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Clube Social Da Maconha Na Espanha


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Clube Social da Maconha na Espanha

maio 8, 2012 Posted by Coletivo CannaCerrado

Por Sergio Vidal**

Na última coluna* levantei a ideia de que é preciso construir um Projeto de Regulamentação da Cannabis para o Brasil. Poderíamos nos inspirar nas muitas experiências internacionais existentes e que, para isso, seria bom conhecer bem cada uma delas. A partir de hoje me proponho a falar um pouco sobre a realidade da cannabis em alguns países. Vamos começar pela Espanha, que tem adotado o modelo que considero melhor para o Brasil, os chamados Clubes Sociais Canábicos.

Primeiro, é preciso dizer que não há qualquer lei definindo o que é e como podem funcionar tais clubes. Logo, por Lei, não há regulamentação. Porém, na prática, existem atualmente diversos Clubes, cada um composto por seu grupo de associados. Mesmo sem amparo legal, eles funcionam sob uma tolerância cultural à cannabis que foi construída ao longo de algumas décadas e, principalmente, por decisões judiciais que dão parâmetro para a conduta de policiais, delegados, juízes e promotores. Mas os espanhóis só conseguiram construir esse cenário com a luta árdua de milhares de ativistas. Garantiram o direito de decidir sobre suas próprias vidas e provar que é possível cultivar, distribuir e consumir maconha sem o interesse de lucro em primeiro lugar.

Em 1993 surgiu a primeira associação canábica na Espanha, a ARSEC – Asociación Ramón Santos de Estudios sobre el Cannabis. O objetivo central da Associação era criar mecanismos de proteção e fomento à cultura do cultivo. A forma mais radical de fazer isso só poderia ser acabando com a tese jurídica de que o cultivo é um crime. Mas como fazer isso de forma radical? Como acabar de uma vez com qualquer ambiguidade com relação à Lei e definir que um cultivo que não se destina ao comércio não pode ser considerado crime?

Os associados da ARSEC então decidiram que a melhor forma de fazer isso era realizando um cultivo coletivo com o maior nível de segurança jurídica possível. Enviaram uma carta para o órgão responsável por fiscalização de drogas, perguntando se seria um crime cultivar cannabis para um adulto e mais algumas pessoas, sem interesse comercial. Eles explicavam na carta que, já que o Tratado Internacional diz que nenhum país é obrigado a criminalizar condutas de usuários, e a própria lei espanhola também faz isso, cultivar para uso pessoal não podia ser crime. Também argumentavam que, se o plantio para uso pessoal não era crime, um cultivo coletivo sem interesse de lucro também não.

Felizmente, veio uma resposta dizendo que “dentro destes princípios, não seria um crime”. A ARSEC então iniciou um cultivo coletivo em nome da associação que contava, na época, com cerca de 100 pessoas. Os diretores marcaram uma coletiva de imprensa e avisaram às autoridades sobre a iniciativa da associação. Foram presos, mas liberados logo em seguida e puderam responder em liberdade.

Enquanto o processo seguia o caminho até chegar à Suprema Corte, outras associações seguiram o caminho da ARSEC . A tentativa de condená-los à prisão foi anulada, e no fim foi aplicada apenas uma multa aos diretores. A Suprema Corte decidiu que a iniciativa, mesmo sem fins lucrativos, era algo perigoso e devia ser penalizado.

Depois desse episódio o movimento canábico poderia ter se abalado. Mas a convicção dos ativistas espanhóis foi tão forte que eles seguiram em frente. Em 1999, a Associação Kalamudia realizou mais um cultivo coletivo de conhecimento público. Nenhuma autoridade interferiu na ação e a colheita foi realizada com sucesso. Fizeram mais 2 colheitas sem qualquer interferência das autoridades e a partir daí todas as associações retomaram seus trabalhos com cultivos coletivos.

Em 2001 e 2003 duas sentenças tiraram as associações do limpo jurídico em que se encontravam. A Suprema Corte decidiu que o cultivo, colheita e preparo, mesmo em grande escala, não é crime se não tiver intenção de ser comercializado. Essas decisões ajudaram a encorajar ainda mais as pessoas que usam maconha na Espanha e houve um crescimento enorme no número de associações

Apesar disso, em 2005, Martín Barríuso, atualmente presidente da Federação de Associações Canábicas, criada em 2003, foi preso junto com outros diretores da Associação Pannagh, e os 17kg de flores que eles tinham acabado de colher foram apreendidos. Eles foram soltos logo em seguida, e responderam à acusação em liberdade. O processo foi arquivado por causa de todos os precedentes jurídicos existentes. Surpreendentemente, numa decisão única na história, os 17kg de maconha apreendida foram devolvidos à Associação. Desde então esse modelo cooperativo têm sido cada dia mais aceito pela sociedade e pelo governo na Espanha. A mesma ideia tem sido debatida e defendida em diversos países do mundo.

Martín Barriuso tem visitado outros países para defender o modelo que, apesar de não ser regulamentado dentro da Lei espanhola, foi concebido pela sociedade civil e implantado a duras penas através de batalhas judiciais. Hoje existem cerca de 300 associações em todo o país funcionando como Clubes Sociais Canábicos. Mas, na prática, como funcionam as associações?

Primeiro um grupo de pessoas se registra como uma Associação com finalidades de Estudo, ou Redução de Danos, ou Cultural, relacionada com a cannabis. É preciso fazer um calculo de quanto cada associado consome para se ter ideia do quanto será necessário colher e, com base nisso, saber o tamanho do imóvel ou terreno que será alugado para realizar o cultivo. Todos os associados assinam um termo de comprometimento, confirmando que aquele cultivo é de propriedade de todos os membros da Associação, destinado exclusivamente ao uso dos associados, sem qualquer interesse de lucro. A Associação pode destinar um espaço para uso na própria sede, ou apenas fazer a distribuição. Cada associado pode recolher uma pequena cota, semanal ou mensalmente, o equivalente a cerca de 2 a 3 gramas por dia de consumo.

Esse é um conjunto de parâmetros médios, mas as regras podem mudar de associação para associação. Em geral, todas tentam se manter dentro dos paramêtros de um Clube e não de uma loja, ou Coffe Shop, como na Holanda. Os precedentes jurídicos que foram criados na Espanha permitem um certo tipo de conduta e os espanhóis têm sido muito eficientes em garantir esse direito e cultivá-lo com muito carinho.

Espero ter ajudado a iluminar as ideias a respeito dos famosos Clubes da Maconha na Espanha. Em suma não é nada complicados: são adultos lutando com todas as suas forças para provar que não são criminosos interessados em gerar lucro com a maconha, são pessoas normais, apenas querendo fumar maconha em paz sem contribuir com o mercado ilegal.

Os espanhóis não esperaram a legalização chegar através de parlamentares, ou a regulamentação vir através do executivo. Eles foram lá, se organizaram, fundaram suas associações e conquistaram a legalização através do judiciário, provando definitivamente que qualquer criminalização de pessoas adultas fumando e cultivando uma planta é absurda. Em qualquer país é possível fazer iniciativas semelhantes com as que ocorreram nas Espanha, inclusive no Brasil.

Abraço resinado e até semana que vem!

_____________________

Esse texto pode ser reproduzido, desde que citada a fonte e o link originais.

* Esta coluna é publicada neste espaço semanalmente, todas as segundas-feiras. Excepcionalmente a coluna está sendo divulgada na terça, mas a partir da semana que vem voltamos ao normal.

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Sergio Vidal é antropólogo e autor do livro Cannabis Medicinal – Introdução ao Cultivo Indoor (http://cultivomedicinal.com.br) e de diversos artigos sobre drogas, seus usos e usuários. É conselheiro do Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas – CONAD. Atualmente também é pesquisador do Núcleo de Estudos sobre Substâncias Psicoativas -NEIP (http://neip.info) – sergiociso@gmail.com

Fonte. http://www.cannacerr...nha-na-espanha/

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  • Usuário Growroom

Mt boa essa ideia! Excelente reportagem. :emoticon-0137-clapping:

Podemos seguir esse tipo de exemplo se a lei abrir essa brecha.

Gente pra colocar a cara tem!!! Eu topo, topo sim pq nao!

Alguém da ala jurídica do GR saberia responder se isso seria viável aqui no Brasil?

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  • Usuário Growroom

Mt boa essa ideia! Excelente reportagem. :emoticon-0137-clapping:

Podemos seguir esse tipo de exemplo se a lei abrir essa brecha.

Gente pra colocar a cara tem!!! Eu topo, topo sim pq nao!

Alguém da ala jurídica do GR saberia responder se isso seria viável aqui no Brasil?

Primeiro precisa que o STF julgue inconstitucional o 28 e depois os tapados tem que nao autorizar e regulamentar a venda...

Ai a gente se junta e monta uma cooperativa sem fins lucrativos pra cultivar nossa erva e racha os custos do cultivo...

Tem que ser um passo de cada vez, mais eu acho que esse eh o canal mesmo!!

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  • Consultores Jurídicos GR

Lei de Drogas

Art. 20. Constituem atividades de atenção ao usuário e dependente de drogas e respectivos familiares, para efeito desta Lei, aquelas que visem à melhoria da qualidade de vida e à redução dos riscos e dos danos associados ao uso de drogas.

IMO, a associação teria que batalhar juridicamente em cima desse dispositivo e outros que o reforcem.

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  • Usuário Growroom

Lei de Drogas

Art. 20. Constituem atividades de atenção ao usuário e dependente de drogas e respectivos familiares, para efeito desta Lei, aquelas que visem à melhoria da qualidade de vida e à redução dos riscos e dos danos associados ao uso de drogas.

IMO, a associação teria que batalhar juridicamente em cima desse dispositivo e outros que o reforcem.

Boa!!!

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  • 2 weeks later...
  • Usuário Growroom

Sérgio Vidal sempre com muita ingeligencia no assunto... E o que nosso irmão rickroller falou é perfeito!

Concordo que logo após o julgamento do STF [talvez até antes, pelo menos em termos de organização] deveriamos nos organizar e dar um jeito de levar isso a frente, batendo nessa tecla ai citada, e também visando o nosso beneficio...

Quem sabe fazer um "road map"? A propósito, achei aquela parada do projeto de lei do growroom muito interessante, mas ainda não sanei a minha duvida de como ele seria apresentado [se seria ao congresso, ao stf, plesbicito, etc]...

Meio utópico, mas seria interessante ver o growroom virar uma série de cooperativas no Brasil hehe...

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