Recentemente, após a publicação de uma reportagem da BBC Brasil, o nome Bamf caiu de vez na boca do povo. Mas o brasileiro Harold Winston, hoje radicado na Califórnia e considerado um dos melhores produtores de haxixe do mundo, é antigo conhecido do Growroom.
Afinal, foi por meio do fórum que ele começou a aprender a cultivar maconha, ainda adolescente, nos anos 2000, em Belo Horizonte, onde morou boa parte de sua vida. “Era quase uma lenda existir um fórum desses naquela época. Ainda mais no Brasil, em português. Era escola que a gente tinha”, diz o produtor, que já ganhou dez copas canábicas – oito com extrações, uma com flor e uma com uma barra de chocolate de CBD.
Desta vez, é o Growroom quem entrevista Bamf para saber mais sobre sua história com a maconha e o haxixe, seus métodos de extração e como ele observa o momento da indústria da maconha nos Estados Unidos e a atual situação política do Brasil.
Growroom entrevista Bamf
Você nasceu no Rio de Janeiro, mas foi para Belo Horizonte bem novo. Como é a sua relação com a capital mineira?
Eu amo BH. Tenho vários amigos com quem mantenho contato, que vêm me visitar aqui. Já com o Rio de Janeiro eu nunca tive uma relação tão grande, porque eu não cheguei nem a morar lá, ia mais passar férias, ver a família.
E como foi seu primeiro contato com a maconha? Conheceu a erva em BH?
Conheci sim. Tinha um amigo meu, o Marquinhos, que fumava todos. É um dos caras mais engraçados e gente boa do mundo. A gente troca ideias até hoje. Na escola, o Marquinhos sempre aparecia na aula alucinado, mas com uma cara muito boa, super divertido. Até que um dia o Marquinhos me aplicou, né. Não teve jeito. A gente tinha uns 15, 16 anos. No dia seguinte, eu já estava apaixonado, fumando todos também.
Daí para o ativismo, como foi o processo? Quando você decidiu aprender a plantar maconha?
Quando eu aprendi que existia a maconha que não era prensada. Como eu era muito novo, não tinha condição de comprar buds, mas também não queria ficar fumando coisa ruim. Aí comecei a encher o saco dos caras mais velhos que eu, que eu sabia que fumavam maconha, perguntando como é que fazia para plantar. Até descobrir o Growroom.
E qual a importância do Growroom na sua formação?
Uma importância enorme, principalmente nesses primeiros anos, em que não existia nada sobre o assunto. Era só o Growroom, cara. Era quase uma lenda existir um fórum desses naquela época. Ainda mais no Brasil, em português. Era escola que a gente tinha. Foi muito importante mesmo, abriu a minha mente para tudo. Se não fosse o Growroom, eu não tinha aprendido a plantar.
Como a descoberta do cultivo afetou sua relação como usuário de maconha?
Eu passei a ter o conhecimento de que ela é uma planta. Porque, até então, eu só pegava um quadrado da mão de um traficante e fumava. Você vê um prensado na televisão e acha que é droga mesmo. Só que não é. E quando você cultiva, entende que é só uma planta. E que é uma planta que ajuda, que faz bem. Quanto mais você aprende, mais vai querendo aprender. O conhecimento que eu adquiri, ainda mais numa época em que ninguém sabia sobre isso, me abriu todas as portas possíveis. Sem contar o fato de você não precisar mais gastar dinheiro para pagar um traficante que te passa um fumo que você nem sabe o que é. Isso não tem preço.
Você chegou a ter 400 plantas no quintal, quando ainda morava em BH. Quando veio a vontade de sair do país, para se dedicar ao mercado legalizado da maconha?
Pois é. Eu plantava no Brasil porque queria aprender. Plantava para mim mesmo. Mas quando minha mãe descobriu, ela ficou com muita raiva de mim. Mas ela era advogada, tinha a cabeça aberta. Sabia o que era maconha, o que era haxixe, que aquilo não era um bicho de sete cabeças. E também sabia que quando eu escolho fazer uma coisa, eu vou até o final. Então, depois de uma semana, ela acabou me oferecendo uma passagem para conhecer Amsterdã, na Holanda. Foi ela quem me deu essa oportunidade. Lá foi onde tudo começou, mas entrar para o mercado legalizado, mesmo, foi só quando eu cheguei na Califórnia e vi que existia essa possibilidade. Porque na Holanda a maconha não é legalizada, ela é tolerada. A lei não diz que pode comprar e vender maconha, ela só toleram. É um meio-termo entre o legal e o ilegal.
Como e porque decidiu ir para a Califórnia?
Quando fui fazendo amizades em Amsterdã, conhecendo as pessoas que conheciam de maconha e haxixe, elas percebiam que a minha paixão era muito grande e sempre me falavam da Califórnia. “É onde está melhor maconha do mundo, o melhor haxixe, os melhores cultivadores”. Eu não tinha nem ideia disso, sabia que o Snooop Dogg tinha um cartão que deixava ele fumar e ainda achava que era boato. Mas comecei a escutar tanto, que fui pesquisar e vi que a Califórnia realmente era a “meca” da maconha, que já estava totalmente legalizada dentro do estado. Então, vim para cá e tive a certeza do que eu queria fazer.
Quando começou a sua história com as extrações?
No primeiro dia que eu vi haxixe na minha vida. Meu primo me deu umas 20 gramas e eu me apaixonei logo ali. Aí ficou aquele negócio, né. Precisava arranjar haxixe bom para fumar, mas conseguir haxixe bom naquela época era uma loucura. Depois de muitos anos,vi que a melhor situação para mim seria fazer o meu próprio haxa ao invés de depender de alguém para conseguir. Em Amsterdã, eu já comecei a fazer uns haxas, mas não foi tão bem sucedido como aqui na Califórnia. Porque aqui você pode plantar sua maconha, tem mais acesso à qualidade, a equipamentos. Então, eu plantava e fazia haxixe, dando certo ou não. Foi um longo processo de tentar até acertar, de conhecer as pessoas certas, que foram me ajudando, me ensinando. Estava ali fazendo haxixe todo dia, querendo evoluir, entendendo que existe toda uma ciência por trás da planta. Que por mais que tenha gente muito experiente no assunto, a gente ainda não sabe de 1% do que essa planta pode fazer pelo mundo. Então, você tem que pensar que existe um potencial de descoberta ali. E, claro, a paixão ajuda muito.
O contato com o produtor californiano Nikka T. (Essential Extracts) também ajudou nesse aprendizado?
Foi bem importante, né. Foi o cara que me ensinou a extrair o haxixe sem solventes. Ele tinha mais experiência e sabedoria sobre o assunto na época, aprendeu com a Mila Jansen o conceito da extração com água e gelo e o aperfeiçoou. Então, me explicou a ciência por trás de todo o processo e eu também fui aperfeiçoando-o.
Atualmente, com quais tipos de extração a Bamf Extractions trabalha?
Hoje em dia, a gente faz todos os tipos de extração, menos com destilados e CO2. Fazemos o ice wax, com gelo e água, o rosin e as extrações com butano, que têm várias consistências diferentes, como budder, shatter, diamond e sugar. São consistências que começamos a fazer para nos adaptarmos ao mercado.
Saber escolher a genéticas também é importante na hora de extrair? Quais suas strains favoritas?
Em termos de extração, cada strain faz muita diferença no resultado final. Não só em termos de qualidade, como de quantidade. Na hora de extrair, você precisa achar uma strain em que as cabeças dos tricomas sejam maiores e contenham mais óleo. Se for uma strain para fumar, eu amo a OG. Mas é bem difícil achar uma OG que extrai bem, sem solvente. Para extrações, têm outras strains melhores, como a Do-Si-Dos e a GMO. A Exotic Genetix também tem muitas variedades boas para extração, como a Cookies and Cream.
Cada grama dos seu extrato concentrado pode custar até US$ 250, o equivalente a cerca de R$ 1 mil. Como vê essa valorização comercial dos extratos de cannabis?
Na realidade, esses extratos têm esse preço porque são muito caros para fazer. Por exemplo, você vai pagar 3 mil dólares em 500 gramas de maconha. Dessas 500 gramas, dependendo da extração, principalmente a orgânica, você não vai conseguir tirar muito, vai perder muito óleo. Mas o que você vai extrair, vai ser o ouro do ouro. Então, se você pegou 500 gramas dessa planta e tirou 20 gramas de haxixe, é só fazer as contas. Só para fazer, já te custa uns 150 dólares cada grama desse haxa. Fora o custo de equipamento, de pessoas trabalhando. É um haxixe artesanal, feito à mão, tem um processo que é mais caro mesmo. Aí no final do dia, você acabou gastando 200 dólares pra fazer aquela grama. Então, você leva 50 dólares. Isso quando a loja não bota um imposto em cima. O preço final pode ser até mais caro que isso.
É um bom momento para explorar os potenciais comerciais da maconha nos Estados Unidos?
É um ótimo momento para quem tem muito dinheiro, porque está rolando um monopólio muito grande. E esse é o meu medo do que também pode acontecer no Brasil. Porque o povo tem que entender o real significado da palavra legalização. Legalização é o direito de todos nós podermos plantar, fumar e vender maconha. Então, quando criam muita burocracia, custos muitos altos, estão permitindo a um só tipo de pessoa da sociedade investir neste negócio. É o que está acontecendo aqui nos Estados Unidos. Se você não tiver muito dinheiro, você não vai conseguir fazer direito. Vai falhar, como vários estão falhando. E eu não estou falando de 3, 4 milhões de dólares. Mas de 20, de 50. É bem complicado. Tem que pensar muito bem antes de entrar neste mercado. Porque acho que, no futuro, ele ainda será dominado por empresas maiores, como a Coca Cola e a Marlboro. São as empresas que vão controlar o negócio da maconha nos Estados Unidos, daqui uns anos. Isso eu garanto. Dou minha cara à tapa se não acontecer.
No Brasil, então, o assunto só anda pra trás. Ainda mais com a proposta perigosa e mal intencionada do ministro Osmar Terra, um conhecido proibicionista e defensor da criminalização da maconha e, até, da internação compulsória. Como você vê o atual momento político do país?
Irmão, o governo do Brasil é uma bosta, esses políticos são um lixo. Mas o povo tem que entender que quem manda não é o governo. Quem tem o poder é o próprio povo. E é disso que eles têm medo. Eu acho que a população brasileira é muito poderosa, mas não sabe disso ainda. Mas é questão de tempo. Claro que esse governo não facilita, mas é uma luta que eles já perderam. Não só os políticos brasileiros, mas de qualquer lugar. Porque os governos passam, mas a maconha não. Ela vai continuar aí. Sem contar que existe uma potência econômica muito grande. Na hora que entenderem isso, eles também vão querer cair em cima.
A maconha vencerá?
Com certeza, principalmente por causa desse lance da potência econômica. O ser humano infelizmente é muito guloso, só quer saber de dinheiro. Então, vai todo mundo entrar no ramo. Eu acredito que em menos de 20 anos a maconha vai estar legalizada no mundo inteiro. O que temos que fazer é persistir, manter a nossa luta, aprender o que foi feito em outros países. O que aconteceu na Califórnia? Simples, todo mundo começou a plantar maconha. A cada dez casas, em pelo menos duas, três, tinha alguém plantando maconha. Chegou uma hora que o governo não conseguiu mais lutar contra, nem tinha dinheiro para isso, porque se for prender todo mundo, haja cadeia. Por isso eu acho que os que estão plantando maconha no Brasil, inclusive os que já foram presas por isso, são os verdadeiros guerreiros. Estes são os grandes heróis brasileiros, que estão lutando por um futuro melhor, que continuaram no país, enfrentando o sistema. Quando todos começarem a plantar, não tem Bolsonaro que segure a gente.