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Fomos A Montevidéu Ver Como O Povo Convive Com O Polêmico Desafio


CanhamoMAN

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  • Usuário Growroom

Fomos a Montevidéu ver como o povo convive com o polêmico desafio

O Uruguai é 1º país do mundo a regular o cultivo e a venda da maconha
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População se concentra diante do Congresso, em Montevidéu e simpatizantes defendem a aprovação da lei em dezembro de 2013

Que país é este que ousa enfrentar o narcotráfico? É o que vamos ver. Saímos de Ribeirão Preto de automóvel e andamos muito para chegar até a avenida curta e larga, que sinaliza os limites entre Livramento e Rivera, na fronteira do Brasil com o Uruguai.

Nem um posto de gasolina depois que entramos na imensa planície do pampa. Os moradores, nem sempre visíveis, devem sorver o mate amargo debaixo dos salgueiros chorões. Apenas amontoados de eucaliptos em volta de casinhas baixas e taperas.

Coxilhas formam as ondas que avançam pelo gigantesco tapete musgo. É uma reta só a estrada de concreto, sempre bem sinalizada, que nunca morre na curva, apenas some no horizonte e reaparece na medida em que o acelerador é pressionado. De vez em quando, o vento morno, típico do verão pampeano, dobra a copa das árvores e gira os enormes cata-ventos que o Uruguai construiu para gerar sua energia.

Postos policiais são muitos nos 500 quilômetros até Montevidéu, a capital uruguaia. Mas, ao contrário do Brasil, nem sempre o motorista é parado nas “carreteiras” (rodovias) para uma eventual fiscalização. É comum carros uruguaios circularem com faróis e lanternas queimados e até sem uma das placas.

Carlos Gardel

A menos de 100 quilômetros, está a pequena Taquarembó. Suas ruas semi-ocultas por plátanos, árvores comuns nas cidades argentinas e uruguaias, no outono ganham um amarelado melancólico das folhas ressecadas. É um funeral de galhos e folhas mortas que recria ares românticos. Uma atmosfera bem orginal para a gestação de um corpo vivo e latente: o tango.

Em uma área rural, a 20 quilômetros do centro da cidade, depois de uma ponte esticada por cabos de aço e com o piso revestido por grossas tábuas de madeira, está o singelo museu em homenagem ao “El Morocho del Abasto”. Foi ali, garantem com orgulho os uruguaios, que nasceu em 11 de dezembro de 1887 Charles Romuald Gardés. Na movimentada estação de trem da época, hoje desativada, ressoou pela primeira vez a voz de um baixinho, feio, sem graça, que mais tarde iria levar o mundo ao delírio com os acordes que o tango transportou para os quadris e pés em movimento de cadena, ganchos e oito riscados no chão pelos saltos agulhas das belas morochas.

Não é a Argentina, mas o Uruguai quem tem a certidão de nascimento de Carlos Gardel. E é também o Uruguai, e não a Argentina, dono do certificado de propriedade de um hit do tango – La Comparsita.

Este é o Uruguai, pequeno em terra, grande em história, mas que só agora ganha relevo no globo desbotado que repousa sobre as estantes do mundo. Tudo por causa de um arbusto com folhas de sete pontas e de nome feminino: marijuana.

A semente sobre a regulamentação da maconha quem jogou no meio do debate foi o presidente José “Pepe” Mujica logo após assumir as rédeas do país. O objetivo era enfrentar a violência, quebrando os joelhos do tráfico.

De imediato, a reação popular foi de oposição. Mas o governo não recuou diante da maioria contrária e mandou a proposta para ser votada pelo Congresso, que acabou aprovando a regulamentação.

Junta regulamenta a lei

Quem vai aplicar a nova lei é a Junta Nacional de Drogas. Entre outras coisas, terá que impor as regras: cada usuário poderá cultivar em casa até seis mudas de maconha, ser maior de idade e consumir, no máximo, 40 gramas por mês nas farmácias previamente cadastradas pelo governo.

A regulamentação ainda não começou, mas ninguém é preso por acender um cigarro de maconha. “A gente pode fumar na cara do guarda que ele não faz nada”, diz um jovem de 17 anos que fuma maconha todos os dias.

A equipe do A Cidade foi às ruas centrais de Montevidéu numa noite de sábado. Em uma praça, aparentemente segura, cheia de famílias e crianças, adolescentes preparam a erva e iluminam o interior das mãos com o fogo que acende o “baseado”. Ninguém parece se importar. O cheiro é forte e o “clima de é isso aí, cara” toma conta da praça cheia de luzes coloridas e duendes e anõezinhos sobre os canteiros.

Governo uruguaio quer espatifar a caixa preta das drogas

O principal telejornal do Uruguai abre com uma manchete impactante: “Imágenes de los ladrones em uma panadería”(“Imagens dos ladrões em uma padaria”).

Aos olhos de um brasileiro acostumado com flagrantes de extrema violência, as cenas parecem bizarras para tamanho estardalhaço. Na tela da TV uruguaia, três adolescentes aproveitam a distração do comerciante e, desarmados, entram correndo no estabelecimento, de onde retiram do caixa alguns trocados e fogem.

Depois do Chile, o Uruguai é o país mais tranquilo da América do Sul. Os seus quase 4 milhões de habitantes ainda não experimentam a violência que o morador de Ribeirão Preto sente na pele ou assiste pela TV. Apesar disso, entre janeiro e abril de 2012 comparado com o mesmo período anterior, os homicídios subiram 60% na capital uruguaia, disparando o sinal de alerta.

Ataque ao tráfico

Na pequena Colônia de Sacramento, uma das mais belas cidades históricas do Cone Sul, às margens do Mar Del Plata, repousa uma tranquilidade efêmera. Os moradores já começam a ficar preocupados com a sorrateira invasão do crack, sobretudo, entre os adolescentes.

Foi esse quadro ameaçador, fomentado pelo poder alastrante do tráfico, que disparou o gatilho da política liberalizante do ex-guerrilheiro Tupamaro, José Mujica, sobre a maconha e transformou o Uruguai no primeiro país do a ter na palma da mão todo o processo do mercado das drogas.

Nenhum país espatifou a caixa-preta das drogas em mil pedaços como o fez o vizinho Uruguai.

O Presidente Mujica passou a defender que o poder dos traficantes deveria ser extirpado e que o Estado poderia assumir o controle de tudo - plantio, distribuição, armazenamento, venda e até o preço da maconha.

O governo puxou a calculadora do bolso e descobriu que poderia ficar com os mais de 40 milhões de dólares gerados pelos traficantes anualmente com a venda da “marijuana”.

Carta branca

Em 10 de dezembro do ano passado, o Congresso deu carta branca ao governo para regulamentar a maconha. O IRCCA (Instituto de Registro e Controle de Cannabis) foi criado para conceder as licenças de plantio, multar os que andarem fora da linha e destruir plantações ilegais.

A lei, com prazo de 120 dias para entrar em vigor, deve começar a valer a partir do mês que vem. Ela prevê, em síntese, que maiores de 18 anos possam comprar até 40 gramas de maconha por mês em farmácias previamente autorizadas ao preço médico de 1 dólar o grama. Para isso, os usuários terão que se cadastrar e receberão uma carteirinha.

De outra forma, as pessoas poderão ter em casa até seis mudas de cannabis, ou 480 gramas. Mas não podem vender ou dar a maconha. É só para o consumo próprio. Estrangeiro não poderá comprar maconha, pois existe uma preocupação governamental com o turismo gerado pelas drogas, como ocorreu com a Holanda.

Apesar do processo legal ainda em curso, a Argentina registra uma apreensão crescente de maconha trazida pelos jovens que viajam ao Uruguai. Só em janeiro foram, em média, 4 apreensões de drogas por dia.

Bernardo, 18 anos, conversou com a equipe do A Cidade. Ele disse que usa maconha desde menino e que tem em casa pelo menos 20 mudas. Bernardo não sabe ainda se comprará a maconha oficial. Mas declara que as 20 mudas ajudam no orçamento do mês porque vende a droga para os amigos.

Ele pode ser o viés da balança da política moderna de Mujica, que defende a regulamentação como meio de combate ao tráfico. Se Bernardo e companhia pararem mesmo de traficar, o “experimento” será um sucesso. Caso contrário, um desastre, pois o governo acredita que ao vender a maconha em farmácias evitará que os usuários desçam até as “biqueiras” e acabem conhecendo uma bomba: o crack, a verdadeira semente da violência nas ruas.

USP de Ribeirão pesquisa o ‘canabidiol’

Matéria publicada pelo jornal A Cidade em 2008 e assinada pelo colaborador Rubens Zaidan já mostrava que a USP de Ribeirão Preto estudava, desde 2004, o uso medicinal de substância isolada da maconha.

Era o canabidiol, que demonstrou funcionar eficientemente no controle da ansiedade em geral, tanto em animais como em seres humanos. A informação foi confirmada pelo grupo de pesquisadores da USP de Ribeirão Preto, que liderou mundialmente as investigações com o uso medicinal do canabidiol em transtornos psiquiátricos e distúrbios psicóticos.

O canabidiol, que tem efeito neuroprotetor e antioxidante, parece ter potencial de ajudar no tratamento de doenças degenerativas. Não funciona em pacientes com sintomas do transtorno bipolar, doença antigamente denominada como psicose maníaco-depressiva (PMD). Em animais, demonstrou efeitos antidepressivos e anticonvulsivantes.

Com o uso da ressonância magnética funcional e tomografia por emissão de pósitrom, sofisticadas técnicas de neuroimagem, foi possível saber que o canabidiol age no cérebro nas áreas ligadas ao processamento emocional, fato desconhecido da literatura médica até 2004.

História da ‘maconha boa’ e da ‘maconha má’

O canabidiol foi isolado em 1963, na Universidade de Israel por Raphael Mechoulam, que no ano seguinte descobriu o THC, a substância da maconha que provoca sedação e euforia, com grandes efeitos nocivos.

Depois o canabidiol ficou esquecido por muitos anos. As pesquisas no Brasil começaram há mais de 30 anos nos laboratórios do professor Elisaldo Carlini da Unifesp - Universidade Federal de São Paulo. Os primeiros testes foram em epilepsia.

O pesquisador Antônio Waldo Zuardi realizou as primeiras experiências com o canabidiol entre 1976 e 1980 durante seu doutorado em psicobiologia no laboratório do professor Carlini, sob orientação do professor Isaac Karniol.

Nesse período encontrou as primeiras indicações de efeitos ansiolíticos e antipsicóticos da substância, fato responsável pela sequência de pesquisas nos anos 1980 e 1990.

Com base num estudo do professor Antônio Waldo Zuardi, de 1982, por exemplo, o laboratório inglês GW desenvolveu uma medicação denominada Sativex, um spray que tem a associação equilibrada do THC com canabidiol, já vendido no Canadá para pacientes com esclerose múltipla, neuropatias crônicas e fibromialgia.

O professor de Farmacologia, Francisco Silveira Guimarães, testou o efeito ansiolítico do canabidiol em camundongos e verificou efeito similar ao dos benzodiazepínicos usados contra ansiedade.

Estudos iniciais em pacientes com esquizofrenia em 1995, feitos pelo professor Zuardi, mostraram indícios promissores do canabidiol em controlar os sintomas dessa doença, mas ainda foram incompletos.

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