O movimento antiproibicionista toma uma força que pode ser o impulso para que tanto debate seja finalmente colocado em prática. Na sexta-feira passada, foi divulgada uma carta aberta, assinada por oito ex-líderes sul-americanos membros da Comissão Global sobre Políticas de Drogas, incluindo o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, presidente do grupo, sugerindo a legalização das drogas em todo o continente americano. O documento foi entregue pelo secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA) ao presidente colombiano Juan Manoel Santos, anfitrião da Sexta Cúpula das Américas, realizada no ano passado na cidade de Cartagena, na Colômbia. Segundo a carta, a posição do secretário foi uma “voz inesperada acrescentada ao debate”.
Santos foi o idealizador do estudo, encomendado pela OEA visando analisar a guerra às drogas. O resultado indica que “depois de quatro décadas de uma fracassada guerra às drogas, um pedido por uma mudança de estratégia cresce a cada dia”. O relatório ainda estabelece duas recomendações: substituir a criminalização do uso de drogas por uma abordagem competente à saúde pública e a tentativa de modelos de regulamentação legal projetado para minar o poder do crime organizado. “Por meio de uma conversa genuinamente global sobre a reforma da política de drogas, quebramos um tabu secular”, é mencionado na carta.
Quatro possíveis cenários são propostos para o futuro da política de drogas, refletindo um consenso emergente em toda a América Latina. A maioria dos especialistas endossam os três primeiros cenários – a mudança das abordagens repressivas para um sistema em que segurança do cidadão é o objetivo central, a experimentação de diferentes abordagens para a regulação de drogas ilegais, bem como a conscientização e educação sobre elas em toda a sociedade. “Obviamente, todos os líderes sérios concordam que o quarto cenário, a ameaça de criação de narco-estados, deve ser evitado a todo custo”. Este é o primeiro documento lançado por uma organização multilateral que defende significantemente uma reforma na política de drogas, incluindo a regulamentação do mercado e uma reforma na Convenção sobre Drogas da ONU.
No ato da entrega, Insulza descreveu o relatório como o começo de um debate muito esperado, que alerta os EUA e a Europa que a situação irá mudar, com ou sem o apoio deles. Os líderes latino-americanos acreditam que os países norte-americanos e europeus, que consomem boa parte da droga produzida na América do Sul e Central, não percebem o mal que o tráfico causa. A responsabilidade da Europa para remodelar a política de drogas global será enfatizada em três semanas, quando o presidente da Colômbia chega à Grã-Bretanha, uma visita que faz parte de um programa para pressionar por mudanças na política global.
O documento ainda ressalta a necessidade de mudança como medida econômica, destacando as enormes quantias de dinheiro poupados pelos governos caso a guerra às drogas seja reavaliada, além de quebrar o ciclo de violência, corrupção e a superlotação das cadeias. Contudo, apesar de um consenso sobre uma reforma na políticas de drogas, há divergências entre os 35 países que formam a OEA sobre a legalização de substâncias além da maconha, como crack e cocaína.
A carta foi assinada pelo ex-presidente brasileiro e presidente da Comissão Global sobre drogas, Fernando Henrique Cardoso, pelo ex-presidente da Colômbia, César Gaviria, pelo ex-presidente chileno, Ricardo Lagos, por George P. Schultz, ex-secretário de Estado dos EUA e presidente honorário da Comissão, Paul Volcker, ex-presidente da Reserva Federal dos EUA e do Conselho de Recuperação Econômica, Louise Arbour, ex-alta comissária de direitos humanos da ONU e presidente do International Crisis Group e Ernerto Zedillo, ex-presidente do México.