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Livro Que Conta A História Da Maconha Mostra As Metamorfoses Da Substância


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DENIS RUSSO BURGIERMAN

ESPECIAL PARA A FOLHA

02/04/2015 02h03

De todos os poderes da maconha, um dos menos conhecidos é sua capacidade mais-que-camaleônica de mudar de forma, de aparência e de significado.

É essa a revelação mais impressionante do livro agradável e preciso de Jean Marcel Carvalho França, que resgata cinco séculos sobre a Cannabis sativa.

Leia a entrevista com Jean Marcel Carvalho França.

A mesma maconha que no século 19 nos transformava em assassinos enlouquecidos induzia, cem anos depois, a um pacifismo boçal e perigoso.

Num dia ela era a droga dos pobres, culpada pela degeneração da raça brasileira, no outro de playboys inconsequentes. Vista pela direita, era subversiva, uma estratégia comunista contra a liberdade. Pela esquerda, alienante, inimiga da luta dos trabalhadores.

O livro é fascinante porque mostra como o discurso que justificou a estigmatização da planta foi se metamorfoseando ao sabor do medo do momento.

Apesar de trazer na capa uma folha de Cannabis sativa, a obra é muito mais reveladora sobre outra espécie: o Homo sapiens. Ela revela nossa tendência de comprar qualquer discurso com ares científicos que confirme nossas inseguranças e preconceitos.

Os primeiros registros do uso psicoativo de maconha são em ocorrências policiais. O mais antigo que França encontrou é de 1749: um músico acusado de encher a cabeça de cachaça e pito e depois se deitar com vários rapazes.

"Foi no pecado de sodomia agente e paciente", acusa o documento, registrado pelo Santo Ofício. Relatos assim dão a entender que maconha era usada havia muito tempo nas classes mais baixas, mas que, se não era vista com bons olhos, tampouco gerava maiores preocupações.

A história muda no século 19, quando os ditos especialistas criam um padrão que perdura até hoje: textos de tom científico, alarmistas, enxergando logo adiante um pandemônio. Isso abre caminho para a proibição violenta do século 20.

O padrão só começa a ser quebrado ao fim dos anos 1980, com uma narrativa cada vez mais tolerante. Nas primeiras décadas do século 21, a maconha sofre sua última metamorfose: uma substância com riscos, sim, mas que pode ser inofensiva para alguns usuários e até salvar a vida de outros.

DENIS RUSSO BURGIERMAN é diretor de Redação da revista "Superinteressante". Escreveu "O Fim da Guerra" (Leya), sobre políticas para as drogas

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Fonte: Folha

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