vestígios da substância, como, é o caso do cigarro de maconha, que, uma vez fumando, transforma-se em cinza; mas nem por isso se pode chegar a afirmação, inconcebível no estágio atual da Ciência Médica e Jurídica, de que sem apreensão da substância tóxica não é possível concluir-se se o réu fez ou não uso de entorpecente."

Por fim, conclui o julgado :

" Ciência Penal não é a jurisprudência isolada em si mesma, a alimentar-se de si mesma, a desdobrar-se, introvertidamente, em cálculos abstratos e subtilitatis juris, indiferente às aventuras do mundo exterior.

Ciência Penal não é só a interpretação hierática da lei, mas, antes de tudo e acima de tudo, a revelação do seu "espírito" e a compreensão do seu "escopo", para ajustá-la a fatos humanos, a almas humanas, a episódios do dramático da vida."

Por sua vez, podemos extrair da obra de Valdir Sznick(18) excelentes considerações acerca deste vasto e discutido tema.

Abrange o artigo 16 da Lei 6.368/76 o usuário eventual, quer seja mero experimentador, quer curioso.

Mas, como é tratado a figura do traficante-dependente? Entende o autor, que este ou é dependente (pela incapacidade de entender seu ato), ou é traficante, porém, devendo ser enquadrado pelo art. 16. A figura do traficante-dependente era, em geral, dependente de drogas e, por necessidade (normalmente falta de dinheiro), passou a comercializar a droga para obter recursos, quando não parte da que distribui, para sua necessidades.

Por sua vez, o viciado pode ser considerado dependente? Para alguns, trata-se de doente e não deve ser punido como criminoso, já que tem sua capacidade diminuída, especialmente a de resistência (imputabilidade). Já, outros entendem que é punível, pois é através do vício que existe e se mantém o tráfico, pois se não fossem os consumidores inexistiriam os traficantes.

O experimentador, ou seja, aquele que usa esporadicamente a droga ou, então, que é surpreendido quando vai usar pela primeira vez. A experimentação é a primeira escala para o vício; é punido mais como uma medida preventiva (evitando novas recaídas) do que punitiva.

No parágrafo acima discordamos com veemência do autor, pois este tipo de punição não existe nada de preventivo. De forma alguma que uma punição, neste tipo de delito, vai configurar uma prevenção, buscando evitar que o experimentador se torne um potencial viciado e este, por sua vez, fomenta a distribuição das drogas e consequentemente o comércio por atacado que está em sua base.

No tipo penal, caberia, ao lado das condutas apontadas, acrescentar-se a de "fazer uso". É verdade que, quem é surpreendido "fazendo uso", no ato próprio, é punido, pois até aquele momento, no mínimo, trazia consigo. Mas se for "logo após", mesmo sabendo-se que a pessoa está sob os efeitos de tóxico, o fato é impune. Desta forma, em uma situação de co-réus, somente será punido aquele que está portando ou na guarda da droga, mesmo que este não tenha se utilizado do referido entorpecente.

Diferentemente julgou causa semelhante o Tribunal de Alçada Criminal paulista, na Apelação 94.943, de São Paulo, em que foi relator Azevedo Franceschini, que assentou:

"Havendo concerto de vontades e escopo comum, o porte da droga, para uso próprio, em veículo, incrimina todos os participantes presentes da empreitada." ( in RT, 480/261)

Com relação a apuração do uso, mister se faria o exame químico toxicológico, para positivar se o indiciado tem em seu organismo vestígios ou resíduos de droga; ou então o exame clínico, feito por médico, dos "efeitos" que não deixam dúvida de que o examinado está drogado.

E, como que batendo com o nosso posicionamento, é o acórdão do Supremo Tribunal Federal, cuja ementa é a seguinte:

"Entorpecente – inteligência do art. 16 da Lei no. 6.368/76. A expressão adquirir, segundo o consenso da doutrina, tem o sentido da obtenção da res, a título oneroso ou gratuito. O uso de entorpecente pressupõe a aquisição. – O exame de corpo de delito, em face do desaparecimento de vestígio pode ser suprido pela prova testemunhal (art. 167 do Código de Processo Penal)."

E no caso do traficante-viciado, ou seja, aquele que traz a droga, além de uso próprio, a usa também para o tráfico ? Neste caso, haveria o enquadramento no artigo 12 e não no delito do art. 16, pelo próprio fato da norma mais grave absorver a mais leve e pela descrição do próprio tipo penal.

Quanto ao dolo, o posicionamento do Prof. Edevaldo Alves da Silva assenta-se da seguinte forma : "deixamos claro não haver necessidade para a tipificação do delito, a existência do dolo específico, bastando o genérico." (Tóxicos, 1973, p. 256)

Em posicionamento contrário, Vicente Greco manifesta-se que deva exigir o dolo específico, pois só podem ser praticadas quando a finalidade exclusiva seja o uso próprio.

Continua o autor, um aspecto interessante foi o alargamento realizado pela jurisprudência das condutas constantes do art. 16. Assim é que ao lado das três condutas ali previstas – adquirir, guardar, trazer consigo – têm os pretórios admitidas outras, tais como plantar.

Em um julgamento do Tribunal de Alçada Criminal, assentou :

"Tratando-se de pequena plantação destinada ao preparo de entorpecentes apenas para uso próprio e não para tráfico, embora os verbos colher, cultivar e semear não constem explicitamente do art. 16 da Lei no. 6.368/76, admissível, por interpretação analógica in bonam partem, é a condenação por este dispositivo em lugar da aplicação do art. 12, / 1º , inc. II do mesmo diploma" (rel. Geraldo Pinheiro, Apel. 187.117). Idêntico entendimento, JuTACrim., 50/302, 52/29, 52/383, 58/267; RT, 520/408, RT, 527/409.

Para o autor, tal alargamento não é possível, pois o legislador não previu tal espécie e, quando previu, tipificou-as como tráfico.

No meu entender, a posição do julgado acima acerca do assunto parece muito mais condizente com a realidade do que a opinião do autor. Caberia, neste caso, uma interpretação mais flexível da norma, senão estaria-se apenando muito severamente aquele que praticou um delito de pequenas proporções.

Por fim, outra questão de enorme controvérsia e que o legislador não distinguiu, refere-se a quantidade apta a causar dependência, mesmo porque sabido é que para uma pessoa de organismo fraco pequena quantidade é mais do que suficiente, quando para outra de compleição robusta pouco ou nada faz.

Vicente Amêndola Neto em sua memorável obra jurisprudencial(19) sobre a lei de tóxicos menciona um julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul(20), que por sua vez cita a tese defendida pelo magistrado Dr. Wilmar Oliveira(21) que é de uma riqueza incomesurável. Sim, na minha opinião, imensurável, em virtude da interpretação dada pelo Juiz que tanto se aproxima da nossa realidade e pelo seu espírito receptivo da nossa vida prática e não somente ao teor da norma existente. Relatamos a seguir partes desta decisão que consideramos de maior relevância, inclusive, com intuito de provocar maiores debates acerca do assunto de extrema gravidade, e, pelo que se percebe, de pouca investida e atenção das nossas autoridades.

" Uso de maconha. Tese defendida pelo magistrado da insignificância por ser crime de bagatela e sustentando a necessidade de descriminalizar o uso de maconha."

Discorre o eminente magistrado :

"Em um dado momento histórico, as normas são criadas atendendo a determinada necessidade. Com o tempo, as relações modificam-se, a sociedade evolui naturalmente e surge a necessidade de criar novas leis e de revogar outras. Uma lei que não mais possui finalidade social deve ser desconsiderada, pois o Direito existe unicamente para servir ao homem. De acordo com Plauto Faraco de Azevedo, em seu livro "Justiça Distributiva e Aplicação do Direito", fls. 119 e segs., a evolução da vida desafia o sistema jurídico, derivando a possível inadequação entre normas legais e os fatos a que são propostas. E o problema da lei injusta, "que apenas deixa de sê-lo quando, mercê de ampla formação jurídica, o intérprete da lei, seja ele o Juiz ou qualquer outro, encontra solução capaz de ensejar a harmonia social".

O Juiz, ao aplicar regras jurídicas para resolver problemas concretos, necessariamente faz um juízo de valor sobre a regra, questionando a validade e necessidade de sua aplicação para aquele caso concreto. Isso significa que o direito é conteúdo da atividade do Juiz, e não o seu limite, como pretende a visão positivista. A lei deve conter o direito, mas isso pode não ocorrer, sendo, portanto, imprescindível um juízo de valor por parte do Juiz.

Restaram comprovadas nos autos a autoria e a materialidade do fato abstratamente previsto na norma. Deve-se analisar, entretanto, até que ponto o fato "trazer consigo, para uso próprio, substância que determine dependência psíquica" constitui ofensa à sociedade. Em verdade, há desconhecimento em relação aos componentes da Cannabis sativa, misticismo no tocante a seus efeitos e preconceito em relação aos seus próprios usuários. A ideologia dominante tenta marginalizar esses indivíduos, vendendo a idéia de imoralidade quanto à utilização desta droga. Trata-se, portanto, de um problema moral, e esta, bem como a religião, são duas esferas que não dizem respeito ao Direito. Essa ciência, apesar de regular as relações na sociedade, deve deixar uma margem para a realização pessoal, pois a liberdade de cada um deve ser preservada. Ainda que seja grande a esfera de atuação do Estado, é preciso que ele se autolimite para não impedir o desenvolvimento pessoal.

Não há motivo plausível para se considerar crime o porte para uso próprio e a ingestão de maconha, se o álcool e o cigarro são drogas permitidas na sociedade.

Está comprovado que maconha causa dependência psíquica, conforme conclusões do Laboratório de Toxicologia do Instituto Médico Legal, mas o alcoolismo e o tabagismo vinculam não apenas dependência psíquica como também física, sendo portanto, muito mais prejudiciais à saúde.

De acordo com kaplan e Sadock, em seu "Compêndio de Psiquiatria", as páginas 261 e seguintes, os efeitos clínicos da Cannabis sativa, que duram de 2 a 4 horas após ingerí-la, são euforia, estados oniróides, tranqüilidade, sonolência, sensibilidade aos estímulos externos, sensação de lentificação do tempo e retraimento social. Foi ressaltado nessa obra o fato de que o usuário de maconha tem um controle mais íntimo e mais contínuo sobre os efeitos dessa droga em comparação com outras mais potentes. No que diz respeito à dependência, "não existem evidências clínicas de que os sintomas de abstinência ou a necessidade de aumentar a dose representem qualquer problema para o usuário".

Contrariando o conhecimento leigo de muitos indivíduos, pode-se constatar que a ingestão da maconha não faz com que o indivíduo tranforme-se em um ser agressivo, perigoso ou criminoso. O seu usuário não é uma ameaça em potencial para a sociedade. Os efeitos do uso dessa erva podem prejudicar seu desenvolvimento pessoal, mas esse é um âmbito no qual o Direito não deve interferir pelos motivos já aludidos.

Quanto aos efeitos da nicotina, componente altamente tóxico presente no cigarro, pode-se afirmar que uma superdosagem de 60 mg é fatal (um cigarro possui em média 0,5 mg), e que a dependência física dessa substância desenvolve-se rapidamente. O álcool tem como efeitos o julgamento deficiente, alteração do humor, agressão, atenção prejudicada, amnésia e outros.

As duas últimas drogas citadas, apesar de legalizadas no Brasil, trazem conseqüências mais graves para a sociedade do que o consumo de maconha. Prova disso é que o próprio CP brasileiro, no seu art. 61, prevê como circunstância agravante o estado de embriaguez preordenada, mas em momento algum alude ao fato de alguém cometer um crime após consumir maconha e valer-se disso como causa maiorante ou circunstância agravante. Apenas no art. 28, inc. II, do CP, tendo o legislador a intenção de incluir a maconha entre "substância de efeitos análogos", determinou que não se exclui a imputabilidade penal no caso de ter o agente cometido o crime embriagado ou pelo álcool ou por esse tipo de substância.

Mas não é preciso recorrer a conhecimentos jurídicos. Fazendo-se uma análise geral, qualquer indivíduo percebe que, proporcionalmente, ocorrem mais crimes cometidos por agentes alcoolizados do que por agentes drogados. Acidentes de trânsito, homicídios e lesões corporais resultantes de espancamento são prova disso.

Com base no acima exposto, questiono o motivo de o legislador, omissivamente, considerar o uso de álcool legal e, comissivamente, considerar típico e antijurídico o uso de Cannabis sativa, e rogo pela descriminalização do uso e porte para utilização própria da maconha.

É consabido que as pessoas encontram, como principal causa que as leva ao uso de entorpecentes, o sentimento de profunda frustação em face dos problemas que vêem na sua vida e cujas soluções consideram intangíveis. A idéia de nada poder fazer para estabelecer mudança em sua realidade, que a atemoriza, instala-se como inferno particular. E o uso do entorpecente gera parênteses, hiato de bem-estar e leveza, pois, afasta, momentaneamente aquela angústia, que é substituída pelo ilusório nirvana.

E com muita freqüência em adolescentes, para quem o futuro, que representa toda sua vida, não, passa de uma espessa escuridão.

Entre as causas que levam ao consumo de drogas, é importante citar problemas e questionamentos que geralmente se manifestam na adolescência, como o sexo e a relação com os pais, com a família. Também o campo social, ou seja, o ambiente em que o indivíduo vive, tem grande importância, pois pode o jovem sentir-se inferior econômica e culturalmente, recorrendo, assim, ao uso da droga. Muitas vezes o problema encontra-se no plano afetivo e o indivíduo ao se drogar procura outras fontes de emoção e prazer. As razões que levam à permanência da utilização da maconha em específico estão relacionadas com os efeitos de tal droga, que são : modificação do contato com a realidade, anestesia da timidez, perda da crítica, segurança, excitação, dissociação de idéias, sentimentos de felicidade.

Jervis ("Maconha na Clínica Psiquiátrica", Carol Sonereich, 3/24), sem se aprofundar nos efeitos da erva, afirma que, "em sentido, é, portanto, a droga ideal : ou, pelo menos, a mais disponível no momento. Já que em princípio as drogas são indispensáveis para o homem, como não preferir esta, cujo inconveniente principal é apenas o risco de ser preso e "por culpa de algum Juiz particularmente estúpido acabar em um manicômio judiciário?".

De acordo com o médico Luiz Paulo Paim Santos, direitor da Cruz Vermelha Internacional do Rio Grande do Sul e chefe do serviço de álcool e drogas da clínica Pinel (Z.H., 17.9.90, p, 24 e 25) a questão das drogas não será mudada pela repressão ao tráfico, e sim pelo combate às causas que levam ao consumo, complementando que o ataque ao consumo de drogas deve vir de cima, dos governos, via educação e informação. Sua idéia é "de se empenhar em algo maior, feito uma política social que seja formal, legítima e adotada por todas as camadas da sociedade. A questão das drogas somente se vai transformar em solução quando pensada como política oficial. Hoje ela ainda está na categoria de clandestina.

Ao longo da história, ficou comprovado que a proibição e a repressão referente ao uso de drogas não surtiu o efeito de reduzir ou eliminar o número de consumidores. Pelo contrário, este número vem aumentando cada vez mais. Há de se cogitar da existência ou não do efeito geral repressivo da pena, pois no mundo contemporâneo há 300 milhões de fumadores de maconha. Curtet acha que o problema dos tóxicos não pode ser resolvido nem pelo hospital, nem pela prisão. Acredita ele que só uma relação afetiva pode ajudar o toxicômano, acrescentando que a Cannabis, por não criar dependência, pode ser despenalizada. "O seu abuso pode ser nocivo, mas também é nocivo o abuso ao repolho".

A repressão às drogas, que se manifesta no meio social através de atos policiais, de "batidas", de prisões em flagrante, de agressões físicas e condenações judiciais aos usuários, ao meu entendimento, gera mais malefício à sociedade e ao próprio drogado do que os efeitos individuais e sociais decorrentes do uso de entorpecentes. Deve-se considerar que a própria sociedade, através de sua estruturação, deficiências e do seu menor núcleo, que é a família, induz o uso da droga, embora, através de leis, dos atos repressivos já citados e de uma falsa moral, se oponha aparentemente a ela. Assim sendo, é dever desta mesma sociedade tentar erradicar este problema, mas através da compreensão, da tolerância, de tratamento específicos de instalações de clínicas psiquiátricas que proporcionem mais fácil acesso de drogados menos privilegiados e não através de atos repressivos e aplicação de sanções já obsoletas. A.M. Amar, Delegado da América Latina do Conselho Internacional de Alcoolismo e Toxicomania, afirma que a repressão apenas segrega a desajusta, colocando como prioridade integrar o indivíduo na sociedade.

O preconceito gerado pela repressão pública tem, face à descoberta da dependência em membros da família, causando profundas fissuras na própria entidade familiar com profundos sofrimentos do indiciado dos familiares. Casamentos desfeitos, jovens expulsos de casa, traumas, modificações no rumo da vida do grupo podem acontecer (e têm acontecido), com imediatas conseqüências de prisões, sentenças ou acórdãos condenatórios por simples uso ou porte de maconha.

As conseqüências sociais da repressão policial ou judicial são males maiores do que aqueles que pretendem coibir causados pelo uso de entorpecentes.

Há uma curiosidade natural do ser humano pelo desconhecido e pelo proibido e isso faz com que ele se inicie nas drogas. Os adolescentes geralmente buscam na maconha a satisfação de suas curiosidades, suas dúvidas e o porquê de ser ela tão censurada e criticada. Sua proibição, portanto, em um certo aspecto, estimula o seu consumo.

A criminalização da maconha, aliás prejudica o combate ao tráfico, pois obriga o dependente a proteger o traficante, não lhe revelando a identidade, pois isto implicaria confissão. Silenciando, trata de evitar processo e pena contra ele próprio. Ainda ao nível individual, de acordo com a lei brasileira, aquele simples "drogado de fim de semana" ou "fumador de maconha" inofensivo fica sujeito a ter sua liberdade individual tolhida, se aplicadas sanções previstas na Lei n.º 6.368. Esses indivíduos que vêem na maconha uma distração não precisam sequer de tratamento psiquiátrico. Condená-los e levá-los à prisão seria, no mínimo, uma injustiça.

Paralelamente ao problema enfrentado pelo simples usuário, há que a questão dos toxicômanos (pessoas que consomem tóxicos diariamente, ou quase, praticamente sem interrupções, de maneira incoercível, a ponto de apresentarem estado de intoxicação caracterizado por distúrbios psíquicos e somáticos). Estes, por serem dependentes de drogas ilegais, encontram séria dificuldade em admitir que estão precisando de ajuda especializada, temerosos da reação da família, da sociedade e da aplicação das leis. A procura espontânea de um terapeuta nestes casos é muito difícil, havendo, ainda, devido à má informação, o medo de o terapeuta denunciá-lo. Embora não haja dados estatísticos referentes a isto, acredito que há mais alcóolatras que procuram médicos ou instituições especializadas do que drogados, já que o álcool deixou de ser um tabu social e é legalizado.

No caso em questão, a norma jurídica incidiu, pois ocorreu aquilo que ela previu e regulou abstratamente. Essa incidência significa que a norma é "potencialmente" aplicável. Cabe a mim, através de um juízo de valor, fazer ou não com que o indivíduo seja punido em nome do Estado. (...)

Além do mais, trata-se de um "crime de bagatela", visto que a quantidade de erva é ínfima, não podendo, portanto gerar dependência física ou psíquica e, talvez, nem mesmo os efeitos clínicos normais que surgem logo após a sua utilização.

Ainda vale a referência à decisão do STF que considera o porte de maconha como crime, pois se trata de crime de perigo à saúde pública, visando, assim, evitar o perigo comum advindo dos fatos que podem atingir a saúde de número indeterminado de pessoas, pondo em risco a incolumidade coletiva. É entendido pela maioria que quem porta Cannabis sativa pode disseminar o uso da mesma difundindo este hábito entre os amigos e, consequentemente, em toda a sociedade. Porém, entendo que o usuário ou portador desta droga não tem a intenção de induzir ninguém a dela se valer, querendo apenas se autosatisfazer através da ingestão da mesma. Admito que o portador possa ser potencialmente um disseminador do uso, mas, se se fizer uma analogia deste pensamento, tenho que admitir o fato de que uma farmácia que vende medicamentos ou um supermercado que venda bebidas alcóolicas também oferecem perigos potencial à coletividade, pois determinados remédios em doses excessivas ou bebidas alcóolicas em demasia podem gerar dependência ou até mesmo a morte.

Segundo Plauto Faraco de Azevedo, "sempre é oportuno enfatizar a velha idéia de que as soluções jurídicas em geral e as decisões judiciais em particular apenas se justificam na medida em que respondem aos reclamos da vida humana, em certo contexto cultural, em dado momento histórico. Para isto, é preciso menos hermetismo lingüístico e artifícios lógicos, e maior preocupação com os interesses pessoais e sociais em questão. Nesta postura, sentir-se-ão melhor os profissionais do Direito e as partes, os primeiros por saberem-se socialmente mais úteis e as segundas por sentirem-se reconhecidas como pessoas, deixando a incômoda categoria das abstrações jurídicas".

Frente ao exposto, julgo procedente a ação penal, mas absolvo-o (a-os) da imputação que lhe (s) foi feita. Assim decido, com fulcro no art. 386, inc. III, do CPP." (...)

Em outro julgado proferido pelo Relator Moacir Danilo Rodrigues do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, traz a seguinte redação :

" Indivíduo preso em flagrante por trazer consigo 0,5 g de maconha – Quantidade ínfima não acarreta perigo à saúde do agente, nem à saúde pública, bens que a legislação de tóxico objetiva tutelar – Interpretação do art. 16 com o art. 37 da Lei de Tóxicos – Sentença absolutória mantida por maioria."

"A matéria é extremamente complexa. E, com tal, se expressa a divergência da Câmara. A maioria, no entanto, admitindo interpretação casuística da norma, entende improver ao apelo.

Parte-se do pressuposto de que a Justiça é uma concepção muito mais ampla do que a de lei. Esta, embora concreta, é estática. Aquela, todavia, é dinâmica, cumprindo-lhe a adequação da norma a uma realidade em constante mutação. Via de conseqüência, há que se fazer a distinção, que é fundamental, entre justiça formal e substancial.

Denis Lloyd, professor de jurisprudência da Universidade de Londres em sua lúcida obra A Idéia de Lei, editada por Martin Livreiro, esclarece que: "não é suficiente para um sistema legal aceitar os atributos formais da justiça, mesmo quando temperados por um espírito de equidade".

A posição do emérito mestre londrino ganha relevo se considerarmos o notório conservadorismo inglês. Daí retornamos à sua obra, quando defende a liberdade de atuação do juiz, munindo-o da flexibilidade necessária para realizar a adequação da lei às necessidades da comunidade em que ela opera: "Uma rígida e intolerante profissão jurídica pode não se coadunar com os valores da sociedade em que atua, sobretudo quando essa sociedade se encontra num estado de transição, com substanciais correntes de mudanças sociais e econômicas, transformando gradualmente uma comunidade mais tradicional".

Admitido, pois, o caráter de flexibilidade da atuação do juiz, objetivando uma adequação da norma às circunstâncias que lhe são postas, permanentemente, sacrifica-se o rigor de uma justiça formal, com as vantagens de uma justiça substancial.

E é dentro do enfoque que esta permite, que a Lei de Tóxicos merece analisada e até repensados os papéis do Estado e do indivíduo.

Observa-se que no comércio de drogas três fatores essenciais devem ser examinados: produção, circulação e consumo. Estes, em contínua interação, estimulam-se mutuamente, de modo que, a partir de um determinado momento, quando o processo se estabeleceu e se rotinizou, cada um destes fatores é, concomitantemente, causa e conseqüência dos outros dois.

O Delegado Federal José Antonio Hahn, em conferência apresentada ao X Congresso da Associação Brasileira de Juizes e Curadores de Menores, realizado em Tramandaí, em outubro/83, um dos maiores conhecedores do problema, afirmou: "Para um enfrentamento racional desse grave problema da humanidade, é necessário que haja ataque simultâneo nas três frentes de combate. No fator demanda, devem ter realce as atividades de prevenção educacional e de reabilitação do usuário de drogas. No fator produção, dar-se-á ênfase à atividade de controle do fabrico e comercialização de drogas sintéticas e semi-sintéticas, bem como no controle e erradicação do cultivo de drogas naturais. No que diz respeito à atividade de circulação, que é o tráfico de drogas propriamente dito, em seu momento de distribuição, devem ter lugar as atividades repressivas jurídico-penais.

E afirma aquela autoridade, do alto de sua experiência, adquirida inclusive em estágios na Europa e América do Norte: "Se ao Estado compete a atividade de controlar a Produção de drogas e reprimir a circulação, no momento que essa droga foi produzida e circulou até o consumidor, está patente o fracasso do Estado no seu dever primeiro, de controle e repressão. E, assim sendo, será lícito ou correto que o Estado continue a sua atividade repressiva contra o consumidor ?

E propõe uma outra indagação: "A questão básica é: Quem toma droga é um criminoso ou é vítima de um crime?"

Novamente retornamos ao questionamento: A lei é absoluta e à justiça compete aplicá-la e não interpretá-la ?

A resposta, parece-me, está na frase lapidar do inesquecível Benjamin Cardoso, Juiz da Suprema Corte Americana: "O direito, como o viajante, deve estar pronto para o dia seguinte!"

Filiamo-nos a uma justiça formal ou a uma justiça substancial? No primeiro caso, há sujeição à inabilidade ou a inércia do legislador. No segundo, significamos os agentes precursores das grandes mudanças legais. Afinal, não são os juizes os indivíduos mais capacitados para a aferição da boa ou da má lei?

O fato social é dinâmico. Justiça formal significa o último vagão de uma locomotiva. Quando o fato social ali chega, o faz como produto final. E o juiz que se atém apenas à justiça formal fica fora do grande processo de criação e transformação. Resta-lhe tão-só a aplicação de uma regra jurídica, desconforme com a realidade.

Ao contrário, acreditando e lutando por uma justiça substancial, disseca-se a frieza da lei, apontando ao legislador a necessidade de correção. As grandes conquistas do homem, consubstanciadas em leis justas e atuais, tiveram no desassombro interpretativo dos juizes o seu fato gerador.

Recorre-se, mais uma vez, a Denis Lloyd, em sua obra anteriormente mencionada: "Os juizes, como outros seres humanos, não podem se divorciar dos padrões de valor que estão implícitos na sociedade ou grupo a que pertencem, e nenhum soma de imparcialidade conscienciosamente aplicada, ou ausência judicial de passionalismo, conseguirá eliminar a influência de fatores desse gênero. Se, p. ex., considerarmos como, em tempos modernos, vários campos do direito foram gradualmente moldados por legislação judicial, num esforço para adaptá-los às necessidades sentidas num novo tipo de sociedade industrial, voltada para o bem-estar social, poderemos perceber como pode avançar, de decisão em decisão, numa lenta e gradual progressão, no sentido de por em vigor um padrão alterado de valores."

Enfrento a questão proposta pelo Dr. Hahn: "Se o Estado fracassou no seu dever de controle e repressão, ser-lhe-á lícito ou correto punir o usuário?"

Penso que na própria lei está o caminho para aplicação de uma justiça substancial. O problema do consumo de drogas tem preocupado sobremaneira os juristas, sociólogos e outros estudiosos da área. Há correntes propugnando pela descriminalização da maconha, p.ex..

O tema não é tão simples. Certo que existem dois tipos de consumidores, ou seja, o viciado, que utiliza habitualmente, e o curioso. Ao descriminalizar a maconha estaríamos, em relação ao primeiro, longe de beneficiá-lo, mergulhando-o fundamente nos laços do vício. Sabemos todos que a habitualidade de consumo desta droga, de per se, não significa o grande perigo. Este reside na escalada para o consumo de drogas pesadas, como a cocaína, a heroína e outros narcóticos.

Nem por isso o dependente deve ser tratado como um criminoso. Ao vício foi levado por um processo ansiogênico, alimentado por várias distorções psíquicas. Cabe, isto sim, resgatá-lo em sua higidez mental, o que só é possível pelo tratamento ao nível médico, psicológico e até mesmo psicanalítico.

Aliás, a própria Lei de Tóxicos não o pune como criminoso, isentando-o de pena. Mas reserva-lhe o mesmo procedimento formal aplicado ao agente de delito.

O curioso, o consumidor eventual, todavia, que, pelas injunções mais diferentes, se propõe a experimentar, a consumir um cigarro, é tratado, em tudo e por tudo, como qualquer criminoso. E isto é cruel e desumano.

O art. 16 da Lei de Entorpecentes, além de uma profunda incongruência objetiva, não pode ser analisado sem uma interpretação subjetiva. Assim, sanciona pena, àquele que guarda ou traz consigo, para uso próprio, entorpecente ou outra substância causadora de dependência.

A incongruência resulta cristalina de não estar catalogado, como crime, o ato de consumir. A própria norma, portanto, parece estimular o consumo, dizendo não guarda, não traz consigo, consome logo a droga.

Suponha-se três jovens surpreendidos pela polícia, algum tempo após cada um ter recebido um cigarro de maconha. O primeiro já fumara todo o seu cigarro. Revistado, nada foi encontrado; ficou livre. O segundo, provara a droga, em uma única baforada. Não gostou e permaneceu com o cigarro apagado, para jogá-lo fora, em outro local. Foi preso. O terceiro sequer provara o seu. Não o recusara para "não ficar por fora". Foi preso.

E, talvez, muito menor fosse o número de jovens a experimentar a maconha, se no seu currículo escolar tivesse recebido as informações necessárias sobre a droga e suas conseqüências. A questão não seria tabu. Não haveria curiosidade. Nem o "mistério" conseqüente. Estava recebendo os conhecimentos apropriados, em momento e locais adequados. E não na maneira desvirtuada que a clandestinidade propõe.

Pois bem, se o Estado, que ao editar a lei, estabelece regras para si (o criar, nos currículos escolares, na formação de professores, obrigatoriedade de pontos de esclarecimento sobre drogas) e não as cumpre, pode valer-se, unilateralmente, destas regras contra o seu cidadão ?

A lógica, o bom senso, a própria noção de justiça, até, estão a responder negativamente.

Afirmou-se, anteriormente, que, na própria Lei de Tóxicos, está o caminho para uma interpretação de ordem subjetiva, permitindo exercitar uma justiça substancial. Assim, há convicção de que o art. 16 não pode ser interpretado com rigorismo formal. Há que se buscar o art. 37 como forma de abrandar o rigor daquele.

Ao dispor que, para a caracterização dos crimes definidos na lei, a autoridade atenderá à natureza e à quantidade da substância, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstancias, à conduta e aos antecedentes, está implícita a flexibilidade que o legislador atribuiu ao juiz.

Pode-se argumentar que ela se limita a distinguir o porte para uso próprio das demais modalidades delituosas. Mas, este argumento reduz o flexível tão-só a uma justiça formal. E mais, o artigo seria perfeitamente dispensável, já que os arts. 12, 13, 14, 15

Notas

01. RJTJSP 109/456.

02. No sentido dessa corrente: RT 515/386, 520/399 e 408, 527/410, 544/422, 556/375, 558/295, 560/322, 565/298, 572/300, 578/326, 582/388, 598/321, 610/410, 623/291, 635/353, 672/300 e 693/332; RJTJSP 88/351, 93/418, 103/465, 109/452, 115/245, 126/513 e 130/491; JTACrimSP 52/29; RBCC

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  • Usuário Growroom
Ementa

TÓXICO - Tráfico - Semeadura e cultivo no quintal da residência - Ausência de prova da venda ou fornecimento a terceiros - Desclassificação para a figura do artigo 16 da Lei n. 6.368/76 - Recurso parcialmente provido. Punir-se alguém com o mínimo de três anos de reclusão desde que plante maconha, seja em que circunstância for, é objetivo que não se compadece com o estágio de evolução do Direito Penal moderno, franca e escancaradamente subjetivista. (Ap.Crim. n. 176.722-3 - Dracena - 5ª Câmara Criminal - Relator: Poças Leitão - 16.03.95 - V.U.)

Ementa

TÓXICO - Tráfico - Desclassificação para uso próprio - Admissibilidade - Cultivo de um único pé de maconha - Punição severa prevista no art. 12 da Lei 6368/76 que faz alusão as plantas, "no plural" - Recurso parcialmente provido para esse fim. (Relator: Ângelo Gallucci - Apelação Criminal 114.316-3 - Serra Negra - 25.11.91)

Ementa

TÓXICO - Tráfico - Cultivo, em dois vasos, de maconha - Perícia, entretanto, não elucidativa quanto a presença do princípio ativo da droga ou o específico elemento intoxicante - Incidência do inciso II do § 1º, do artigo 12 da Lei de Drogas afastada - Recurso provido para esse fim. JTJ 242/325

Ementa

TÓXICO - Tráfico - Cultivo ou colheita de entorpecente destinados ao uso do agente, toxicômano - Fato atípico - Absolvição decretada - Recurso provido JTJ 244/341

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  • Usuário Growroom
Plantar maconha para uso próprio é tráfico?

Plantação de maconha para uso próprio equipara-se a tráfico de entorpecente?

O sujeito planta poucos pés de maconha para uso próprio. O art. 12, § 1º, II, da Lei 6.368/76, prevê o delito de semear ou cultivar plantas destinadas à preparação de entorpecente. Quid iuris quando são poucos os pés de maconha?

Parte da jurisprudência admite que o delito é sempre o do art. 12, § 1º, II (independentemente da intenção do agente: para uso próprio ou para terceiros) (nesse sentido: REsp 316.617-SC, Félix Fischer, DJU de 24.02.03, p. 266). Outros entendem que seria possível aplicar analogia in bonam partem nesse caso e enquadrar a conduta no art. 16. Para nós, cuida-se de fato atípico. Nem configura o art. 12, § 1º, II, porque não é hipótese equiparada a tráfico, nem tampouco é correto o art. 16 (que não cuidou dos verbos plantar ou semear ou cultivar).

Quanto ao art. 16 haveria, assim, patente analogia in malam partem (dentre os verbos utilizados pelo art. 16 não se encontra o de plantar ou semear ou cultivar plantas destinadas à preparação de entorpecente). No art. 16 a conduta não encontra adequação típica. E tampouco é o caso de interpretação analógica, porque não há na lei citada uma cláusula específica antecedida de uma fórmula genérica.

Quanto ao artigo 12, § 1º, II, tendo em vista sua posição topográfica e, sobretudo, a pena cominada (de três a quinze anos de reclusão), não há dúvida que só tem pertinência essa moldura típica quando se trata de plantação destinada ao tráfico. Aliás, o citado dispositivo legal contempla modalidade criminosa equiparada ao tráfico.

Dando interpretação literal, no REsp 316.617-SC, Félix Fischer, DJU de 24.02.03, p. 266, chegou-se à conclusão que a plantação de 13 pés de maconha configura o crime do art. 12, § 1º, II. Com a devida venia, não andou bem o julgado. Toda aplicação literal da lei tem o inconveniente de reproduzir suas eventuais injustiças. Na medida em que o legislador não é Deus, sempre está sujeito a equívocos. Quando o juiz aplica a lei literalmente corre o risco de reproduzir esses equívocos. Não há dúvida que o art. 12, § 1º, II, nada diz (expressamente) sobre a destinação da droga. Mas não era preciso dizer. A pena de três a quinze anos de reclusão não foi pensada para a plantação de uns poucos pés de maconha (onde se nota claramente a intenção de uso próprio).

Falta proporcionalidade à decisão em sentido contrário. E o paradoxo maior é o seguinte: se o sujeito estivesse na posse de 13 “pacaus” de maconha seguramente seria enquadrado no art. 16 (salvo se a destinação para terceiros fosse evidente). O mais seria enquadrado no art. 16. O menos, que consiste na plantação de pés de maconha, acaba tendo tratamento jurídico mais drástico. A injustiça é patente. E esse não é o papel do juiz.

Sempre que houver dúvida num enquadramento típico, a melhor solução é adotar a posição mais favorável ao acusado. O intenso (e desnecessário) uso do Direito penal, de outro lado, viola o princípio da intervenção mínima. Sem contar seu efeito criminógeno e reprodutor da violência.

*Luiz Flávio Gomes é Doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri, Mestre em Direito penal pela USP, Co-fundador do IBCCRIM e Diretor-Presidente da TV Jurídica IELF.

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  • Usuário Growroom
Magistrado propõe "concorrência comercial civilizada" pela venda de maconha ou cocaína.

Um magistrado gaúcho está propondo uma receita controvertida para reduzir a violência decorrente do narcotráfico: regulamentar a venda de drogas.

A sugestão, que prevê a substituição da violência dos traficantes pela concorrência comercial, desperta polêmica. No documento Uma Proposta para Reduzir a Violência e Mortes Advindas do Tráfico de Entorpecentes, o juiz do Foro Central de Porto Alegre Maurício Alves Duarte, 41 anos, resume as conclusões a que chegou depois de seis anos analisando processos criminais - um ano e meio na Vara do Júri.

Motivado pela violência decorrente das disputas entre os chefes das bocas-de-fumo e do controle armado que impõem às comunidades, Duarte propõe substituir a guerra do tráfico por uma "concorrência comercial civilizada" pela venda de maconha ou cocaína.

- Com o monopólio dos traficantes, eles detêm poder econômico, influência e poder sobre os moradores. A idéia não é estimular o uso, é enfrentar uma realidade - argumenta o magistrado.

A proposta é permitir o estabelecimento de pontos de venda de tóxicos, que pagariam impostos e seriam fiscalizados pelo governo. A iniciativa viria acompanhada de campanhas de conscientização para tentar evitar o consumo:

- Seria uma livre concorrência. O consumidor da área central não precisaria se dirigir à periferia, local de risco, para consumir droga.

O juiz explica que não defende tolerância aos atuais traficantes, mas um debate sobre a mudança do atual modelo de repressão:

- Tem de haver um estudo. Por enquanto, continuaremos processando, julgando e condenando.

A sugestão do magistrado, que admite deixar de fora da proposta drogas com maior poder letal, como o crack, não é bem recebida por especialistas no assunto.

- Isso é loucura. Simplesmente regulamentar a venda não resolve nada - diz o chefe da Unidade de Dependência Química do Hospital Mãe de Deus, Angelo Campana.

Para o professor do programa de pós-graduação em Ciências Criminais da PUCRS Rodrigo Azevedo, a hipótese de liberar o comércio de tóxicos mediante controle governamental não é descabida.

- Se se conseguisse fazer com que o Estado não impedisse, mas controlasse o uso de entorpecentes, seria uma possibilidade talvez mais adequada. Mas isso teria de ser combinado com a repressão aos traficantes - acredita Azevedo.

Duarte não teme a polêmica:

- Os primeiros a se opor à minha idéia seriam os traficantes.

MARCELO GONZATTO

Fonte: Zero Hora - 06/09/2005

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  • Usuário Growroom

Alguém se habilita, a encontar este processo?

Estudante de Turismo é preso com cerca de 400 gramas de maconha

por SSP

http://www.agencia.se.gov.br/HomePages/asn...92?OpenDocument

Na manhã de hoje, dia 04, uma patrulha da Polícia Militar, que estava desenvolvendo suas atividades físicas corriqueiras, efetuou a prisão, em flagrante, de Tiago Braga Menezes, 25 anos, que foi pego com cerca de 400 gramas de maconha.

Tiago que estava transitando com uma moto da marca e modelo CG 125, na cor verde, nas imediações da casa de espetáculo Emes, na avenida Tancredo Neves, ficou assustado com a presença dos policias levantando suspeita. “Ao observar a nossa presença o suspeito diminuiu sensivelmente a velocidade e entrou em um posto de gasolina de forma estranha. Então cessamos nossas atividades físicas e utilizando uma viatura, que nos acompanhava, começamos as buscas ao encalce dele”, disse o tenente PM Jorge.

A Polia conseguiu efetuar a prisão de Tiago nas imediações de um posto de gasolina localizado próximo a boate Colosseo. No momento da revista foi encontrada a droga. Segundo Tiago, que é estudante do curso de Turismo da Universidade Tiradentes (UNIT), a maconha encontrada seria para consumo próprio.

O acusado foi encaminhado para a delegacia de Entorpecentes onde foi lavrado o flagrante.

Jurisprudência Relacionada:

http://www.dji.com.br/medicina_legal/maconha.htm

- Crime contra a saúde pública. Posse de entorpecente. Acusado preso em flagrante quando trazia consigo galho verde de maconha. Afirmação de que pretendia remédio para o rim, conforme lhe haviam aconselhado. Acolhimento da alegação. Operário de condição modesta e sem antecedentes criminais. Erro de fato ou de tipo configurado. Absolvição. Inteligência dos arts. 16 da L. 6.368-76 e 20 do CP. Trazer consigo galhos verdes de maconha não se enquadra perfeitamente naquela série de verbos constantes do Art. 12 da L. 6.368-76, não se sabendo, outrossim, na espécie dos autos, se o réu iria transformar ditos galhos em fumo, ou se iria plantá-los em algum lugar, para efeito de colher o material entorpecente (Ap.38.293-3, Lorena, TJSP, 2ª Câm., RT 606-327).

- Prisão albergue. Benefício concedido a réu condenado por tráfico de entorpecente. Inadmissibilidade. Delito incompatível com o cumprimento da pena em regime aberto. Cancelamento. Apelação provida. Inteligência dos arts. 33, § 3º, 35, § 1º, e 59 do CP e 12 da L. 6.368-76. O traficante de entorpecente é considerado perigoso, tanto assim que a lei não lhe faculta recorrer em liberdade. Não se justifica, pois, seja beneficiado, desde o início da pena, com a prisão-albergue (Ap. 41.046-3, São Paulo, TJSP, 1ª Câm., RT 606-312).

- Prisão albergue. Benefício negado a traficante de tóxico. Indivíduo de manifesta periculosidade. Decisão mantida. Ausência, porém, de incompatibilidade entre a natureza da infração e o benefício em tela. Não se reconhece incompatibilidade manifesta entre a prisão-albergue e a condenação por tráfico de entorpecente. Sem parti pris radicalizante da negativa absoluta, a concessão ou não do benefício deve ser estudada e resolvida em face de cada caso concreto (Ap. 37.768-3, Barueri, TJSP, 3ª Câm., RT 606-329).

- Liberdade provisória. Direito de recorrer em liberdade. Concessão a condenado por tráfico de entorpecente. Admissibilidade. Habeas corpus concedido. Inteligência dos arts. 594 do CPP e 35 da Lei Antitóxicos. Não constitui erro de direito a aplicação da regra geral do Art. 594 do CPP aos traficantes de entorpecentes, mesmo ante o disposto no Art. 35 da Lei Antitóxicos, evitando tal interpretação um critério de "dois pesos e duas medidas", diante do mais sagrado direito assegurado à pessoa humana, qual seja, o da liberdade de ir e vir (HC 10.082, São Paulo, TJRJ, 4ª Câm., RT 597-342).

- Crime contra a saúde pública. Tráfico de entorpecente. Maconha. Laudo desprovido de fundamentação. Falta de menção às técnicas e métodos empregados para a identificação botânica da erva. Princípio ativo desta não especificado. Absolvição decretada. Revisão deferida. Inteligência do Art. 12 da L. 6.368-76. A perícia desprovida de fundamentação não faz prova bastante do corpo de delito, notadamente tratando-se de maconha, vegetal dióico em que há diferença entre a planta feminina e a masculina. É mister, pois, sua identificação, uma vez que o princípio ativo da erva existe preponderantemente na planta feminina (Rev. 30.348-3, Guarulhos, TJSP, Seção Criminal, RT 607-305).

- Crime contra a saúde pública. Tráfico de entorpecente. Acusados presos em flagrante quando transportavam apreciável quantidade de maconha. Circunstância que, por si só, não importa a configuração do delito. Absolvição decretada. Inteligência do Art. 12 da L. 6.368-76. A apreensão de apreciável quantidade de tóxicos, por si só, não basta ao reconhecimento de traficância (Ap. 35.688-3, São Paulo, TJSP, RT 608-323).

- Crime contra a saúde pública. Posse de entorpecente. Delito não caracterizado. Quantidade insignificante de maconha apreendida em poder do acusado. Material com percentagem de THC muito inferior a 1%, inexpressiva em termos de princípio ativo do tóxico. Absolvição decretada. Inteligência do Art. 16 da L. 6.368-76. Nada representado em termos de THC (princípio ativo) a maconha apreendida em poder do acusado, dada sua insignificante quantidade (apenas 62 mg), configurado não se considera o delito de posse de entorpecente cuja prática a ele se atribui (Ap. 32.811-3, Itapeva, TJSP, 4ª Câm., RT 596-313).

- Crime contra a saúde pública. Posse de entorpecente. Delito não caracterizado. Inexistência de prova de sua materialidade consubstanciada no exame químico-toxicológico. Prova não suprida pela confissão de acusado. Absolvição decretada. Inteligência dos arts. 16 da L. 6.368-76 e 158 do CPP. A confissão do acusado, no inquérito e em juízo, de que trazia consigo maconha não supre a falta de exame químico-toxicológico. Trazer maconha consigo nem sempre é crime. O que a lei objetiva é a punição de quem traz consigo "substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica", nos expressos termos do Art. 16 da L. 6.368-76, que só o exame em questão pode comprovar (Ap. 32.385-3, Campinas, TJSP, 1ª Câm., RT 602-338).

Espero ter contribuido.

Abraços!

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Drogas: legalizar, tolerar ou proibir

Francisco Ribeiro Tavares*

Por hemporter

Fonte: http://www.fenapef.org.br/htm/com_tribuna.cfm?pg=2

Delegacia de repressão a entorpecentes, Divisão de repressão a entorpecentes, Coordenação de repressão a entorpecentes, Departamento de Narcóticos, e muitos outros cargos e funções de nomes pomposos. É o que rendeu até agora a luta especializada da polícia contra o tráfico de drogas. Milhares de cruzeiros, cruzados, reais e até dólares, gastos neste combate. Dezenas de policiais mortos, feridos, acuados ou corrompidos na luta diária contra as drogas.

Ah, não sejamos injustos, muita estatística também foi produzida por vários envolvidos nesta luta. Estatísticas estas todas tristes, mais ainda, estarrecedoras e desconcertantes. Tantos milhões de viciados e entre esses um alto percentual de soropositivos contaminados pelo compartilhamento de seringas. Tantos milhões de dólares aplicados no combate aos entorpecentes, em vez de em casas populares, geração de empregos, saneamento básico, etc.

Infelizmente não pára por aí, colecionamos ainda outros dados alarmantes, como por exemplo um número enorme de jovens e pais de família viciados, muitos policiais confusos, desviados, corrompidos, feridos ou mortos, pelo poder dos cartéis das drogas. Vidas inocentes ceifadas ou abreviadas por balas perdidas ou em confrontos com rivais. E, o que torna ainda mais improfícua toda a ação antidrogas, o poderoso aparato de apoio ao crime montado nas entranhas da própria polícia, do Ministério público, do Judiciário, das instituições financeiras, e até do Poder Legislativo em todos os níveis, que revive os Judas e os lobos em pele de cordeiro.

Em artigo publicado em julho de 2001, a conceituada revista The Economist cita que, apesar de os EUA gastarem de 35 a 40 bilhões de dólares ao ano, do contribuinte americano, no combate às drogas, o preço da cocaína e da heroína, caíram pela metade nas décadas de 1980 e 1990, o que significa que aumentou a oferta. Não é de todo descabida a desconfiança de que a superpotência americana usa o proibicionismo extremo das drogas apenas como uma desculpa para intervir, às vezes militarmente, em países como Colômbia, Bolívia, Peru, Afeganistão, Turquia, e manter assim sua influência global.

No entanto, afortunadamente o ser humano sofre de otimismo crônico e todos ficam tranqüilizados ao ouvir que agora o crime organizado está sendo enfrentado da forma correta, através do combate globalizado à lavagem de dinheiro. Longe de nós querermos ser agourentos, mas não conseguimos nos furtar à seguinte reflexão: será que o dinheiro sujo do crime e o dinheiro sujo da corrupção não usam as mesmas lavanderias? Será que os políticos e poderosos deixariam que se aprofundasse uma investigação que desvendasse suas artimanhas?

O certo é que a droga é motivo de guerra e destruição desde final do século XIX com a Guerra do Ópio, que terminou com a China entregando Hong-Kong à Inglaterra por 150 anos, como compensação por ter destruído 1300 toneladas de ópio da Índia, então colônia inglesa. Mais tarde, em 1909, na Conferência de Xangai, várias nações reunidas decidiram pela proibição da produção do ópio, proibição esta não muito obedecida. A China procurou então, apoio nos já influentes Estados Unidos da América, através da Liga das Nações, e foi convocada em 1911 a Convenção de Haia.

A China pretendia obter na Liga das Nações uma resolução que proibisse a Inglaterra de continuar produzindo ópio em suas colônias asiáticas. Isso demonstra, desde aqueles tempos, como a questão das drogas se mistura com economia e política, na presteza com que os Estados Unidos apoiaram a pretensão chinesa, que atingiria uma importante fonte de renda e poder do Império Britânico. A Inglaterra, então, para não perder sozinha, exigiu que fossem incluídos nas discussões os derivados do ópio, como a morfina, a heroína e a codeína, e também a cocaína. A Convenção de Haia se encerrou em janeiro de 1912 com a proibição da cocaína, do ópio e de seus derivados, excetuando-se desta proibição a codeína, que tem largo uso medicinal. Não é à toa que a década de 1920, quando efetivamente entrou em vigor a Convenção de Haia, ficou marcada pelo surgimento de grupos criminosos violentos e organizados, a maioria deles ligados ao comércio de drogas.

Têm surgido, atualmente, em todos os continentes, vários movimentos anti-proibicionismo, alguns defendendo a liberação ou a descriminalização do uso da maconha, outros o mesmo tratamento só que para todas as drogas atualmente proibidas. E há ainda os que defendem não só a descriminalização mas a legalização total de todas as drogas.

Todos os que defendem essas posições se apóiam em argumentos interessantes. Como já citado antes, em que pese o volume sempre crescente de recursos gastos no combate às drogas, essas se disseminam em progressão geométrica pelo mundo, o que nos evoca a figura mitológica da Hidra de Lerna, que ao ter uma de suas cabeças cortadas, imediatamente a recriava. Os adeptos da liberação defendem ainda, que a proibição cria o "efeito do fruto proibido", fazendo crescer o consumo principalmente entre os jovens. Outro tema largamente discutido, inclusive em meios acadêmicos e jurídicos, é o destino dado aos recursos arrecadados pelo tráfico de drogas. Sendo dinheiro de origem ilícita, obviamente não circula pelos canais da economia, alimentando o crime organizado como um todo, a corrupção policial e do judiciário, e mesmo financiando campanhas de políticos comprometidos com os interesses de seus financiadores.

O fato é que o tráfico de drogas, entre outros fatores, insufla a violência e a criminalidade, trazendo insegurança generalizada à sociedade. Após quase um século da implementação das proibições da Convenção de Haia, não há muito a comemorar quanto aos benefícios trazidos por ela. O volume de drogas consumido cresce a cada ano, novas drogas sintéticas de efeito maléfico impressionante no organismo surgem constantemente. Uma intervenção militar e policial não declarada dos EUA na Colômbia, não foi capaz de erradicar os plantios de coca e papoula na região, tendo como resultado mais comemorado a prisão e a morte de Pablo Escobar, o que serviu apenas para fazerem surgir novas lideranças e novos cartéis, mais modernizados e organizados, como a Hidra da mitologia.

Diversas personalidades políticas e intelectuais pelo mundo, acenam com a necessidade de ao menos repensar o atual sistema de repressão às drogas. Em recente solenidade comemorativa dos 200 anos da Universidade de Antioquia na Colômbia, que contou com a presença do presidente Álvaro Uribe, o escritor colombiano Garcia Márquez disse "...não é imaginável o fim do tráfico sem que se produza a legalização do consumo". Em outro documento intitulado "À Pátria amada, ainda que distante", o mesmo Garcia Márquez defende que "não é possível imaginar o fim da violência na Colômbia sem a eliminação do narcotráfico, e não é possível imaginar o fim do narcotráfico sem a legalização da droga, mais próspera a cada instante, quanto mais é proibida".

Em recente artigo intitulado "A droga e a dependência da ONU", Walter Fanganiello Maierovitch, ex Secretário Nacional Anti-drogas, e conhecido adversário do proibicionismo extremo da política americana conhecida como "War on Drugs", guerra às drogas, cita relatório da ONU que estima uma movimentação anual de US$400 bilhões do tráfico de drogas, mais US$ 290 bilhões do tráfico de armas", e diz que todo esse montante circula pelos canais internacionais de lavagem de dinheiro. Maierovitch cita ainda, o desconforto e isolamento dos representantes americanos nos órgão multilaterais da ONU que lidam com a questão das drogas, e em seus relatórios criticam asperamente as ONG's que procuram introduzir políticas de redução de danos, que segundo eles seria um passo em direção à legalização.

Walter Maierovitch se refere ainda, a novas políticas que têm sido implementadas por diferentes países europeus, como Inglaterra, Alemanha, Holanda, Suíça, Espanha, e até pelo Canadá, na direção de uso medicinal e terapêutico de drogas como a heroína e a maconha. Há ainda, casos como a Inglaterra e o Canadá que aprovaram leis descriminalizando o porte de pequenas porções de maconha. Alguns destes países adotaram, como medida sanitária, as narcossalas (safe injection rooms), como uma forma de ter um local especial para o uso de drogas, sem o risco de contaminação. O ex-juiz cita como outro resultado negativo da guerra às drogas da Casa Branca, o êxodo de populações rurais de áreas de cultivo, que tiveram plantações erradicados ou fumigadas indiscriminadamente. Este êxodo acabaria por acelerar o desmatamento de regiões de floresta amazônica, e no caso dos plantadores de papoula do Afeganistão, a migração de grandes contingentes de desempregados para outras modalidades criminosas.

Em 1992 Gustavo de Greiff assumiu a Procuradoria Geral da Colômbia, e teve como um dos maiores feitos de sua administração a prisão de Pablo Escobar, e o desmantelamento do Cartel de Medellín. Virou herói. De Greiff, no entanto, contrariou os mandamentos anti-drogas da superpotência, e não desfrutou seu prestígio por muito tempo. Em 1994, em uma conferência sobre drogas em Baltimore, EUA, declarou-se a favor da legalização das drogas, dizendo que "a proibição é um desperdício de energia". No mesmo ano o Procurador deixou o cargo e a Colômbia, e foi ser professor universitário no México.

Segundo a argentina Silvia Inchaurraga, secretária executiva da Rede Latino americana de redução de danos (RELARD), "legalizar as drogas não é legalizar as substâncias, é legalizar uma abordagem mais racional, efetiva, e humana dos problemas associados a elas e ao seu consumo. É uma alternativa à atual legalização de mentiras como a teoria da escalada (usar maconha leva a usar cocaína). A legalização é uma alternativa aos danos da proibição: contaminação de Aids pelo uso de seringa, violência policial, mercado clandestino, adulteração de substâncias e sobredoses."

O atual Secretário Nacional Anti-drogas, General Paulo Roberto Uchoa diz que o debate da descriminalização ou legalização ainda não chegou à SENAD, "mas vai chegar, e vamos discuti-lo, com isenção, espírito aberto, ouvindo todos os segmentos da sociedade. O Governo e a SENAD vão defender a posição que a sociedade adotar."

O psiquiatra, professor, doutor, e pesquisador da Escola Paulista de Medicina da UNIFESP, Ronaldo Laranjeira, por outro lado recomenda cautela na discussão da descriminalização do porte ou da legalização, levando em conta princípios de saúde pública. Ele alerta que toda política em relação a qualquer substância danosa à saúde, lícita ou ilícita, deve priorizar a redução do consumo total, e que uma eventual liberação faria aumentar o consumo devido à oferta maior e mais aberta. O pesquisador cita, ainda, o exemplo da Lei seca nos EUA nos anos 1920, que logrou diminuir drasticamente o consumo de bebidas alcoólicas naquele País, mas por outro lado, fez crescer o crime organizado, o contrabando e a lavagem de dinheiro, bem como constatou-se um número elevado de casos de intoxicação por ingestão de bebidas de procedência e qualidade duvidosas. Laranjeira defende que não há qualquer indicação de que a liberação total ou parcial das drogas seja benéfica para a sociedade, mas afirma que caso seja adotada, nunca deve acontecer desacompanhada de uma política de tratamento, desincentivo ao uso e redução de danos.

Em certos países onde a discussão está mais adiantada, já surgem questões como se em caso de liberação, o cultivo, produção e distribuição seriam terceirizados, sob concessão e fiscalização estatal, ou operados diretamente pela iniciativa privada, seguindo moldes já aplicados ao tabaco e ao álcool.

O certo é que a questão é altamente polêmica e sua discussão apenas engatinha. É notório também que o assunto envolve fortes paixões, às vezes por experiências pessoais ou próximas, outras por convicções religiosas ou morais, a exemplo de outros como transgênicos, aborto, células tronco, clonagem, etc. O que não dá para negar, no entanto, é que o modelo atual está desgastado e desacreditado. A sociedade de nossos dias não conseguirá evitar por muito mais tempo encarar estes questionamentos, racionalmente, sem paixões e sem precipitações. Nós policiais, mais do que qualquer cidadão, deveríamos remover os véus que envolvem o tema, e nos perguntar seriamente até quando vai se sustentar este modelo, em que a polícia finge que previne e reprime o tráfico, o judiciário finge que faz justiça, e todos vamos pra casa com a sensação do dever cumprido.

Ficarei realizado se após este artigo me deparar com colegas, que entre uma apreensão e outra, se detenham para se perguntarem se estão fazendo tudo que deveriam a respeito das drogas. Terei atingido meu objetivo se estas considerações suscitarem reflexões e questionamentos que contribuam para o debate. Os policiais federais têm entre suas atribuições, por força de norma constitucional (Art 144 §1º Inciso II), o combate ao tráfico de entorpecentes. Por que então não liderar, ou ao menos ter uma postura pró-ativa que contribua para repensar um tema de importância tão capital para a sociedade, sociedade esta para cuja segurança a Polícia Federal existe.

Francisco Ribeiro Tavares é Agente de Polícia Federal, de Primeira Classe, lotado na Superintendência Regional do DPF no Toncantis.

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Plantio de maconha sem provas de tráfico é porte

http://www.growroom.net/board/index.php?sh...=0entry297815

Usuário budder,

ae galera essa noticia foi tirada de:

http://conjur.estadao.com.br/static/text/39509,1

Para consumo

Plantio de maconha sem provas de tráfico é porte

por Fernando Porfírio

O plantio de maconha pode caracterizar tanto tráfico de drogas como posse de substância entorpecente. Diante da insuficiência de prova de tráfico, com o simples cultivo da maconha, entende-se que o cultivador tem a posse da substância, no caso, destinada ao uso próprio. Para se configurar tráfico seria necessário prova de venda ou fornecimento a terceiros.

Com essa tese, a Justiça de Cotia (SP) desclassificou para porte de entorpecente as acusações de tráfico que pesavam contra três réus e absolveu um outro por insuficiência de provas. A sentença foi proferida pelo juiz José Tadeu Picolo Zanoni, da 1ª Vara de Cotia.

O juiz condenou F. A. dos S. e A. T. dos S. a seis meses de detenção, em regime aberto, e ao pagamento de 20 dias-multa, podendo a pena de detenção ser trocada por multa. Na mesma sentença, condenou J. D. que, por ser reincidente, recebeu pena seis meses agravada de um sexto (sete meses). Neste caso o juiz não permitiu a conversão da pena em multa. Outro acusado, A. R. de A., foi absolvido.

Os fatos

Segundo a denúncia, no início de 2003, os réus associaram-se para semear, plantar e colher maconha numa área localizada na Estrada do Morro Grande, em Cotia. Até 15 de junho daquele ano, foram cultivados 35 pés da erva. Naquela data, dois acusados foram surpreendidos por guardas civis perto do local com fracos contendo sementes para o plantio. Foram detidos e levaram os guardas até os outros dois réus.

A defesa alegou que os interrogatórios foram feitos sem a presença de advogado e defendeu a fragilidade da prova, a atipicidade do plantio para uso próprio e a desclassificação do delito para porte de entorpecente (para J. D.) e a absolvição de F. e A.

Decisão

O juiz entendeu que as plantas ficavam dispersas no terreno e que, por isso, é impossível concluir, no caso, que se tratava de uma plantação de droga, capaz de ser enquadrada no tipo penas do artigo 12 da Lei de Tóxicos. “Vale dizer que não foram encontrados apetrechos de beneficiamento da droga e nem droga prensada, circunstâncias que, em outros casos, determinaram o reconhecimento do tráfico”, afirmou Zanoni.

No caso da acusação de associação para o tráfico, o juiz entendeu que no caso em questão tal dispositivo não pode ser aplicado por causa do caráter eventual, fortuito e casual do cultivo. “Não se provou haver associação entre ao acusados para o cultivo e tráfico da droga, mesmo porque não há a menor prova de mercancia da droga”, concluiu o juiz.

Leia a íntegra da sentença

PRIMEIRA VARA DA COMARCA DE COTIA

Processo n. 411/03

VISTOS

A JUSTIÇA PÚBLICA move ação penal contra F. A. DOS S., qualificado a fls. 19, A. T. DOS S., qualificado a fls. 25, J. D., qualificado a fls. 33 e A. R. DE A., qualificado a fls. 42, como incursos nas sanções dos artigos 12, parágrafo primeiro, inciso II e também artigo 14, ambos da lei n. 6368/76. Segundo consta da denúncia, a partir do começo do ano de 2003, na Estrada do Morro Grande, 12, Chácara Morro Grande, nesta cidade, os réus associaram-se para semear, cultivar e fazer colheita de plantas destinadas à preparação de substância entorpecente, capaz de determinar dependência física ou psíquica. Os réus semearam até o dia 15 de junho de 2003 e cultivaram 35 pés de maconha. No dia 15 de junho de 2003 guardas civis avistaram os réus J. e A. trafegando numa moto Honda CBS 200 Strada em atitude suspeita. J. jogou ao chão um frasco contendo sementes de maconha. Confessaram que faziam o plantio da erva e levaram os guardas até o local supra mencionado, onde faziam a plantação. Os guardas encontraram os outros dois réus também. Foram juntados laudos relativos à droga (fls. 90/92) e ao local (fls. 256/266).

A denúncia foi recebida (fls. 65, em 03 de julho de 2003). Os réus pediram a liberdade provisória (fls. 98/123, com documentos), sendo o pedido indeferido (fls. 125). Citados (fls. 127v.), foram interrogados (fls. 128/129 – F.; fls. 130/131- A.; fls. 132/133- A.; fls. 176/177- J.). Adno pediu a liberdade provisória (fls. 141/160, com documentos), que foi acolhido (fls. 162/162v.).

Os três réus presos reiteraram o pedido de liberdade (fls. 187/188), sendo indeferido (fls. 190). Apresentaram suas defesas (fls. 207/208 – A.; fls. 209/211 - os demais).

Foram ouvidas testemunhas de acusação (fls. 219/222) e de defesa (fls. 223/225, 237/239). Os réus reiteraram o pedido de soltura (fls. 247/249), que foi indeferido (fls. 253). Posteriormente, concedeu-se liberdade provisória para os réus F. e A. (fls. 270/270v., em 19 de novembro de 2003).

Foi ouvida mais uma testemunha de defesa (fls. 295). O MP ofertou exceção de impedimento (fls. 298), que está apensada ao terceiro volume dos autos.

Em alegações finais, o órgão acusatório pediu a procedência parcial da denúncia, com a condenação de todos os réus, com exceção de A. (fls. 306/310). A pena de J. é pedida acima do mínimo legal, ante sua reincidência. J., F. e A. apresentaram alegações finais (fls. 312/319), invocando: a) realização dos interrogatórios de forma antecipada sem a presença dos defensores; B) fragilidade da prova no que se refere a A. e F.; c) atipicidade do plantio para uso próprio; d) desclassificação do delito para o tipo do artigo 16 no tocante a J. e absolvição de F. e A.

Foi concedida segurança para determinar a realização de novo interrogatório dos réus Alexandre, Floriano e Junio (fls. 328/331). Os réus foram interrogados novamente (fls. 350/351- Floriano; fls. 352/353- Adno; fls. 354/355 – Alexandre; fls. 377/378- Junio).

Finalmente, o réu Adno apresentou alegações finais (fls. 441/444). Foi determinada a reabertura de vista dos autos para as partes para novas alegações finais, tendo em vista a realização de novos interrogatórios (fls. 445/445v.). O MP e Adno reiteraram as alegações anteriores (fls. 456 e 456v.). Os demais réus falaram a fls. 458/460.

É o relatório. DECIDO.

Depois da instrução dos autos e dos dois interrogatórios dos réus, é o caso de analisar a prova colhida, proferindo-se a decisão aguardada. Desde já, considerando a prova colhida e o pedido ministerial, fica aceito o pedido de absolvição de Adno Ruas de Abreu. A prova será examinada apenas no que se refere aos outros três acusados.

O réu Floriano de Andrade dos Santos, quando interrogado a fls. 129, reconheceu que plantava a droga para uso próprio. Junio e Alexandre também faziam uso da droga plantada. Já Alexandre (fls. 131), disse que a droga era plantada por Junio, que trabalhava com o pai, Floriano. Deixaram que Junio plantasse porque era usuário. Junio reconheceu que a plantação era dele. A plantação ocorria no terreno em que Floriano e Alexandre também moravam. Disse que os outros réus não tinham relação com os fatos.

Posteriormente, no segundo interrogatório, Floriano confirmou o anterior, mas disse que jogava as sementes, sem querer plantar (fls. 351). Disse que fumava, mas não o faz mais. Alexandre, por outro lado, disse que ao chegar em casa no dia da prisão a polícia já estava por lá (fls. 355). Disse também que somente Junio e Floriano, seu pai, faziam uso dos pés plantados. Junio, novamente interrogado, negou que plantasse a droga. Disse, por outro lado, que ia sempre ao sítio de Floriano, onde fazia uso da droga.

A testemunha de fls. 219/220 disse que Junio reconheceu que plantava a droga para uso próprio. “Floriano e seu filho disseram que plantavam os pés para uso próprio” (fls. 219). Já Adno disse desconhecer as sementes. O depoente de fls. 221 disse que foi Junio quem dispensou o frasco com as sementes de maconha. Segundo tal testemunha, Alexandre e Floriano também disseram que os pés eram para uso próprio.

Considerando a prova colhida, temos que é clara uma coisa: os réus não vendiam a droga para terceiros. Alexandre e Floriano eram os ocupantes do imóvel e a droga, com maior ou menor grau de cuidado, crescia ali. O laudo descreve assim a propriedade (grifos nossos): “Ofereceu interesse a perícia a horta, onde os canteiros separados por madeira, havia couve, pés de pimenta e dispersos entre os canteiros pés de planta arbustiva aparentemente de maconha, alguns tinham cerca de quinze centímetros de altura e outros com quarenta centímetros aproximadamente. A planta possuía folhas afiladas e serrilhadas nas bordas, galhos com três folhas grandes e duas pequenas, as nervuras eram aparentes. Os pés foram arrancados, perfazendo um total de 21 pés”. A droga era usada somente pelos réus, Floriano, Alexandre e Junio. Houve divergências entre eles a respeito da origem da plantação mas todos eles reconheceram o uso da droga por eles plantada.

É certo que boa parte da jurisprudência determina que, havendo cultivo da droga, existe o crime ora imputado. Com o devido respeito, no presente caso, tal solução está longe de justa. Como dito e frisado acima, as plantas ficavam dispersas do terreno. É impossível dizer que isso é uma plantação de droga, digna de ser enquadrada em tipo penal como o artigo 12 da lei de Tóxicos. Um dos réus disse que jogava as sementes e depois regava as plantas. Se isso é crível ou não, é certo que as plantas estavam dispersas pelo terreno, como dito, não por este Juiz, mas pelo perito do Instituto de Criminalística. É correto afirmar que isso caracterizava uma plantação? Parece que não.

Apesar da defesa afirmar que a desclassificação para porte é ilegal, fundada em V. Acórdão proferido em caso de Barueri, temos que a desclassificação para delito do artigo 16 da lei n. 6368/76 é a solução que se coloca como mais correta e com amparo jurisprudencial. Vale dizer que não foram encontrados apetrechos de beneficiamento da droga e nem droga prensada, circunstâncias que, em outros casos, determinaram o reconhecimento do tráfico. Vejamos alguns casos (grifos nossos):

TÓXICO - Tráfico - Semeadura e cultivo no quintal da residência - Ausência de prova da venda ou fornecimento a terceiros - Desclassificação para a figura do artigo 16 da Lei n.º 6.368/76 - Recurso parcialmente provido. Punir-se alguém com o mínimo de três anos de reclusão desde que plante maconha, seja em que circunstância for, é objetivo que não se compadece com o estágio de evolução do Direito Penal moderno, franca e escancaradamente subjetivista. (Apelação Criminal n.º 176.722-3 - Dracena - Relator: POÇAS LEITÃO - CCRIM 5 - V.U. - 16.03.95)

TÓXICO - Uso próprio - Cultivo de plantas de maconha destinadas à manutenção do próprio vício - Ato que pressupõe a posse da substância entorpecente - Adequação ao artigo 16 da Lei n. 6.368/76 - Inexistente a prova do destino ao comércio ou a terceiros - Condenação - Recurso provido. Com o simples cultivo da maconha, o cultivador tem a posse da substância entorpecente, no caso, destinada ao próprio uso diante da absoluta insuficiência de prova do tráfico. (Apelação Criminal n. 255.681-3 - Casa Branca - 1ª Câmara Criminal Extraordinária - Relator: Pereira da Silva - 26.04.00 - V.U.)

TRÁFICO DE ENTORPECENTES - Cultivo - Inconfigurada a figura típica do art. 12, parágrafo 1º, II, da Lei de Tóxicos - Acusado que cultivava em vaso duas tenras plantas, identificadas como sendo maconha, com altura de quatro a quinze centímetros, sabidamente a desenvolver-se ao porte de arbusto, quando então passa a servir-se para a colheita de matéria prima (folhas). Ademais, não elucidada na perícia a presença do princípio ativo ou o específico elemento intoxicante - Recurso parcialmente provido. (Apelação Criminal n. 312.982-3 - Campos do Jordão - São Paulo - 3ª Câmara Criminal do Tribunal - Relator: Gonçalves Nogueira - 28.11.00 - M.V.)

CRIME CONTRA A SAÚDE PÚBLICA - Tráfico de entorpecente - Cultivo de maconha - Incerteza quanto à finalidade de traficância - Desclassificação do delito para o do art. 16 da Lei 6.368/76 (TJRS - Ement.) RT 610/410

CRIME CONTRA A SAÚDE PÚBLICA - Tráfico de entorpecente - Plantio de maconha - Ausência de prova nos autos de ser o acusado traficante - Condição de viciado, contudo, irretorquível - Desclassificação operada - Apelação provida - Inteligência dos arts. 12, § 1º, II, e 16 da Lei 6.368/76 (TJSC - Ement.) RT 544/422

No tocante ao delito do artigo 14 da mesma lei, temos que o mesmo não se aplica ao presente caso, dado o caráter eventual, fortuito, casual do cultivo. Não se provou haver associação entre os acusados para o cultivo e tráfico da droga, mesmo porque não há a menor prova de mercancia da droga. Também existe respaldo jurisprudencial para isso:

CRIME CONTRA A SAÚDE PÚBLICA - Cultivo de maconha - Co-autoria - Acusado que permite a semeadura em quintal de sua residência pelos co-réus - Figura do art. 14 da Lei 6.368/76, contudo, ausente na espécie - Recurso provido (TACrimSP - Ement.) RT 532/381

Considerando tudo isso, deve ocorrer a desclassificação para o delito de porte de entorpecente. Dois dos réus, Floriano e Alexandre, devem receber as penas mínimas, ou seja, seis meses de detenção, em regime aberto, e pagamento de vinte dias-multa. A pena detentiva deve ser trocada por multa, no seu piso mínimo, dez dias-multa. Junio, que é reincidente (fls. 17) do apenso próprio, deve receber a pena mínima, seis meses, agravada de um sexto, resultando em sete meses de detenção, em regime aberto. Incabível a conversão em multa por conta da reincidência.

Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a denúncia para: a) absolver o réu ADNO RUAS DE ABREU, qualificado a fls. 42, das imputações sobre ele incidentes, com base no artigo 386, IV, do CPP; B) condenar os réus FLORIANO ANDRADE DOS SANTOS, qualificado a fls. 19, ALEXANDRE TESSIONE DOS SANTOS, qualificado a fls. 25, JUNIO DUARTE, qualificado a fls. 33, como incursos nas sanções dos artigos 16, caput da lei n. 6368/76, desclassificando a imputação feita, à pena de seis meses de detenção, em regime aberto, e ao pagamento de vinte dias-multa, para os dois primeiros, e sete meses de detenção, em regime aberto, e pagamento de vinte dias-multa, sendo cada um deles no valor legal mínimo. Para os dois primeiros, converto a pena detentiva em pecuniária, resultando em dez dias-multa, cada um deles no valor mínimo legal. Absolvo estes três réus da imputação feita relativamente ao artigo 14 da lei n. 6368/76, com base no artigo 386, VI, do CPP.

Os réus poderão recorrer em liberdade. Transitada esta em julgado, lancem-se os nomes dos três condenados no rol dos culpados e expeça-se o necessário.

P.R.I.C.

Cotia, 10 de agosto de 2005.

JOSÉ TADEU PICOLO ZANONI

Juiz de Direito

Revista Consultor Jurídico, 17 de novembro de 2005

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Semear e cultivar plantas destinadas à preparação de entorpecentes para uso próprio: fato típico ou atípico?

Por Clovis Alberto Volpe Filho

Visando a objetividade, o presente artigo quer tentar trazer algumas elucidações sobre a seguinte questão: O sujeito que cultiva planta que pode originar substância entorpecente, para uso próprio, pratica crime? A resposta para esta indagação é fornecida de várias formas pela doutrina e jurisprudência.

Isso porque, de acordo com a Lei 6.368/76 (Lei de Tóxico) o agente que semeia, cultiva ou faz colheita de planta com efeito psicotrópico, é punido com pena de 3 a 15 anos, mais pagamento de multa. Contudo, o art. 12, parágrafo 1º, inciso II, que regula tal conduta não distingui se a conduta é praticada com o fim de tráfico ou consumo pessoal.

À vista disto, indaga-se: como enquadrar o agente que planta droga para uso próprio, como o sujeito que mantém, em sua casa, um pequeno canteiro onde cultiva Cannabis sativum?

Daí resulta a problemática do presente artigo. Capez [1] entende que a conduta descrita acima é um fato atípico, pois tal conduta não se enquadra em tipo penal algum. Damásio segue a mesma linha, ao asseverar que:

O fato de semear, cultivar ou fazer a colheita, para uso próprio, de substância destinada a preparação de entorpecente não se encontra tipicamente definido como crime no art. 12 nem no art. 16 dessa Lei. É atípico. E não há crime sem lei que o defina (CP, art. 1º). [2]

Outra posição perfila o caminho da punição pelo próprio art. 12, parágrafo 1º, inciso II, ou seja, a lei pune em todos os sentidos, pois não distingue aquele que planta para uso próprio ou para o tráfico (vide RT 668/303 e 555/324).

Para que uma conduta seja considerada atípica é necessário que não haja o enquadramento entre a conduta e o tipo penal definido em lei. Existe ainda a posição que ecoa com mais freqüência nos Tribunais, vejamos. Tentando amenizar o caso, mas ainda agindo de forma equivocada, alguns magistrados estão aplicando a aquele que planta para uso próprio, as mesmas medidas cabíveis para aquele que traz consigo, guarda e adquiri também para uso próprio (art. 16). Afirmam que, ao aplicar a referida regra, estão se valendo de analogia in bonam partem de norma penal incriminadora.

Nossa posição se difere das três destacadas acima.

A conduta de “plantar” substâncias entorpecentes submete-se as mesmas penas do crime de tráfico, sendo inclusive desmembramento do artigo que regula este crime (art. 12), mais precisamente no § 1º, inciso II. Caso o legislador objetivasse punir aquele que planta maconha para uso próprio, teria regulado essa conduta no art. 16, que fundamenta o crime de porte ou posse, para uso próprio, de substância entorpecente.

Logo após o referido artigo, haveria a mesma disposição que existe no crime de tráfico, só que agora regulando a conduta de plantar para uso próprio. Seria uma aberração jurídica o sujeito ser condenado nas penas do tráfico por plantar maconha para uso próprio, enquanto que o outro que é surpreendido com um “baseado”, também para uso próprio, atualmente, é beneficiado, em princípio, pela transação penal.

Assim, resta evidente que a tese do enquadramento para quem planta maconha visando o consumo próprio no art. 12, parágrafo 1º, inciso II é insustentável no âmbito jurídico penal.

Não comungamos também com a incriminação, sem o devido enquadramento, nos moldes do art. 16, que tenta amenizar a situação com fundamento na analogia in bonam partem. Tal argumento é equivocado, eis que no caso em questão não há lacuna na lei. Há um tipo penal que apenas incrimina pessoa que planta para o tráfico, e não para uso próprio. Ao julgarem o sujeito que planta maconha para fumar em sua casa de acordo com o art. 16, estão, na verdade, legislando, ferindo o princípio da separação dos poderes; e punindo sem ter lei que defina o crime, dilacerando o princípio da legalidade. Criam um novo verbo no art. 16, o que leva a concluir ofensa a legalidade.

Em relação a posição que pontua ser atípica a conduta de plantar para uso próprio, ela deve ser acolhida em partes.

Para que uma conduta seja considerada atípica é necessário que não haja o enquadramento entre a conduta e o tipo penal definido em lei.

É certo que “plantar” (entendida aqui como semear, cultivar e colher) não se confunde com “adquirir” e muito menos com “trazer consigo”. Não pode se equiparar também ao verbo “guardar”.

No entanto, o que pode ter fundamentação jurídica plausível é a afirmação no sentido de que há o enquadramento no verbo “guarda”, desde que a planta cultivada já seja a própria substancia entorpecente.

Com efeito, quem planta, por exemplo, um pé de maconha também está guardando, pois toma conta, vigia, zela, preserva, protege, etc, não no sentido de cultivar ou semear, mas pelo fato da planta conter o princípio ativo caracterizador e poder ser consumida in natura. Na verdade a conduta do agente é a de guardar a própria substância entorpecente.

É de boa prudência trabalharmos essa assertiva. O art. 12, § 1º, inc. II, estabelece o seguinte: Nas mesmas penas incorre quem, indevidamente: semeia, cultiva ou faz a colheita de plantas destinadas à preparação de entorpecente ... (grifo nosso).

Percebe-se que o tipo penal não trata a planta como substância entorpecente, mas sim como algo que será destinado a tal fim. O art. 16, por sua vez, prescreve o seguinte: “Adquirir, guardar ou trazer consigo, para uso próprio, substância entorpecente ou que determine dependência...” (grifo nosso).

Note-se que o legislador só incrimina aquele que guarda substância entorpecente, e não plantas destinadas à preparação de entorpecente.

Então, no nosso entender haverá fato típico configurado a atitude do agente de cultivar ou semear planta que não precisa de preparação para ser usada, pois, por si só, já se configura substância entorpecente. Assim, por conseqüência óbvia, estará guardando a droga proibida, não importando que esteja em um vaso, ou em um canteiro. O que importa é que existe substância entorpecente sendo guardada, não interessando sua forma.

Não se leva em conta o cultivar ou o colher, pois a partir do momento que se tem a substância entorpecente, é irrelevante saber se há cultivo. O sujeito não é punido criminalmente por cultivar, mas sim pelo fato de guardar em sua casa substância entorpecente, para consumo próprio.

Com efeito, aquele sujeito que tem planta de maconha em casa poderá ser responsabilizado penalmente nos moldes do art. 16, da Lei de Tóxico, por guardar substância entorpecente para uso próprio, desde que a maconha possa ser consumida in natura, não sendo necessário qualquer ato de extração.

É cediço que o THC (tetrahidrocanabinol), princípio ativo proibido no país, é uma substância química fabricada pela própria maconha, sendo o principal responsável pelos efeitos da planta, e que está presente em praticamente todas as partes da planta. Agora, se a erva em questão não contém o princípio ativo, por qualquer motivo, inclusive por ser muito nova, o agente não pratica crime algum. Posto que aqui temos apenas a planta destinada à preparação do entorpecente, e não a substância entorpecente.

Mesmo porque, há vários julgados que consideram folhas de maconha, folhas de coca, galhos de maconha inócuos, não constituindo objeto material do delito, por falta do princípio ativo (cite-se RT 476/368, RT 608/327, RT 588/310).

Frise-se que é imprescindível que a planta possa ser consumida in natura, pois do contrário o fato será atípico. Haja vista que a punição no art. 16 é somente a guarda de substância entorpecente, e não plantas destinadas ao preparo. É óbvio que, pela leitura do art. 16, deve ser entendido somente a substância entorpecente pronta para ser utilizada, pois o próprio artigo contém a expressão “para uso próprio”. Se for para uso, deve ser utilizada; e se deve ser utilizada, deve estar apta para tanto.

Qualquer ato para extração da substância na planta pode ser considerado como fato descaracterizador da figura típica contida no art. 16.

Em suma, é imprescindível saber se as plantas que podem originar substâncias entorpecentes e/ou psicotrópicas, como a Cannabis sativum, Claviceps paspali, Datura suaveolans, Erytroxylum coca, Lophophora williamsii (Cacto peyote), Prestonia amazonica (Haemadictyon amazonicum), contém a substância proscrita e podem ser consumidas in natura, sem necessidade de alguma espera ou preparação.

...o legislador basilar não quer descriminar o uso de entorpecente, mas apenas reduziu a carga punitiva. Em outros termos, usar drogas é, e será, crime. Não podemos, neste singelo artigo, nos atrever em determinar quais casos a planta pode ser considerada a própria substância entorpecente, pois falta-nos competência para tanto; é evidente que cada caso deverá ser analisado por peritos capazes de informar se a planta, além de possuir o princípio ativo, pode ser consumida in natura, posto que se apresenta como a própria substância entorpecente.

Caso necessite de algum tipo de extração da planta para obtenção da substância entorpecente, e ela for destinada para consumo próprio, não haverá crime algum. Implicando apenas em destruição da planta, nos moldes do art. 8, § 2º, da Lei 10.409/02.

Por fim, resta mencionar que tramita no Congresso Nacional um Projeto de Lei (PL n.º 7.134/02) que, além de amenizar a sanção ao usuário, tipifica a conduta de semear, cultivar plantas destinadas à preparação de entorpecente para uso próprio, o que põe fim a discussão doutrinária. Esse dispositivo reza que o indivíduo que, p. ex., plantar maconha em vaso, receberá as mesmas sanções do porte, ou seja, advertência, serviços a comunidade, ou medidas educativas. Ressalte-se que há possibilidade do juiz determinar que o delinqüente submeta-se a tratamento de saúde. Abaixo transcrevemos o artigo do Projeto de Lei que faz referência ao porte e plantio para uso próprio:

Art. 27. As penas previstas neste Capítulo poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente, bem como substituídas a qualquer tempo, ouvidos o Ministério Público e o defensor.

Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

I – advertência sobre os efeitos das drogas;

II - prestação de serviços à comunidade;

III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

§ 1º Incorre nas mesmas penas quem, para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de drogas, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

O que deve restar cristalino é que o legislador basilar não quer descriminar o uso de entorpecente, mas apenas reduziu a carga punitiva. Em outros termos, usar drogas é, e será, crime.

Conclusão

Sem o atrevimento pueril de querer se revestir da razão, entendemos que frente à legislação que rege a matéria atualmente, deve-se entender que semear, cultivar e colher plantas destinadas à preparação de substâncias entorpecentes, para consumo próprio, é uma conduta atípica.

Será, todavia, típica, se a planta semeada, cultivada ou colhida, para uso próprio, contiver o princípio ativo da substância e puder ser consumida in natura, sem necessidade de algum tipo de extração ou outro procedimento para o consumo, pois, neste caso teremos o enquadramento no art. 16, acolhido pelo verbo “guardar” e pelas expressões “substância entorpecente” e “uso próprio”.

Bibliografia

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal. 15. ed. Rio de Janeiro: Forenses, 1994.

FRANCO, Alberto Silva (Coord.). Leis penais especiais e sua interpretação jurisprudencial. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. v. 2.

GRECO FILHO, Vicente. Tóxicos-Prevenção-Repressão. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 1996.

JESUS, Damásio E. Lei antitóxico anotada. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2001.

SZNICK, Valdir. Lei anti-tóxico. São Paulo: Pillares, 2004.

[1] CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 37.

[2] JESUS, Damásio E. Lei antitóxico anotada. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 50.

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Amigos, os casos do DKD e do Lowrider são bons exemplos pra este tópico de jurisprudência, não?

Será que esperando eles curtirem bastante com a família e amigos a merecida liberdade podemos disponibilizar as decisões jurídicas aqui?

E no mais, nunca é demais: seja bem vindo à sua liberdade, Low! Seja bem vindo à sua liberdade DKD!

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  • 4 weeks later...
  • 11 months later...
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Tenho uma audiência na próxima quarta, eu + um amigo, 4 plantas, e algumas sementes q disseram ser Cannabis Sativa tipo L, tudo foi pro lab, e as 4 plantas não deu nada de principio ativo, apenas as sementes, do tal tipo L, o q será q pode aconteçer?Tipo L?alguem sabe pq esse tipoL?

valeu

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Cannabis Sativa Lineu

É o genero da planta, pelo que sei todos os tipos fazem parte deste genero, tanto a indica quanto a sativa ou a ruderalis sao consideradas Cannabis Sativa Lineu, ao menos para a legislação brasileira, pois a portaria da anvisa que determina as substancias proibidas só menciona a cannabis sativa lineu.

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Tenho uma audiência na próxima quarta, eu + um amigo, 4 plantas, e algumas sementes q disseram ser Cannabis Sativa tipo L, tudo foi pro lab, e as 4 plantas não deu nada de principio ativo, apenas as sementes, do tal tipo L, o q será q pode aconteçer?Tipo L?alguem sabe pq esse tipoL?

valeu

E aê irmão, conta como foi q aconteceu de vc rodar com essas plantas. Como os policiais agiram?? O que o delegado falou e tal??? <_<

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  • Usuário Growroom

Po cara tava eu e um amigo, sempre sem carro, mas fomos instalar as meninas ai resolvemos ir de carro, q fico meio de mocó, estavamos com a mão na massa derrepente 2 gcm vieram descendo até onde a gente estava, com os berro na mão local isolado total de 7 plantas 3 deu pra moca, 4 q tava dentro de uma mochila fudeu, ai foi akela parada cade o resto, alguns min. depois chegaram + 3.

Depois de muito blablabla, 4 m levaram onde estavamos instalando an meninas ai foi só pressão, levei um sacode de leve , ai o que chegou primeiro me pegou e fomos pro dp, lá foi só terror psicológico né, imagina 1 cara totalmente honesto em sua vida ser preso por causa de uma planta, depois de 11 horas fomos liberados, e amanhã as 16,30 é q é a hora da verdade, hehe.

por isso o segredo da coisa não é só segredo mas tb, o cuidado pra q alheios não ganhem nada!

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