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Artigo Publicado: Cannabis Medicinal: Não Lemos E Não-Gostamos?


Dr. Cann

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  • Usuário Growroom

Cannabis Medicinal

G:Patricia

Cannabis Medicinal: Não lemos e não-gostamos?

Em Maio deste ano foi realizado o Simpósio Internacional: “Por uma

Agência Brasileira da Cannabis Medicinal?” sob minha presidência,

contando com a participação de cientistas do Brasil, Canadá, Estados

Unidos, Inglaterra e Holanda, representantes brasileiros de vários órgãos

públicos, sociedades científicas e numerosa audiência. Após dois dias de

intensas discussões foi aprovado por unanimidade um documento

recomendando ao Governo Federal a oficialização da criação da Agência

Brasileira da Cannabis Medicinal.

Esperava uma discussão posterior, científica e acalorada, pois sabia de

algumas opiniões contrárias à proposta. Entre estas o parecer do

Departamento de Dependência Química da Associação Brasileira de

Psiquiatria (ABP) cujos representantes compareceram apenas para

apresentar seu parecer, ausentando-se totalmente, antes e depois, de

todo o restante do simpósio.

Esta havendo sim a esperada discussão, veiculada principalmente através

da Folha de São Paulo, mas num nível de entristecer. De fato, expressões

como – “o dom de iludir”; “Lobby da maconha”; “Maconhabras”; “uma

idéia fixa: a legalização das drogas”; “elementos com pretensa

respeitabilidade”; “paixão dos lobistas”; “exemplo de indigência

intelectual”; “querem maiores facilitações para o consumo”; “travestidos

de neurocientistas”; – não se coadunam com a seriedade que deve

prevalecer em qualquer discussão científica. Os autores de tais infelizes

afirmações certamente não leram a celebre frase de Claude Bernard, o

pai da medicina experimental: “em ciência criticar não é sinônimo de

denegrir”.

Por outro lado, os contrários ao uso medicinal da maconha utilizaram de

argumentos inverídicos (para dizer o mínimo) quando tentam criar uma Cannabis Medicinal

G:Patricia

atmosfera de pânico, desviando o foco da atenção (maconha como

medicamento). Assim:

Legalização da Maconha – O item 6 da carta do Simpósio diz

cristalinamente: “o uso clínico dos derivados da Cannabis sativa

L ou de seus derivados naturais ou sintéticos não pode ser

confundido com o uso recreativo (não-médico) da planta”. Os

autores das infelizes frases não leram, portanto, esta resolução.

“O uso médico esta longe de receber aprovações de órgãos

como a Agência FDA dos EUA”, dizem os autores das

afirmativas.

Ora, um princípio ativo da maconha, o ∆

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-THC, esta aprovado como

medicamento por esta Agência desde a década de 1990, sendo o produto

Marinol® produzido e utilizado nos Estados Unidos, e exportado para

vários países há quase 20 anos.

Portanto, os autores de tal afirmativa também não leram nada a

respeito. Mas não é só isso, pois a maconha e seus derivados também já

têm aprovação para uso médico em países como Canadá, Reino Unido,

Holanda e Espanha. A Ministra da Saúde da Espanha chegou a declarar:

ao aprovar o seu uso para a Esclerose Múltipla: “O uso terapêutico da

cannabis é estudado há anos, por isso existem testes clínicos e evidências

científicas de sua utilidade em determinadas doenças”

Dizem ainda os autores das frases: “O uso terapêutico da maconha

não tem comprovação científica. Se recomendado negaria a busca

da ciência... por produtos cada vez mais seguros”.

A Dra. Nora Volkow diretora do Instituto Nacional do Abuso de Drogas

(NIDA) dos Estados Unidos declarou em Março deste ano a uma revista

brasileira “Não existe droga segura”, o que é uma verdade, também para

a maconha. Vem daí a necessidade de um médico estudar a relação

risco/benefício de qualquer droga que prescreve. Por exemplo, segundo Cannabis Medicinal

G:Patricia

dados do FDA de 1997 a 2005 houve 196 relatos de suspeita de morte

coincidente com o uso de antieméticos (uma indicação também aprovada

para a maconha). Não houve nenhuma suspeita de morte pelo uso da

maconha. Por outro lado a Dra. Valéria declarou também que os

canabinóides têm algumas ações terapêuticas úteis como efeito

antiemético, aumento do apetite em casos de câncer e AIDS, benefícios

analgésicos e em glaucoma.

A alegação de que “não precisamos que o Governo Federal crie, por

meio de Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD), uma agência para

.....a maconhabras”

Primeiramente é preciso esclarecer que a SENAD é uma sigla para

Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, conforme já aprovado há

mais de três anos; portanto, os autores dos artigos na Folha de São Paulo

não leram a respeito. É preciso ainda esclarecer que a SENAD não

patrocinou e não auxiliou com qualquer quantia a realização do Simpósio.

Por outro lado, por se ausentarem de quase todo o simpósio, não sabem

que o solicitado na carta foi a “oficialização” à ONU do nome de Agência

Nacional da Cannabis Medicinal; conforme enfatizado pelo INCB, órgão

da ONU, em 2009. De fato, as leis necessárias para esta criação já foram

aprovadas pela Lei 11.343 de 23/08/2006 e seu Decreto regulamentador

nº 5.912 de 27/09/2006.

“A maconha causa dependência” segundo os autores das frases.

Ninguém nega esta propriedade indesejável da maconha, como

também ocorre com muitos outros medicamentos. Mais uma vez

cabe a análise da relação risco/benefício ao se utilizar os derivados

da maconha ou de qualquer outra droga. Teriam os autores da frase

opinião semelhante a muitos outros medicamentos que são fortes

indutores de dependência como morfina e vários outros opiáceos

responsáveis por milhares e milhares de casos desta reação Cannabis Medicinal

G:Patricia

adversa? Pretenderiam eles solicitar proibição de uso clínico destas

drogas?

“Até hoje há pouco estudos controlados, com amostras pequenas” e

“o uso de terapêuticos da maconha não tem comprovação

científica...”

Muita literatura médica precisaria ser lida para permitir afirmativa tão

categórica. Existem já dezenas de livros e centenas de artigos científicos

publicados sobre as propriedades medicinais da maconha. Por exemplo,

em duas extensas revisões recentes (Journal of Ethnopharmacology 105,

1-25, 2006; Cannabinoids 5 (special issue), 1-21, 2010) mais de uma

centena de trabalhos científicos são analisados, a maioria deles

demonstrando os efeitos que são negados pelos autores das frases. Estas

revisões concluem que: “cannabinóides apresentam um interessante

potencial terapêutico, principalmente como analgésicos em dor

neuropática, estimulante do apetite em moléstias debilitantes (câncer e

AIDS) bem como no tratamento da esclerose múltipla”.

Há ainda a salientar que várias sociedades científicas americanas já se

posicionaram favoravelmente ao uso médico da maconha tais como:

Associação Psiquiátrica Americana, Sociedade de Leucemia e Linfoma dos

EUA, American College of Physicians e Associação Médica Americana.

Isto sem contar que os Ministérios da Saúde do Canadá, Estados Unidos,

Espanha, Dinamarca e Reino Unido já aprovaram o uso medicinal.

Segundo os autores das frases os proponentes da Cannabis

Medicinal usam a “estratégia de confundir o debate” e “...a

confusão fica por conta de a ativistas comprometidos com a

causa da legalização”

Ora, esta argumentação poderia bem ser utilizada no sentido oposto,

como pareceria ser o caso. Sendo totalmente contrário a qualquer uso da

maconha investem contra o seu uso medicinal, parecendo tentar Cannabis Medicinal

G:Patricia

convencer o público de que aprovação do uso médico e legalização

seriam a mesma coisa, o que esta longe de ser verdadeiro. É bem possível

que um forte sentimento ideológico possa estar por trás da confusão

armada, o que seria lamentável. Para continuar uma discussão científica

minimamente aceitável dever-se-ia por iniciar a leitura de dois artigos

publicados neste ano de 2010, em duas das mais serias e respeitáveis

revistas científicas do mundo: “Maconha médica e a Lei” (New England

Journal of Medicine 362, 1453-1457, 2010) e “Como a Ideologia modela a

evidencia e a política: o que conhecemos sobre o uso da maconha e o que

deveríamos fazer?” (Addiction 105, 1326-1330, 2010).

Realmente, sem ler não é possível continuar este debate! Sugiro que

todos façam “o dever de casa”, atualizando o seu conhecimento com as

leituras de mais artigos científicos recentes.

E. A. Carlini

Professor-Titular de Psicofarmacologia –

UNIFESP

Diretor do CEBRID – Centro Brasileiro de

Informações sobre Drogas Psicotrópicas

Membro Titular do CONED (Conselho Nacional

de Políticas sobre Drogas)

Membro do Comitê de Peritos sobre Álcool e

Drogas OMS (7º mandato)

Ex-membro do Conselho Internacional de

Controle de Narcóticos (INCB – ONU) (2002-

2007)

fonte: http://www.proad.unifesp.br/pdf/Cannabis_Medicinal.pdf

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