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Showing content with the highest reputation on 04/01/15 in all areas
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Cabelo preso é uma tragédia. O Brasil é uma terra de caipiras, com um povinho pior que os piores rednecks americanos e esperar qualquer tipo de bom senso desta terra é burrice. Tristíssimo mesmo esse tópico, espero que o cabelo saia o mais rápido possível desta. Plantar sua maconha é a coisa mais digna e corajosa que um usuário pode fazer, mas que for embarcar nessa tem que estar ciente do risco que é e tem que se cercar de todos os meios possíveis e imagináveis para evitar que a dignidade e a coragem se voltem contra si. E decidir que o plantio não vale a pena pelo risco também não é vergonha para ninguém. Cada um cada um. Ser um usuário no Brasil é viver no submundo. Muita sorte para o cabelo.2 points
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Salve salve maconheiros e simpatizantes!! Tenho que fazer um texto para a cadeira de Métodos e Técnicas de Pesquisa entre 10 e 15 páginas com tema livre. Queria algo relacionado à maconha pois é um assunto que eu tenho bastante facilidade visto que ja estudei muito sobre ela. Estou pensando em fazer sobre a sua relação com a quimioterapia, pois acredito que é um tema fácil de achar artigos científicos falando sobre. Vocês teriam alguma outra sugestão de assunto do texto que trate da maconha mas de outra área? De preferência algo que tenha já bastante "validação", então procuremos evitar assuntos como a maconha curar cancer que é algo ainda bem polêmico e não totalmente aceito pela ciência atual. Tb gostaria que me recomendassem artigos ou fontes que posso usar como bibliografia pro trabalho... de preferência em português. Valeuuuuuuuu1 point
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1º de Abril Sano, caiu bonito hehehehe1 point
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Andou... nem acredito!!!!!!!!!!! Agora vai!1 point
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É galerinha....eu vou investir nesse Ascent. Definitivamente... Quem tem ele, sabe informar se os "bugs" já foram arrumados? Parece que no lancamento teve bastante problema com defeitos e tal. Muito obrigado pela ajuda!1 point
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em relação a toxidade o LSD é bastante seguro, mas tem a questão psicológica... já o ecstasy eu nem tomaria cara, já tomei algumas vezes e não achei graça não, muito superficial e me deixava vulnerável, efeito rebote na serotonina era algo explícito, da pra listar uma porrada de colateral a curto prazo, isso se for MDMA puro, na maioria das vezes é efedrina, metilona e mais uma caralhada de anfetamina. me arrependo porque quando eu era moleque eu prometi aos meus pais e a mim mesmo que nunca tocaria em outros narcóticos além da ganja, mas a curiosidade e as amizades mudaram o rumo da história, e de resumo não valeu a pena, não gosto de mexer diretamente com neurotransmissores, ainda mais com picos altos igual essas drogas geram, não é algo natural e não faz bem de maneira nenhuma. • como eu sei que tu vai tomar de um jeito ou de outro, procure ter os devidos cuidados cara, garrafinha d'água, pessoa de confiança, sem álcool, alimentos ricos em hidratos de carbono um dia antes e antes de fazer o uso algo mais leve como frutas e verduras com hidratos de IG baixo e bastante fibras. e respondendo a pergunta do outro post: é claro que uma droga leva a outra, se não não estaríamos discutindo sobre LSD, cocaína e ecstasy em um fórum de cannabis. eu sinceramente prefiro ficar no natural; cogus, café e cannabis, conheço a pureza, já to familiarizado com os colaterais e tenho controle sobre os mesmos.1 point
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likezinho por esse ultimo, gostei mais da versão dele que da original. eu entregava minha carteira se eu visse esse cara aqui no sul.1 point
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espere mais quatro dias que o canhamo man ja chega com as novidades.1 point
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já tem VÁRIOS artigos científicos reconhecendo a cannabis como cura pro câncer, eu atualmente estou fazendo esse tratamento, se fosse eu, com certeza escreveria sobre isso, mas por conta da minha vivência no caso, mas eu também faço quimioterapia, e acho que você falar sobre a ganja enquanto um combate aos efeitos colaterais é mais fácil, mais reconhecido, etc. Se precisar de alguma entrevista me ponho a dispor, hahaha afinal, fumar me ajuda DEMAIS nos dias que faço e após as quimios! abraço, boa sorte no trampo!1 point
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Olá para todos! Sou novo no fórum e gostaria de compartilhar uma situação que enfrentei/enfrento para que vocês possam me ajudar. Bom, eu sempre fumei maconha com meus amigos e nunca me aconteceu nenhuma bad. Um dia resolvi experimentar LSD e só tive viagem boa. Tomei mais dois e só tive viagem boa também. Resolvi tomar um quarto em um rolê pra ficar mais sossegado. Tomei, fumei bastante e novamente tive muita viagem boa. Quando a pira passou, fui à casa de um amigo e lá fumamos no bong. Mas uns 10 minutos depois de fumar, a pira voltou muito forte. Comecei a ver coisas e ficar escamado. Comecei a achar que o meu amigo estava me controlando de alguma forma e via as coisas frame por frame. Fiquei com muito medo e fui embora, sozinho. Indo pra casa de bicicleta comecei a achar que alienígenas estavam controlando meu corpo e todas as pessoas do mundo inteiro estavam na terra por causa de mim. Como se eu fosse um experimento ou algo do tipo. Nunca tinha sentido algo parecido. Todo carro que passava, na minha cabeça estava passando só pra me assustar. Com muita dificuldade consegui chegar em casa, ainda louco. Comecei então a pensar que minha família também fazia parte de tudo isso, mas logo o efeito foi diminuindo e eu fiquei de boa. Foi horrível, pior sensação da minha vida. Duas semanas depois tomei metade de mais um doce e senti quase a mesma coisa. A sensação era a mesma, mas era MUITO mais fraca. Não associei à alienígenas mas só às pessoas, novamente achando que estavam tentando me controlar. Eu não consegui prestar atenção em nada que os outros falavam e ficava só pensando nessa viagem. Resolvi nunca mais tomar LSD e continuei a fumar maconha. Mas agora toda vez que fumo, tenho uma pequena BAD. Nada comparado à bad do LSD, mas já me causa um desconforto. Gostaria de saber se vocês já passaram por alguma viagem tão forte quanto essa. Quero saber se é "normal" ou se sou meio louco.1 point
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O ponto não é o que faríamos se o stf deferir, e sim o que faremos para que isso seja deferido!1 point
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Vou morar na garagem e transformar meu quarto num grow nunca antes visto na historia desse pais.1 point
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Trabalho enquanto o patrão ñ tá vendu! ñ preciso pedir barulho,neguim faz pq é real. o jogo é sujo,2* grau pra ser lixeiro. chegô de xinelím,algúns neguín dá nada,produzimo de madrugada. esse filho da puta aí tem 10 pulmão! ñ adiante buscar AR resposta si tu nun tem us purquê!1 point
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NOTÍCIA QUENTE DOS BASTIDORES! Dia 1° de abril o canhamoMAN vai enganar todo mundo novamente!1 point
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Se você fuma maconha é maconheiro. Não quer ser "maconheiro"? Pare de fumar maconha. Além de maconheiro passa a ser mentiroso. Lembro uma experiência que tive a alguns anos. Assumi para o pai da minha namorada que fumava maconha. Ele fez ela largar de mim. Tempos depois ela passou a namorar um amigo meu, também maconheiro. Perguntei a ele se o pai dela tinha pressionado ele. Ele disse que sim, mas havia mentido, "óbvio", disse ele. Resumindo: O pai da moça não gosta de maconheiros que dizem a verdade. Prefere os maconheiros que também mentem. Quem bebe cerveja faz como Um Estilo De Vida Ou É Apenas Como Mais Um Hábito ''Banal''? Quem bebe cerveja fica mentindo por aí que não o faz com medo do julgamento dos outros? Já fui chamado de traficante de drogas pelo meu próprio Pai, mas ele está errado, não eu. Ele deve mudar, não eu. Para de se esconder e passa a lutar contra o estigma, do contrário viverá como um rato. Talvez eu tenha me expressado de maneira um pouco confusa mas espero que entenda. OBS: De outra forma, tu não precisas sair por aí anunciando que tu fuma maconha. Eu não conto para ninguém, mas não escondo de ninguém.1 point
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Como hoje 9/11 é aniversario de Carl Sagan uma das maiores mentes enfumaçadas que ja habitou a terra deixo aqui este ensaio escrito por Mr.X aka Carl Sagan para todos amantes de Cannabis da ciência, foi publicado em Marihuana Reconsidered (1971) Por Dr. Lester Grinspoon... Tudo começou há cerca de dez anos atrás. Eu tinha chegado de um período consideravelmente mais relaxado na minha vida - um momento no qual eu passei a sentir que havia mais a viver do que a ciência, um momento de despertar da minha consciência social e amabilidade, um tempo no qual que eu estive aberto a novas experiências. Eu tinha amizade com um grupo de pessoas que ocasionalmente fumavam cannabis, de forma irregular, mas com evidente prazer. Inicialmente eu não estava disposto a participar, mas a euforia aparente que a cannabis produzia e o fato de que não havia vício fisiológico para a planta, eventualmente, me convenceram a tentar. Minhas experiências iniciais foram totalmente decepcionantes; não houve efeito algum, e eu comecei a cogitar uma variedade de hipóteses sobre a cannabis ser um placebo, que funciona pela expectativa e hiperventilação em vez de química. Após cerca de cinco ou seis tentativas sem sucesso, no entanto, aconteceu. Eu estava deitado de costas na sala de estar de um amigo examinando ociosamente o padrão de sombras no teto expressos por um vaso de plantas (não cannabis!). De repente eu percebi que eu estava examinando uma intricada e detalhada miniatura de um Volkswagen, claramente delineada pelas sombras. Eu era muito cético a esta percepção, e tentei encontrar inconsistências entre Volkswagen e o que eu via no teto. Mas tudo estava lá, até calotas, placa de licença, cromo, e até mesmo a pequena alça utilizada para a abertura do porta-malas. Quando eu fechei os olhos, fiquei chocado ao descobrir que havia um filme passando no interior das minhas pálpebras. Flash... uma simples cena de um campo com uma casa de fazenda vermelha, um céu azul, nuvens brancas, caminho amarelo sinuoso entre colinas verdes ao horizonte... Flash... a mesma cena, casa laranja, céu marrom, nuvens vermelhas, caminho amarelo, campos violetas... Flash... Flash... Flash. Os flashes vieram a cerca de uma vez por cada batimento cardíaco. Cada flash trouxe a mesma cena simples em vista, mas cada vez com um conjunto diferente de cores ... extraordinariamente profundos matizes, e surpreendentemente harmoniosas em sua justaposição. Desde então, tenho fumado ocasionalmente e desfrutado completamente. Ela (cannabis) amplifica sensibilidades tórpidas e produz o que para mim são efeitos ainda mais interessantes, como vou explicar brevemente. Eu posso lembrar-me de outra breve experiência visual com cannabis, na qual eu vi uma chama de vela e descobri no coração da chama, em pé com indiferença magnífica, o chapéu preto do cavalheiro espanhol que aparece no rótulo da garrafa de vinho Sandman. Olhar para o fogo na "onda", a propósito, especialmente através de um daqueles caleidoscópios de prisma cuja imagem de seu entorno, é uma experiência extraordinariamente tocante e bonita. Eu quero explicar que em nenhum momento eu pensei que estas coisas estavam "realmente" lá fora. Eu sabia que não havia Volkswagen no teto e não havia homem salamandra Sandman na chama. Eu não sinto qualquer contradição nestas experiências. Há uma parte de mim fazendo, criando a percepção que na vida cotidiana seria bizarra; há uma outra parte de mim que é uma espécie de observador. Cerca de metade do prazer vem da parte-observador apreciando a obra da parte-criadora. Eu sorrio, ou às vezes até rio em voz alta das imagens no interior de minhas pálpebras. Neste sentido, suponho que a cannabis seja psicotomimética, mas acho que nenhum pânico ou terror que acompanham algumas psicoses. Possivelmente isso é porque eu sei que é minha própria viagem, e que eu posso "descer" rapidamente a qualquer momento que eu quiser. Enquanto minhas percepções iniciais foram todas visuais, e carente de imagens de seres humanos, esses dois itens têm mudado ao longo dos anos seguintes. Acho que hoje só um baseado é o suficiente para me deixar elevado. Eu testo se estou elevado fechando os olhos e olhando para os flashes. Eles vêm muito antes de outras alterações em minhas percepções visuais ou outras percepções. Eu penso que este é um problema de ruído de sinal, o nível de ruído visual é muito baixo com os olhos fechados. Um outro interessante aspecto de informação teórica é a prevalência - pelo menos nas minhas imagens em flash - de desenhos animados: apenas os contornos das figuras, caricaturas, e não fotografias. Eu acho que isso é simplesmente uma questão de compressão de informação, seria impossível compreender o conteúdo total de uma imagem a partir do conteúdo de informação de uma fotografia comum, digamos, 108 bits, na fração de segundo que ocupa um flash. E a experiência do flash é projetada, se é que posso usar essa palavra, para apreciação imediata. O artista e o espectador são um. Isso não quer dizer que as imagens não são maravilhosamente detalhadas e complexas. Eu tive recentemente uma imagem em que duas pessoas estavam conversando, e as palavras que eles estavam dizendo formavam e desapareciam em amarelo acima de suas cabeças, em cerca de uma sentença por batimento cardíaco. Desta forma foi possível acompanhar a conversa. Ao mesmo tempo, uma palavra ocasionalmente aparecia em letras vermelhas, entre os amarelos acima de suas cabeças, perfeitamente no contexto da conversa, mas se um lembrava-se destas palavras vermelhas, eles enunciavam um conjunto completamente diferente de declarações penetrantemente críticas para a conversa. O conjunto inteiro da imagem que eu esbocei aqui, eu diria que pelo menos 100 palavras amarelas e algo como 10 palavras vermelhas, ocorreu em algo menos de um minuto. A experiência com cannabis tem melhorado muito o meu apreço pela arte, um assunto que eu nunca tinha apreciado antes. A compreensão da intenção do artista que eu posso conseguir quando estou elevado algumas vezes continua quando estou "baixo". Esta é uma das muitas fronteiras humanas que a cannabis me ajudou a atravessar. Há também alguns insights relacionados a arte - não sei se são verdadeiros ou falsos, mas eles foram divertidos de formular. Por exemplo, eu ter passado algum tempo elevado a olhar para o trabalho do surrealista belga Yves Tanguey. Alguns anos mais tarde, eu emergi de um longo mergulho no Caribe e descansei exausto em uma praia formada pela erosão nas proximidades de um recife de coral. Examinando ociosamente os fragmentos arqueados de coral de cor pastel que ia até a praia, vi diante de mim uma grande pintura de Tanguey. Talvez Tanguey tenha visitado aquela praia na sua infância. Uma melhoria muito semelhante na minha apreciação pela música ocorreu com a cannabis. Pela primeira vez eu fui capaz de ouvir as partes separadas de uma harmonia de três partes e a riqueza do contraponto. Desde então descobri que os músicos profissionais podem facilmente tocar muitas partes separadas simultaneamente em suas cabeças, mas esta foi a primeira vez para mim. Novamente, a experiência de aprendizagem quando elevado teve pelo menos até certo ponto permanecido quando estou "baixo". O prazer dos alimentos é amplificada; sabores e aromas surgem, por alguma razão nós normalmente parecemos estar muito ocupados para notar. Eu sou capaz de dar a minha atenção para a sensação. Uma batata terá uma textura, um corpo, e sabor como o de outras batatas, mas muito mais. Cannabis também aumenta o prazer do sexo - por um lado dá uma extraordinária sensibilidade, mas também por outro lado adia o orgasmo: em parte por me distrair com a profusão de imagem que passa diante dos meus olhos. A duração do orgasmo parece se alongar muito, mas esta pode ser a experiência usual de expansão do tempo que ocorre ao se fumar cannabis. Eu não me considero uma pessoa religiosa, no sentido usual, mas há um aspecto religioso em algumas experiências. A sensibilidade em todas as áreas me dá um sentimento de comunhão com o meu entorno, tantos animados quanto inanimados. Às vezes, um tipo de percepção existencial do absurdo toma conta de mim e eu vejo com terríveis certezas as hipocrisias e posturas minhas e dos meus semelhantes. E em outras vezes, há um sentido diferente do absurdo, uma lúdica e fantástica consciência. Ambos os sentidos do absurdo podem ser comunicados, e alguns dos picos mais gratificantes que tive foram em compartilhar conversas e percepções e humor. Cannabis nos traz uma consciência de que nós gastamos uma vida inteira sendo treinados para ignorar e esquecer e colocar para fora de nossas mentes. A sensação de que o mundo é realmente como pode ser é enlouquecedora; cannabis me trouxe alguns sentimentos de como é ser louco, e como usamos a palavra "louco" para evitar pensar em coisas que são muito dolorosas para nós. Na União Soviética dissidentes políticos são rotineiramente colocados em manicômios. O mesmo tipo de coisa, um pouco mais sutil, talvez, ocorre aqui: "você ouviu o que Lenny Bruce disse ontem? Ele deve ser louco". Quando na experiência sob cannabis descobri que há alguém dentro daquelas pessoas que chamamos de loucos. Quando estou elevado, posso penetrar no passado, recordar memórias de infância, amigos, parentes, brinquedos, ruas, cheiros, sons e sabores de uma época que já desapareceu. Eu posso reconstruir atuais ocorrências de episódios de infância entendidos apenas pela metade na época. Muitas, mas não todas minhas viagens com cannabis, têm em algum lugar um simbolismo importante para mim que não vou tentar descrever aqui, uma espécie de mandala em alto relevo no alto. Associar-se livremente a esta mandala, tanto visualmente quanto como em palavras, produz um leque muito rico de insights. Existe um mito sobre tais elevações: o usuário tem uma ilusão de grande insight, mas ele não sobrevive ao escrutínio na manhã seguinte. Estou convencido de que isto é um erro, e que os insights devastadores alcançados quando elevados são percepções reais, o problema principal é colocar essas ideias em uma forma aceitável para nós mesmos quando estivermos tão diferentes no dia seguinte. Algum dos mais difíceis trabalhos que já fiz foi colocar tais ideias em fita ou por escrito. O problema é que dez ainda mais interessantes ideias ou imagens se perdem no esforço de uma gravação. É fácil entender porque alguém pode pensar que é um desperdício de esforço ter todo este trabalho para colocar o pensamento para "baixo", uma espécie de intrusão da Ética Protestante. Mas desde que eu vivo quase toda a minha vida "para baixo" que eu faço esse esforço - com sucesso, eu acho. Aliás, acho que ideias razoavelmente boa podem ser lembradas no dia seguinte, mas somente se algum esforço for feito para colocá-las para "baixo" de outra maneira. Se eu escrever o insight para "baixo" ou para dizer a alguém, então eu posso lembrar sem assistência na manhã seguinte, mas se eu apenas digo para mim mesmo que eu tenho que fazer um esforço para lembrar, eu nunca faço. Acho que a maioria dos insights que eu consegui quando estava elevado foram sobre questões sociais, uma área de bolsa de estudos muito diferente daquela pela qual eu sou geralmente conhecido. Lembro-me de uma ocasião, tomando um banho com a minha mulher ao mesmo tempo elevada, em que eu tive uma ideia sobre a origem e invalidez do racismo em termos de curvas de distribuição gaussiana. Foi um ponto óbvio de uma forma, mas raramente falado. Eu desenhei as curvas em sabão na parede do chuveiro, e fui escrever a ideia. Uma ideia levou a outra, e no final de cerca de uma hora de muito trabalho duro, eu descobri que tinha escrito onze ensaios curtos sobre uma ampla gama de social, político, filosófico, biológico e tópicos humano. Devido a problemas de espaço, não posso entrar em detalhes sobre estes ensaios, mas de todos os sinais externos, tais como reações públicas e comentários de especialistas, eles parecem conter insights válidos. Eu os usei em tratados acadêmicos, palestras públicas e em meus livros. Mas deixe-me tentar pelo menos dar o sabor de tal visão e os seus acompanhamentos. Uma noite, elevado de cannabis, eu estava investigando a minha infância, um pouco de autoanálise, e fazendo o que me pareceu ser um progresso muito bom. Eu, então, parei e pensei o quão extraordinário foi Sigmund Freud, que sem ajuda de drogas, tinha sido capaz de alcançar a sua própria notável autoanálise. Mas então me bateu como um trovão que eu este estava errado, que Freud tinha passado a década anterior de sua autoanálise como um experimentador e com um pregador para a cocaína, e pareceu-me muito evidente que os genuínos insights psicológicos que Freud trouxe para o mundo foram pelo menos em parte derivada de sua experiência com drogas. Eu não tenho ideia se isso é de fato verdade, ou se os historiadores de Freud concordariam com esta interpretação, ou mesmo se tal ideia foi publicada no passado, mas é uma hipótese interessante e um que passa em primeiro lugar no escrutínio no mundo dos "baixos". Eu posso lembrar-me da noite na qual de repente eu percebi como era ser louco, ou noites nas quais meus sentimentos e percepções foram de natureza religiosa. Eu tinha uma sensação muito precisa de que estes sentimentos e percepções, escritos casualmente, não resistiriam ao escrutínio crítico habitual que é o meu estoque no negócio como um cientista. Se eu encontro na parte da manhã uma mensagem de mim mesmo da noite anterior, informando-me que há um mundo que nos rodeia que mal percebemos, ou que podemos nos tornar um com o universo, ou mesmo que alguns políticos são homens desesperadamente assustados, eu posso tender para a descrença; mas quando estou elevado que eu sei sobre essa descrença. E então eu tenho uma fita na qual eu me exorto a levar a sério tais comentários. Eu digo "Ouça com atenção, seu filho da puta da manhã! Esta coisa é real!" Tento mostrar que a minha mente está trabalhando com clareza; lembro-me o nome de um conhecido colégio que eu não havia pensado em trinta anos, eu descrevo a cor, tipografia e formato de um livro em outra sala e estas memórias passam para a crítica do escrutínio da manhã. Estou convencido de que há níveis genuínos e válidos da percepção disponíveis com cannabis (e provavelmente com outras drogas), que são, através dos defeitos da nossa sociedade e nosso sistema educacional, indisponíveis para nós sem essas drogas. Tal observação se aplica não apenas à autoconsciência e de atividades intelectuais, mas também para as percepções de pessoas reais, uma sensibilidade muito maior para a expressão facial, entonação, e escolha de palavras que às vezes produzem um relacionamento tão próximo, é como se duas pessoas estivessem lendo cada uma a mente da outra. Há um aspecto muito bom em relação à cannabis. Cada sopro é uma dose muito pequena, o intervalo de tempo entre a inalação de um sopro e a sensação do seu efeito é pequeno, e não há desejo de mais após a elevação chegar. Eu acho que a relação R, do tempo de sentir a dose tomada ao tempo necessário para tomar uma dose excessiva é uma quantidade importante. R é muito grande para o LSD (que eu nunca tinha tomado) e razoavelmente curto para cannabis. Pequenos valores de R deve ser uma medida de segurança de drogas psicodélicas. Quando a cannabis for legalizada, espero ver esta relação como um dos parâmetros impresso na embalagem. Espero que o tempo não seja muito distante, a ilegalidade da cannabis é ultrajante, um impedimento à plena utilização de uma droga que ajuda a produzir a serenidade e discernimento, sensibilidade e companheirismo tão desesperadamente necessários neste mundo cada vez mais louco e perigoso. Tradução retirada da comunidade Filosofia&Ciências do Orkut. o original se encontra: http://hermiene.net/...trans/mr_x.html caso já tenha no forum desculpe mas como sempre nao consegui achar na busca rsrs abrakos and keep growing always1 point
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Go STF se movimente e represente... Legaliza pra gente...1 point
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Não é sobre cannabis.... eu sei que Fernando pessoa é fudidamente irônico e fodástico e nunca sabemos se ele tá avacalhando com todo mundo... mas fico pensando... se esse banqueiro não é mesmo melhor que muito ativista de discurso ... que fala pra carai... mas não faz PO!%$@ nenhuma.... Cuida da tua vida e se olha no espelho antes de abrir a boca e falar mal. Façam mais e falem menos ! O B A N Q U E I R O A N A R Q U I S T A (Texto Completo) - Fernando Pessoa Tínhamos acabado de jantar. Defronte de mim o meu amigo, o banqueiro, grande comerciante e açambarcador notável, fumava como quem não pensa. A conversa, que fora amortecendo, jazia morta entra nós. Procurei reanimá-la, ao acaso, servindo-me de uma idéia que me passou pela meditação. Voltei-me para ele, sorrindo. - É verdade: disseram-me há dias que V. em tempos foi anarquista... - Fui, não: fui e sou. Não mudei a esse respeito. Sou anarquista. - Essa é boa! V. anarquista! Em que é que V. é anarquista?... Só se V. dá à palavra qualquer sentido diferente... - Do vulgar? Não; não dou. Emprego a palavra no sentido vulgar. - Quer V. dizer, então, que é anarquista exatamente no mesmo sentido em que são anarquistas esses tipos das organizações operárias? Então entre V. e esses tipos da bomba e dos sindicatos não há diferença nenhuma? - Diferença, diferença, há... Evidentemente que há diferença. Mas não é a que V. julga. V. duvida talvez que as minhas teorias sociais sejam iguais às deles?... - Ah, já percebo! V., quanto às teorias, é anarquista; quanto à prática... - Quanto à prática sou tão anarquista como quanto às teorias. E quanto à prática sou mais, sou muito mais, anarquista que esses tipos que V. citou. Toda a minha vida o mostra. - Hein?! - Toda a minha vida o mostra, filho. V. é que nunca deu a esta cousas uma atenção lúcida. Por isso lhe parece que estou dizendo uma asneira, ou então estou brincando consigo. - Ó homem, eu não percebo nada!... A não ser..., a não ser que V. julgue a sua vida dissolvente e anti-social e dê esse sentido ao anarquismo... - Já lhe disse que não - isto é, já lhe disse que não dou à palavra anarquismo um sentido diferente do vulgar. - Está bem... Continuo sem perceber... Ó homem, V. quer-me dizer que não há diferença entre as suas teorias verdadeiramente anarquistas e a prática da sua vida - a prática da sua vida como ela é agora? V. quer que eu acredite que V. tem uma vida exatamente igual à dos tipos que vulgarmente são anarquistas? - Não; não é isso. O que eu quero dizer é que entre as minhas teorias e a prática da minha vida não há divergência nenhuma, mas uma conformidade absoluta. Lá que não tenho uma vida como a dos tipo dos sindicatos e das bombas - isso é verdade. Mas é a vida deles que está fora do anarquismo, fora dos ideais deles. A minha não. Em mim - sim, em mim, banqueiro, grande comerciante, açambarcador se V. quiser -, em mim a teoria e a prática do anarquismo estão conjuntas e ambas certas. V. comparou-me a esses parvos dos sindicatos e das bombas para indicar que sou diferente deles. Sou, mas a diferença é esta: eles (sim, eles e não eu) são anarquistas só na teoria; eu sou-o na teoria e na prática. Eles são anarquistas e estúpidos, eu anarquista e inteligente. Isto é, meu velho, eu é que sou o verdadeiro anarquista. Eles - os dos sindicatos e das bombas (eu também lá estive e saí de lá exatamente pelo meu verdadeiro anarquismo) - eles são o lixo do anarquismo, os fêmeas da grande doutrina libertária. - Essa nem ao diabo a ouviram! Isso é espantoso! Mas como concilia V. a sua vida - quero dizer a sua vida bancária e comercial - coma as teorias anarquistas? Como o concilia V., se diz que por teoria anarquista entende exatamente o que os anarquistas vulgares entendem? E V., ainda por cima, me diz que é diferente deles por ser mais anarquista do que eles - não é verdade? - Exatamente. - Não percebo nada. - Mas V. tem empenho em perceber? - Todo o empenho. Ele tirou da boca o charuto, que se apagara; reacendeu-o lentamente; tirou o fósforo que se extinguia; depô-lo ao de leve no cinzeiro; depois, erguendo a cabeça, um momento abaixada, disse: - Oiça. Eu nasci do povo e na classe operária da cidade. De bom não herdei, como pode imaginar, nem a condição, nem as circunstâncias. Apenas me aconteceu ter uma inteligência naturalmente lúcida e uma vontade um tanto ou quanto forte. Mas esses eram doms naturais, que o meu baixo nascimento me não podia tirar. ``Fui operário, trabalhei, vivi uma vida apertada; fui, em resumo, o que a maioria da gente é naquele meio. Não digo que absolutamente passasse fome, mas andei lá perto. De resto, podia tê-la passado, que isso não alterava nada do que se seguiu, ou do que lhe vou expor, nem do que foi a minha vida, nem do que ela é agora.'' ``Fui um operário vulgar, em suma; como todos, trabalhava porque tinha que trabalhar, e trabalhava o menos possível. O que eu era, era inteligente. Sempre que podia, lia coisas, discutia coisas, e, como não era tolo, nasceu-me uma grande insatisfação e uma grande revolta contra o meu destino e contra as condições sociais que o faziam assim. Já lhe disse que, em boa verdade, o meu destino podia ter sido pior do que era; mas naquela altura parecia-me a mim que eu era um entre a quem a Sorte tinha feito todas as injustiças juntas, e que se tinha servido das convenções sociais para mas fazer. Isto era aí pelos meus vinte anos - vinte e um o máximo - que foi quando me tornei anarquista.'' Parou um momento. Voltou-se um pouco mais para mim. Continuou, inclinando-se mais um pouco. - Fui sempre mais ou menos lúcido. Senti-me revoltado. Quis perceber a minha revolta. Tornei-me anarquista consciente e convicto - o anarquista consciente e convicto que hoje sou. - E a teoria, que V. tem hoje, é a mesma que tinha nessa altura? - A mesma. A teoria anarquista, a verdadeira teoria, é só uma. Tenho a que sempre tive, desde que me tornei anarquista. V. já vai ver... Ia eu dizendo que, como era lúcido por natureza, me tornei anarquista consciente. Ora o que é um anarquista? É um revoltado contra a injustiça de nascermos desiguais socialmente - no fundo é só isto. E de aí resulta, como é de ver, a revolta contra as convenções sociais que tornam essa desigualdade possível. O que lhe estou indicando agora é o caminho psicológico, isto é, como é que a gente se torna anarquista; já vamos à parte teórica do assunto. Por agora, compreenda V. bem qual seria a revolta de um tipo inteligente nas minhas circunstâncias. O que é que ele vê pelo mundo? Um nasce filho de um milionário, protegido desde o berço contra aqueles infortúnios - e não são poucos - que o dinheiro pode evitar ou atenuar; outro nasce miserável, a ser, quando criança, uma boca a mais numa família onde as bocas são de sobra para o comer que pode haver. Um nasce conde ou marquês, e tem por isso a consideração de toda a gente, faça ele o que fizer; outro nasce assim como eu, e tem que andar direitinho como um prumo para ser ao menos tratado como gente. Uns nascem em tais condições que podem estudar, viajar, instruir-se - tornar -se (pode-se dizer) mais inteligentes que outros que naturalmente o são mais. E assim por aí adiante, e em tudo... ``As injustiças da Natureza, vá: não as podemos evitar. Agora as da sociedade e das suas convenções - essas, por que não evitá-las? Aceito - não tenho mesmo outro remédio - que um homem seja superior a mim por o que a Natureza lhe deu - o talento, a força, a energia; não aceito que ele seja meu superior por qualidades postiças, com que não saiu do ventre da mãe, mas que lhe aconteceram por bambúrrio logo que ele apareceu cá fora - a riqueza, a posição social, a vida facilitada, etc. Foi da revolta que lhe estou figurando por estas considerações que nasceu o meu anarquismo de então - o anarquismo que, já lhe disse, mantenho hoje sem alteração nenhuma.'' Parou outra vez um momento, como a pensar como prosseguiria. Fumou e soprou o fumo lentamente, para o lado oposto ao meu. Voltou-se, e ia a prosseguir. Eu, porém, interrompi-o. - Uma pergunta, por curiosidade... Por que é que V. se tornou propriamente anarquista? V. podia ter-se tornado socialista, ou qualquer outra cousa avançada que não fosse tão longe. Tudo isso estava dentro da sua revolta... Deduzo do que V. disse que por anarquismo V. entende (e acho que está bem como definição do anarquismo) a revolta contra todas as convenções e fórmulas sociais e o desejo e esforço para a abolição de todas... - Isso mesmo. - Por que escolheu V. essa fórmula extrema e não se decidiu por qualquer das outras... das intermédias?... - Eu lhe digo. Eu meditei tudo isso. É claro que nos folhetos que eu lia via todas essas teorias. Escolhi a teoria anarquista - a teoria extrema, como V. muito bem diz - pelas razões que vou dizer em duas palavras. Fitou um momento cousa nenhuma. Depois voltou-se para mim. - O mal verdadeiro, o único mal, são as convenções e as ficções sociais, que se sobrepõem às realidades naturais - tudo, desce a família ao dinheiro, desde a religião ao Estado. A gente nasce homem ou mulher - quero dizer, nasce para ser, em adulto, homem ou mulher; não nasce, em boa justiça natural, nem para ser marido, nem para ser rico ou pobre, como também não nasce para ser católico ou protestante, ou português ou inglês. É todas estas coisas em virtude das ficções sociais. Ora essas ficções sociais são más por quê? Porque são ficções, porque não são naturais. Tão mau é o dinheiro como o Estado, a constituição de família como as religiões. Se houvesse outras, que não fossem estas, seriam igualmente más, porque também seriam ficções, porque também se sobreporiam e estorvariam as realidades naturais. Ora qualquer sistema que não seja o puro sistema anarquista, completamente, é uma ficção também. Empregar todo o nosso desejo, todo o nosso esforço, toda a nossa inteligência para implantar, ou contribuir para implantar, uma ficção social em vez de outra, é um absurdo, quando não seja mesmo um crime, porque é fazer uma perturbação social com o fim expresso de deixar tudo na mesma. Se achamos injustas as ficções sociais, porque esmagam e oprimem o que é natural no homem, para que empregar o nosso esforço em substituir-lhes outras ficções, se o podemos empregar para as destruir todas? ``Isto parece-me que é concludente. Mas suponhamos que o não é; suponhamos que nos objetam que isto tudo estará muito certo, mas que o sistema anarquista não é realizável na prática. Vamos lá a examinar essa parte do problema.'' ``Por que é que o sistema anarquista não seria realizável? Nós partimos, todos os avançados, do princípio, não só de que o atual sistema é injusto, mas de que há vantagem, porque há injustiça, em substituí-lo por outro mais justo. Se não pensamos assim, não somos avançados, mas burgueses. Ora de onde vem este critério de justiça? Do que é natural e verdadeiro, em oposição às ficções sociais e às mentiras da convenção. Ora o que é natural é o que é inteiramente natural, não é metade, ou um quarto, ou um oitavo de natural. Muito bem. Ora, de duas coisas, uma: ou o natural é realizável socialmente ou não é; em outras palavras, ou a sociedade pode ser natural, ou a sociedade é essencialmente ficção e não pode ser natural de maneira nenhuma. Se a sociedade pode ser natural, então pode haver a sociedade anarquista, ou livre, e deve haver, porque é ela a sociedade inteiramente natural. Se a sociedade não pode ser natural, se (por qualquer razão que não importa) tem por força que ser ficção, então do mal o menos; façamo-la, dentro desse ficção inevitável, o mais natural possível. Qual é a ficção mais natural? Nenhuma é natural em si, porque é ficção; a mais natural, neste nosso caso, será aquela que pareça mais natural, que se sinta como mais natural? É aquela que estamos habituados. (V. compreende: o que é natural é o que é do instinto; e o que não sendo instinto, se parece em tudo com o instinto é o hábito. Fumar não é natural, não é uma necessidade do instinto). Ora qual é a ficção social que constitui um hábito nosso? É o atual sistema, o sistema burguês. Temos pois, em boa lógica, que ou achamos a sociedade natural, e seremos defensores do anarquismo; ou não a julgamos possível, e seremos defensores do regime burguês. Não há hipótese intermédia. Percebeu?...'' - Sim, senhor; isso é concludente. - Ainda não é bem concludente... Ainda há uma outra objeção, do meu gênero, a liquidar... Pode concordar-se que o sistema anarquista é realizável, mas pode duvidar-se que ele seja realizável de chofre - isto é, que se possa passar da sociedade burguesa para a sociedade livre sem haver um ou mais estados ou regimes intermédios. Quem fizer essa objeção aceita como boa, e como realizável, a sociedade anarquista; mas palpita-lhe que tem que haver um estado qualquer de transição entre a sociedade burguesa e ela. ``Ora muito bem. Suponhamos que assim é. O que é esse estado intermédio? O nosso fim é a sociedade anarquista, ou livre; esse intermédio só pode ser, portanto, um estado de preparação da humanidade para a sociedade livre. Essa preparação ou é material, ou é simplesmente mental; isto é, ou é uma série de realizações materiais ou sociais que vão adaptando a humanidade à sociedade livre, ou é uma simples propaganda gradualmente crescente e influente, que vai preparando mentalmente a desejá-la ou aceitá-la.'' ``Vamos ao primeiro caso, a adaptação gradual e material da humanidade à sociedade livre. É impossível; é mais que impossível: é absurdo. Não há adaptação material senão uma cousa que já há. Nenhum de nós se pode adaptar materialmente ao meio social do século XXIII, mesmo que saiba o que ele será; e não se pode adaptar materialmente porque o século XXIII e o seu meio social não existem materialmente ainda. Assim, chegamos à conclusão que, na passagem da sociedade burguesa para a sociedade livre, a única parte que pode haver de adaptação, de evolução ou de transição é mental, é a gradual adaptação dos espíritos à idéia da sociedade livre... Em todo o caso, no campo da adaptação material, ainda há uma hipótese...''' - Irra com tanta hipótese!... - Ó filho, o homem lúcido tem que examinar todas as objeções possíveis e de as refutar, antes de se poder dizer seguro da sua doutrina. E, de mais a mais, isto tudo é em resposta a uma pergunta que V. me fez... - Está bem. - No campo da adaptação material, dizia eu, há em todo o caso um outra hipótese. É a da ditadura revolucionária. - Da ditadura revolucionária como? - Como eu lhe expliquei, não pode haver adaptação material a uma coisa que não existe, materialmente, ainda. Mas se, por um movimento brusco, se fizer a revolução social, fica implantada já, não a sociedade livre (porque para essa não pode a humanidade ter ainda preparação), mas uma ditadura daqueles que querem implantar a sociedade livre. Mas existe já , ainda que em esboço ou em começo, existe já materialmente qualquer coisa da sociedade livre. Há já portanto uma coisa material, a que a humanidade se adapte. É este o argumento com que as bestas que defendem a ``ditadura do proletariado'' a defenderiam se fossem capazes de argumentar ou de pensar. O argumento, é claro, não é deles: é meu. Ponho-o, como objeção, a mim mesmo. E, como lhe vou mostrar..., é falso. ``Um regime revolucionário, enquanto existe, e seja qual for o fim a que visa ou a idéia que o conduz, é materialmente só uma coisa - um regime revolucionário. Ora um regime revolucionário quer dizer uma ditadura de guerra, ou, nas verdadeira palavras, um regime militar despótico, porque o estado de guerra é imposta à sociedade por uma parte dela - aquela parte que assumiu revolucionariamente o poder. O que é que resulta? Resulta que quem se adaptar a esse regime, como a única coisa que ele é materialmente, imediatamente, é um regime militar despótico, adapta-se a um regime militar despótico. A idéia, que conduziu os revolucionários, o fim, a que visaram, desapareceu por completo da realidade social, que é ocupada exclusivamente pelo fenômeno guerreiro. De modo que o que sai de uma ditadura revolucionária - e tanto mais completamente sairá, quanto mais tempo essa ditadura durar - é uma sociedade guerreira do tipo ditatorial, isto é, um despotismo militar. Nem mesmo podia ser outra coisa. E foi sempre assim. Eu não sei muita história, mas o que sei acerta com isto; nem podia deixar de acertar. O que saiu das agitações políticas de Roma? O Império Romano e seu despotismo militar. O que saiu da Revolução Francesa? Napoleão e seu despotismo militar. E V. verá o que sai da Revolução Russa... Qualquer coisa que vai atrasar dezenas de anos a realização da sociedade livre... Também o que era de se esperar de um povo de analfabetos e de místicos?...'' ``Enfim, isto já está fora de conversa... V. percebeu o meu argumento?'' - Percebi perfeitamente. - V. compreende portanto que eu cheguei a esta conclusão: Fim: a sociedade anarquista, a sociedade livre; meio: a passagem, sem transição, da sociedade burguesa para a sociedade livre. Esta passagem seria preparada e tornada possível por uma propaganda intensa, completa, absorvente, de modo a predispor todos os espíritos e enfraquecer todas as resistências. É claro que por ``propaganda'' não entendo só a pela palavra escrita e falada: entendo tudo, ação indireta ou direta, quanto pode predispor para a sociedade livre e enfraquecer a resistência à sua vinda. Assim, não tendo quase resistência nenhuma que vencer, a revolução social, quando viesse, seria rápida, fácil, e não teria que estabelecer nenhuma ditadura revolucionária, por não ter contra quem aplica-la. Se isto não pode ser assim, é que o anarquismo é irrealizável; e, se o anarquismo é irrealizável, só é defensável e justa, como já lhe provei, a sociedade burguesa.'' ``Ora aí tem V. por que e como eu me tornei anarquista, e por que e como rejeitei, como falsas e anti-naturais, as outras doutrinas sociais de menor ousadia.'' ``E pronto... Vamos lá continuar a minha história.'' Fez explodir um fósforo, e acendeu lentamente o charuto. Concentrou-se, e de aí a pouco prosseguiu. Havia vários outros rapazes com as mesmas opiniões que eu. A maioria era de operários, mas havia um ou outro que o não era; o que todos éramos era pobres, e, que me lembre, não éramos muito estúpidos. A gente tinha uma certa vontade de propaganda, de espalhar as nossas idéias. Queríamos para nós e para os outros - para a humanidade inteira - uma sociedade nova, livre destes preconceitos todos, que fazem os homens desiguais artificialmente e lhes impõem inferioridades, sofrimentos, estreitezas, que a Natureza lhes não tinha imposto. Por mim, o que eu lia confirmava-me nestas opiniões. Em livros libertários baratos - os que havia ao tempo, e eram já bastantes - li quase tudo. Fui a conferências e comícios dos propagandistas do tempo. Cada livro e cada discurso me convencia mais da certeza e da justiça das minhas idéias. O que eu pensava então - repito-lhe, meu amigo - é o que penso hoje, a única diferença é que então pensava-o só, hoje penso-o e pratico-o. - Pois sim; isso, até onde vai, está muito bem. Está muito certo que V. se tornasse anarquista assim, e vejo perfeitamente que V. era anarquista. Não preciso mais provas disso..., como é que saiu de aí sem contradição... Isto é, mais ou menos já calculo... - Não, não calcula nada... Eu sei o que V. quer dizer... V. baseia-se nos argumentos que acaba de ouvir, e julga que eu achei o anarquismo irrealizável e por isso, como lhe disse, só defensável e justa a sociedade burguesa - não é?... - Sim, calculei que fosse mais ou menos isso... - Mas como o podia ser, se desde o princípio da conversa lhe tenho dito e repetido que sou anarquista, que não só o fui mas o continuo sendo? Se eu me tivesse tornado banqueiro e comerciante pela razão que V. julga, eu não era anarquista, era burguês. - Sim, V. tem razão... Mas então como diabo...? Vá lá, vá dizendo... - Como lhe disse, eu era (fui sempre) mais ou menos lúcido, e também um homem de ação. Essas são qualidades naturais; não mas puseram no berço (se é que tive berço), eu é que as levei para lá. Pois bem. Sendo anarquista, eu achava insuportável ser anarquista passivamente, só para ir ouvir discursos e falar nisso com os amigos. Não: era preciso fazer qualquer coisa! Era preciso trabalhar e lutar pela causa dos oprimidos e das vítimas das convenções sociais! Decidi meter ombros a isso, conforme pudesse. Pus-me a pensar como é que eu poderia ser útil à causa libertária. Pus-me a traçar o meu plano de ação. ``O que quer o anarquista? Liberdade - a liberdade para si e para os outros, para a humanidade inteira. Quer estar livre da influência ou da pressão das ficções sociais; quer ser livre tal qual nasceu e pareceu no mundo, que é como em justiça deve ser; e quer essa liberdade para si e para todos os mais. Nem todos podem ser iguais perante a Natureza: uns nascem altos, outros baixos; uns fortes, outros fracos; uns mais inteligentes, outros menos... Mas todos podem ser iguais de aí em diante; só as ficções sociais o evitam. Essas ficções sociais é que era preciso destruir.'' ``Era preciso destruí-las... Mas não me escapou uma coisa: era preciso destruí-las... mas em proveito da liberdade, e tendo sempre em vista a criação da sociedade livre. Porque isso de destruir as ficções sociais tanto pode ser para criar liberdade, ou preparar o caminho da liberdade, como para estabelecer outras ficções sociais diferentes, igualmente más porque igualmente ficções. Aqui é que era preciso cuidado. Era preciso acertar com um processo de ação, qualquer que fosse a sua violência ou a sua não-violência (porque contra as injustiças sociais tudo era legítimo), pelo qual se contribuisse para destruir as ficções sociais sem, ao mesmo tempo, estorvar a criação da liberdade futura; criando já mesmo, caso fosse possível, alguma coisa da liberdade futura. ``É claro que esta liberdade, que deve haver cuidado em não estorvar, é a liberdade futura e, no presente, a liberdade dos oprimidos pelas ficções sociais. Claro está que não temos que olhar a não estorvar a ``liberdade'' dos poderosos, dos bem situados, de todos que representam as ficções sociais e têm vantagens delas. Essa não é liberdade; é a liberdade de tiranizar, que é o contrário da liberdade. Essa pelo contrário, é o que mais devíamos pensar em estorvar e em combater. Parece-me que isto está claro...'' - Está claríssimo. Continue... - Para quem quer o anarquismo a liberdade? Para a humanidade inteira. Qual é a maneira de se conseguir a liberdade para a humanidade inteira? Destruir por completo todas as ficções sociais? Já lhe antecipei a explicação, quando, por causa da sua pergunta, discuti os outros sistemas avançados e lhe expliquei como e por que era anarquista... V. lembra-se da minha conclusão?... - Lembro... - ... Uma revolução social súbita, brusca, esmagadora, fazendo a sociedade passar, de um salto, do regime burguês para a sociedade livre. Esta revolução social preparada por um trabalho intenso e contínuo, de ação direta e indireta, tendente a dispor todos os espíritos para a vinda da sociedade livre, e a enfraquecer até ao estado comatoso todas as resistências da burguesia. Escuso de lhe repetir as razões que levam inevitavelmente a esta conclusão, a dentro do anarquismo; já lhe expus e V. já a percebeu. - Sim. - Essa revolução seria preferivelmente mundial, simultânea em todos os pontos, ou os pontos importantes, do mundo; ou não sendo assim, partindo rapidamente de uns para outros, mas em todo o caso, em cada ponto, isto é, em cada nação, fulminante e completa. ``Muito bem. O que poderia eu fazer para esse fim? Só por mim, não a poderia fazer a ela, à revolução mundial, nem mesmo poderia fazer a revolução completa na parte referente ao país onde estava. O que podia era trabalhar, na inteira medida do meu esforço, para fazer a preparação para essa revolução. Já lhe expliquei como: combatendo, por rodos os meios acessíveis, as ficções sociais; não estorvando nunca ao fazer esse combate ou a propaganda da sociedade livre, nem a liberdade futura, nem a liberdade presente dos oprimidos; criando já, sendo possível, qualquer coisa da futura liberdade.''' Puxou fumo; fez uma leve pausa; recomeçou. - Ora aqui, meu amigo, pus eu a minha lucidez em ação. Trabalhar para o futuro, está bem, pensei eu; trabalhar para os outros terem liberdade, está certo. Mas então eu? Eu não sou ninguém? Se eu fosse cristão, trabalhava alegre mente pelo futuro dos outros, porque lá tinha a minha recompensa no céu; mas também, se eu fosse cristão, não era anarquista, porque então as tais desigualdades sociais não tinham importância na nossa curta vida: eram só condições da nossa provação, e lá seriam compensadas na vida eterna. Mas eu não era cristão, como não sou, e perguntava-me: mas por quem é que eu vou me sacrificar nisto tudo? Mais ainda: por que é que eu me vou sacrificar? ``Vieram-me momentos de descrença; e V. compreende que era justificada... Sou materialista, pensava eu; não tenho mais vida que esta; para que hei de ralar-me com propagandas e desigualdades sociais, e outras histórias, quando posso gozar e entreter-me muito mais se não me preocupar com isso? Quem tem só esta vida, quem não crê na vida eterna, quem não admite lei senão a Natureza, quem se opõe ao Estado porque ele não é natural, ao casamento porque ele não é natural, ao dinheiro porque ele não é natural, porque cargas-d'água é que defende o altruísmo e o sacrifício pelos outros, ou pela humanidade, se o altruísmo e o sacrifício também não são naturais? Sim, a mesma lógica que me mostra que um homem não nasce para ser casado, ou para ser português, ou para ser rico ou pobre, mostra-me também que ele não nasce para ser solidário, que ele não nasce senão para ser ele-próprio, e portanto o contrário de altruísta e solidário, e portanto exclusivamente egoísta.'' ``Eu discuti a questão comigo mesmo. Repara tu, dizia eu para mim, que nascemos pertencentes à espécie humana, e que temos o dever de ser solidários com todos os homens. Mas a idéia de `dever' era natural? De onde é que vinha esta idéia de `dever'? Se esta idéia de dever me obrigava a sacrificar o meu bem-estar, a minha comodidade, o meu instinto de conservação e outros meus instintos naturais, em que divergia a ação dessa idéia da ação de qualquer ficção social, que produz em nós exatamente o mesmo efeito?'' ``Esta idéia de dever, isto de solidariedade humana; só podia considerar-se natural se trouxesse consigo uma compensação egoísta, porque então, embora em princípio contrariasse o egoísmo natural, se dava a esse egoísmo uma compensação, sempre, no fim de contas, o não contrariava. Sacrificar um prazer, simplesmente sacrificá-lo, não é natural; sacrificar um prazer a outro, é que já está dentro da Natureza: é, entre duas cousas naturais que se não podem ter ambas, escolher uma, o que está bem. Ora que compensação egoísta, ou natural, podia dar-me a dedicação à causa da sociedade livre e da futura felicidade humana? Só a consciência de dever cumprido, do esforço para um fim bom; e nenhuma destas coisas é uma compensação egoísta, nenhuma destas coisas é um prazer em si, mas um prazer, se o é, nascido de uma ficção social, como pode ser o prazer de ser imensamente rico, ou o prazer de ter nascido em um boa posição social.'' ``Confesso-lhe, meu velho, que me vieram momentos de descrença... Senti-me desleal à minha própria doutrina, traidor a ela... Mas em breve passei sobre tudo isto. A idéia de justiça cá estava, dentro de mim, pensei eu. Eu sentia-a natural. Eu sentia que havia um dever superior à preocupação só cá do meu destino. E fui para diante na minha intenção.'' - Não me parece que essa decisão revelasse uma grande lucidez da sua parte... V. não resolveu a dificuldade... V. foi para diante por um impulso absolutamente sentimental... - Sem dúvida. Mas o que lhe estou contando agora é a história de como me tornei anarquista, e de como o continuei sendo, e continuo. Vou-lhe expondo lealmente as hesitações e as dificuldades que tive, e como as venci. Concordo que, naquele momento, venci a dificuldade lógica com o sentimento, e não com o raciocínio. Mas V. há de ver que, mais tarde, quando cheguei à plena compreensão da doutrina anarquista, esta dificuldade, até então logicamente sem resposta, teve a sua solução completa e absoluta. - É curioso... - É... Agora deixe-me continuar na minha história. Tive esta dificuldade, e resolvi-a se bem que mal, como lhe disse. Logo a seguir, e na linha dos meus pensamentos, surgiu-me outra dificuldade que também me atrapalhou bastante. ``Estava bem - vamos lá - que estivesse disposto a sacrificar-me, sem recompensa nenhuma propriamente pessoal, isto é, sem recompensa nenhuma verdadeiramente natural. Mas suponhamos que a sociedade futura não dava em nada do que eu esperava, que nunca havia a sociedade livre, e que diabo é que eu, nesse case, me estava sacrificando? Sacrificar-me a uma idéia sem recompensa pessoal, sem eu ganhar nada com o meu esforço por essa idéia, vá; mas sacrificar-me sem ao menos ter a certeza de que aquilo para que eu trabalhava, existiria um dia, sem que a própria idéia ganhasse com o meu esforço - isso era um pouco mais forte... Desde já lhe digo que resolvi a dificuldade pelo mesmo processo sentimental por que resolvi a outra; mas advirto-o também que, do mesmo modo que a outra, resolvi esta pela lógica, automaticamente, quando cheguei ao estado plenamente consciente do meu anarquismo... V. depois verá... Na altura do que lhe estou contando, saí-me do apuro com uma ou duas frases ocas. `Eu fazia o meu dever para com o futuro; o futuro que fizesse o seu para comigo'... Isto, ou cousa que o valha...'' ``Expus esta conclusão, ou, antes estas conclusões, aos meus camaradas, e eles concordaram todos comigo concordaram todos que era preciso ir para a frente e fazer tudo pela sociedade livre. É a verdade que um ou outro, dos mais inteligentes, ficaram um pouco abalados com a exposição, não porque não concordassem, mas porque nunca tinham visto as coisas assim claras, nem os bicos que estas coisas têm... Mas enfim, concordaram todos... Iríamos todos trabalhar pela grande revolução social, pela sociedade livre, quer o futuro nos justificasse, quer não! Formamos um grupo, entre gente certa, e começamos uma grande propaganda - grande, é claro, dentro dos limites doo que podíamos fazer. Durante bastante tempo, no meio de dificuldades, embrulhadas, e por vezes perseguições, lá fomos trabalhando pelo ideal anarquista.'' O banqueiro, chegado aqui, fez uma pausa um pouco mais longa. Não acendeu o charuto, que estava outra vez apagado. De repente teve um leve sorriso, e, com o ar de quem chega ao ponto importante, fitou-me com mais insistência e prosseguiu, clarificando mais a voz e acentuando mais as palavras. - Nesta altura, disse ele, apareceu uma coisa nova. ``Nesta altura'' é modo de dizer. Quero dizer que, depois de alguns meses desta propaganda, comecei a reparar numa nova complicação, e esta é que era a mais séria de todas, esta é que era séria a valer... ``V. recorda-se, não é verdade? Daquilo em que eu, por um raciocínio rigoroso, assentei que devia ser o processo de ação dos anarquistas... Um processo, ou processos, quaisquer pelo qual se contribuisse para destruir as ficções sociais sem, ao mesmo tempo, estorvar a criação da liberdade futura, sem, portanto, estorvar em coisa nenhuma a pouca liberdade dos atuais oprimidos pelas ficções sociais; um processo que, sendo possível, criasse já alguma coisa da liberdade futura...'' ``Pois bem: uma vez assente este critério, nunca mais deixei de o ter presente... Ora, na altura da nossa propaganda em que estou falando, descobri uma coisa. No grupo de propaganda - não éramos muitos; éramos quarenta, salvo erro - dava-se este caso: criava-se tirana.'' - Criava-se tirania?... Criava-se tirania como? - Da seguinte maneira... Uns mandavam em outros e levavam-nos para onde queriam; uns impunham-se a outros e obrigavam-nos a ser o que eles queriam; uns arrastavam outros por manhas e por artes para onde eles queriam. Não digo que fizessem isto em coisas graves; mesmo, não havia coisas graves ali em que o fizessem. Mas o fato é que isto acontecia sempre e todos os dias, e dava-se não só em assuntos relacionados com a propaganda, como fora deles, em assuntos vulgares da vida. Uns iam insensivelmente para chefes, outros insensivelmente para subordinados. Uns eram chefes por imposição; outros eram chefes por manha. No fato mais simples isto se via. Por exemplo: dois dos rapazes iam juntos por uma rua fora; chegavam ao fim da rua, e um tinha que ir para a direita e outro para a esquerda; cada um tinha conveniência em ir para o seu lado. Mas o que ia para a esquerda dizia para o outro, ``venha V. comigo por aqui''; o outro respondia, e era verdade, ``Homem, não posso; tenho que ir por ali'' por esta ou aquela razão... Mas afinal, contra sua vontade e sua conveniência, lá ia com o outro para a esquerda... Isto era uma vez por persuasão, outra vez por simples insistência, uma terceira vez por um outro motivo qualquer... Isto é, nunca era por uma razão lógica; havia sempre nesta imposição e nesta subordinação qualquer coisa de espontâneo, de como que instintivo... E como neste caso simples, em todos os outros casos; desde os menos até aos mais importantes... V. vê bem o caso? - Vejo. Mas que diabos há de estranho nisso? Isso é tudo quanto há de mais natural... - Será. Já vamos a isso. O que lhe peço que note é que é exatamente o contrário da doutrina anarquista. Repare bem que isto se passava num grupo pequeno, num grupo sem influência nem importância, num grupo a quem não estava confiada a solução de nenhuma questão grave ou decisão sobre qualquer assunto de vulto. E repare que se passava num grupo de gente que se unira especialmente para fazer o que pudesse para o fim anarquista - isto é, para combate, tanto quando possível, as ficções sociais, e criar, tanto quando possível, a liberdade futura. V. reparou bem nestes dois pontos? - Reparei. - Veja agora bem o que isto representa... Um grupo pequeno, de gente sincera (garanto-lhe que era sincera!), estabelecido e unido expressamente para trabalhar pela causa da liberdade, tinha, no fim de uns meses, conseguido só uma coisa de positivo e concreto - a criação entre si de tirania. E repare que tirania... Não era uma tirania derivada da ação das ficções sociais, que, embora lamentável, seria desculpável, até certo ponto, ainda que menos em nós, que combatíamos essas ficções, que em outras pessoas; mas enfim, vivíamos em meio de uma sociedade baseada nessas ficções e não era inteiramente culpa nossa se não pudéssemos de todo fugir à sua ação. Mas não era isso. Os que mandavam nos outros, ou os levavam para onde queriam, não faziam isso pela força do dinheiro, ou da posição social, ou de qualquer autoridade de natureza fictícia, que se arrogassem; faziam-no por uma ação de qualquer espécie fora das ficções sociais, uma tirania nova. E era uma tirania exercida sobre gente essencialmente oprimida já pelas ficções sociais. Era, ainda por cima, tirania exercida entre si por gente cujo intuido sincero não era senão destruir tirania e criar liberdade. ``Agora ponha o caso num grupo muito maior, muito mais influente, tratando já de questões importantes e de decisões de caráter fundamental. Ponha esse grupo a encaminha os seus esforços, como o nosso, para a formação de um sociedade livre. E agora diga-me se através desse carregamento de tiranias entrecruzadas V. entrevê qualquer sociedade futura que se pareça com uma sociedade livre ou com um humanidade digna de si própria...''' - Sim: isso é muito curioso... - É curioso, não é?...E olhe que há pontos secundários também muito curiosos... Por exemplo: a tirania do auxílio... - A quê? - A tirania do auxílio. Havia entre nós quem, em vez de mandar nos outros, em vez de se impor aos outros, pelo contrário os auxiliava em tudo quanto podia. Parece o contrário, não é verdade? Pois olhe que é o mesmo. É a mesma tirania nova. É do mesmo modo ir contra os princípios anarquistas. - Essa é boa? Em quê? - Auxiliar alguém, meu amigo, é tomar alguém por incapaz; se esse alguém não é incapaz, é ou fazê-lo tal, ou supô-lo tal, e isto é, no primeiro caso uma tirania, e no segundo um desprezo. Num caso cerceia-se a liberdade de outrem; no outro caso parte-se, pelo menos inconscientemente, do princípio de que outrem é desprezível e indigno ou incapaz de liberdade. ``Voltemos ao nosso caso... V. vê bem que este ponto era gravíssimo. Vá que trabalhássemos pela sociedade futura sem esperarmos que ela nos agradecesse, ou arriscando-nos, mesmo, a que ela nunca viesse. Tudo isso, vá. Mas o que era demais era estarmos trabalhando para um futuro de liberdade e não fazermos, de positivo, mais que criar tirania, e não só tirania, mas tirania nova, e tirania exercida por nós, os oprimidos, uns sobre os outros. Ora isto é que não pode ser...'' ``Pus-me a pensar. Aqui havia um erro, um desvio qualquer. Os nossos intuitos eram bons; as nossas doutrinas pareciam certas; seriam errados os nossos processos? Com certeza que deveriam ser. Mas onde diabo estava o erro? Pus-me a pensar nisso e ia dando em doido. Um dia, de repente, como acontece sempre nestas coisas, dei com a solução. Foi o grande dia das minhas teorias anarquistas; o dia em que descobri, por assim dizer, a técnica do anarquismo.'' Olhou-me um momento sem me olhar. Depois continuou, no mesmo tom. - Pensei assim... Temos aqui uma tirania nova, uma tirania que não é derivada das ficções sociais. Então de onde é que ela derivada? Será derivada das qualidades naturais? Se é, adeus sociedade livre! Se uma sociedade onde estão em operação apenas as qualidades naturais dos homens - aquelas qualidades com que eles nascem, que devem só à Natureza, e sobre as quais não temos poder nenhum -, se uma sociedade onde estão em operação apenas essas qualidades é um amontoado de tiranias, quem é que vai mexer o dedo mínimo para contribuir para a vinda dessa sociedade? Tirania por tirania, fique a que está, que ao menos é aquela a que estamos habituados, e que por isso fatalmente sentimos menos que estaríamos uma tirania nova, e com o caráter terrível de todas as coisas tirânicas que são diretamente da Natureza - o não haver revolta possível contra ela, como não há revolução contra ter que morrer, ou contra nascer baixo quando se preferia ter nascido alto. Mesmo, eu já lhe provei que, se por qualquer razão não é realizável a sociedade anarquista, então deve existir, por ser mais natural que qualquer outra salvo aquela, a sociedade burguesa. ``Mas seria esta tirania, que nascia assim entre nós, realmente derivada das qualidades naturais? Ora o que são as qualidades naturais? São o grau de inteligência, de imaginação, de vontade, etc., com que cada um nasce - isto no campo mental, é claro, porque as qualidades naturais físicas não vêm para o caso. Ora um tipo que, sem ser por uma razão derivada das ficções sociais, manda noutro, por força que o faz por lhe ser superior em uma ou outra das qualidades naturais. Domina-o pelo emprego das suas qualidades naturais. Mas há uma coisa a ver: esse emprego das qualidades naturais será legítimos, isto é, será natural?'' ``Ora qual é o emprego natural das nossas qualidades naturais? O servir os fins naturais da nossa personalidade. Ora dominar alguém será um fim natural da nossa personalidade? Pode sê-lo; há um caso em que pode sê-lo: é quando esse alguém está para nós num lugar de inimigo. Para o anarquista, é claro, quem está num lugar de inimigo, é qualquer representante das ficções sociais e da sua tirania; mais ninguém, porque todos os outros homens são homens como ele e camaradas naturais. Ora, V. bem vê, o caso da tirania, que tínhamos estado criando, era exercida sobre homens como nós, camaradas naturais, e, mais ainda, sobre homens duas vezes nossos camaradas, porque o eram também pela comunhão do mesmo ideal. Conclusão: esta nossa tirania, se não era derivada das ficções sociais, também não era derivada das qualidades naturais; era derivada duma aplicação errada, duma perversão, das qualidades naturais. E essa perversão, de onde é que provinha?'' ``Tinha que provir de uma de duas cousas: ou de o homem ser naturalmente mau, e portanto todas as qualidades naturais serem naturalmente pervertidas; ou de uma perversão resultante da longa permanência da humanidade numa atmosfera de ficções sociais, todas elas criadoras de tirania, e tendente, portanto, a tornar já instintivamente tirânico o uso mais natural das qualidades mais naturais. Ora, destas duas hipóteses, qual é que seria a verdadeira? De um modo satisfatório - isto é, rigorosamente lógico ou científico - era impossível determinar. O raciocínio não pode entrar com o problema, porque ele é de ordem histórica, ou científica, e depende do conhecimento de fatos. Por seu lado, a ciência também nos não ajuda, porque, por mais longe que recuemos na história, encontramos sempre o homem vivendo sob um ou outro sistema de tirania social, e portanto sempre num estado que nos não permite averiguar como é o homem quando vive em circunstâncias pura e inteiramente naturais. Não havendo maneira de determinar ao certo, temos que pender para o lado da maior probabilidade; e a maior probabilidade está na segunda hipótese. É mais natural supor que a longuíssima permanência da humanidade em ficções sociais criadoras de tirania faça cada homem nascer já com as suas qualidade naturais pervertidas no sentido de tiranizar, do que supor que qualidades naturais podem ser naturalmente pervertidas, o que, de certo modo, representa una contradição. Por isso o pensador decide-se, como eu me decidi, com uma quase absoluta segurança, pela segunda hipótese.'' ``Temos, pois, que uma coisa é evidente... No estado social presente não é possível um grupo de homens, por bem intencionados que estejam todos, por preocupados que estejam todos só em combater as ficções sociais e em trabalhar pela liberdade, trabalharem juntos sem que espontaneamente criem entre si tirania, sem criar entre si uma tirania nova, suplementar à das ficções sociais, sem destruir na prática tudo quanto querem na teoria, sem involutariamente estorvar o mais possível o próprio intuito que querem promover. O que há a fazer? É muito simples... É trabalharmos todos para o mesmo fim, mas separados.'' - Separados? - Sim. V. não seguiu o meu argumento? - Segui. - E não acha lógica, não acha fatal esta conclusão? - Acho, sim, claro... Disse eu: trabalharmos todos para o mesmo fim, mas separados. Trabalharmos todos para o mesmo fim anarquista, cada um contribui com o seu esforço para a destruição das ficções sociais, que é para onde o dirige, e para a criação da sociedade livre do futuro; e trabalhando separados não podemos, de modo nenhum, criar tirania nova, porque nenhum tem ação sobre o outro, e não pode portanto, nem, dominando-o, diminuir-lhe a liberdade, nem, auxiliando-o, apagar-lha. ``Trabalhando assim separados e para o mesmo fim anarquista, temos as duas vontades - a do esforço, e a da não criação de tirania nova. Continuamos unidos, porque o estamos moralmente e trabalhamos do mesmo modo para o mesmo fim; continuamos anarquistas, porque cada um trabalha para a sociedade livre; mas deixamos de ser traidores, voluntários ou involuntários, à nossa cousa, deixamos mesmo de poder sê-lo, porque nos colocamos, pelo trabalho anarquista isolado, fora da influência deletéria das ficções sociais, no seu reflexo hereditário sobre as qualidades que a Natureza deu.'' ``É claro que toda esta tática se aplica ao que eu chamei de período de preparação para a revolução social. Arruinadas as defesas burguesas, e reduzida a sociedade inteira ao estado de aceitação das doutrinas anarquistas, faltando só fazer a revolução social, então, para o golpe final, é que não pode continuar a ação separada. Mas nessa altura, já a sociedade livre estará virtualmente chagada; já as coisas serão de outra maneira. A tática a que me refiro só diz respeito à ação anarquista em meio da sociedade burguesa, como agora, como no grupo a que eu pertencia.'' ``Era esse - até que enfim! - o verdadeiro processo anarquista. Juntos, nada valíamos, que importasse, e, ainda por cima, nos tiranizávamos, e nos estorvávamos uns aos outros e às nossas teorias. Separados, pouco também conseguiríamos, mas ao menos não estorvávamos a liberdade, não criávamos tirania nova; o que conseguíamos, pouco que fosse, era realmente conseguido, sem desvantagem nem perda. E, de mais a mais, trabalhávamos assim separados, aprendíamos a confiar mais em nós mesmos, a não nos encostarmos uns aos outros, a tornarmo-nos mais livres já, a prepararmo-nos, tanto pessoalmente, como aos outros pelo nosso exemplo, para o futuro.'' ``Fiquei radiante com essa descoberta. Fui logo expô-la aos meus camaradas... Foi uma das poucas vezes em que fui estúpido na minha vida. Imagine V. que eu estava tão cheio da minha descoberta que esperava que eles concordassem...'' - Não concordaram, é claro... - Repontaram, meu amigo, repontaram todos! Uns mais, outros menos, tudo protestou!... Não era isso!... Isso não podia ser!... Mas ninguém dizia o que era ou o que é que havia de ser. Argumentei e argumentei, e, em resposta aos meus argumentos, não obtive senão frases, lixo coisas como essas que os ministros respondem nas câmaras quando não têm resposta nenhuma... Então é que eu vi com que bestas e com que covardões estava metido! Desmascararam-se. Aquela corja tinha nascido para escravos. Queriam ser anarquistas à custa alheia. Queriam a liberdade, logo que fossem os outros que lha arranjassem, logo que lhe fosse dada como um rei dá um título! Quase todos eles são assim, os grandes lacaios! - E V., escamou-se? - Se me escamei! Enfureci-me! Pus-me aos coices. Dei por paus e por pedras. Quase que me peguei com dois ou três deles. E acabei por me vir embora. Isolei-me. Veio-me um nojo àquela carneirada toda, que V. não imagina! Quase que descri no anarquismo. Quase que decidi não me importar mais com tudo aquilo. Mas, passados uns dias, voltei a mim. Pensei que o ideal anarquista estava acima destas quizílas. Eles não queriam só brincar aos libertários? Não estava eu para brincar num caso desses. Eles não tinham força para combater senão encostados uns aos outros, e criando, entre si, um simulacro novo da tirania que diziam querer combater? Pois que o fizessem, os parvos, se não serviam para mais. Eu é que não ia ser burguês por tão pouco. ``Estava estabelecido que, no verdadeiro anarquismo, cada um tem que, por sua própria forças, criar liberdade e combater as ficções sociais. Pois por minha própria forças eu ia criar liberdade e combater as ficções sociais. Ninguém queria seguir-me no verdadeiro caminho anarquista? Seguiria eu por ele. Iria eu só, com os meus recursos, com a minha fé, desacompanhado até do apoio mental dos que tinham sido meus camaradas, contra as ficções sociais inteiras. Não digo que fosse um belo gesto, nem um gesto heróico. Foi simplesmente um gesto natural. Se o caminho tinha que ser seguido por cada um separadamente, eu não precisava de mais ninguém para o seguir. Bastava o meu ideal. Foi baseado nestes princípios e nestas circunstâncias que decidi, por mim só, combater as ficções sociais.'' Suspendeu um pouco o discurso, que se lhe tornara quente e fluido. Retomou-o de ali a pouco, com a voz já mais sossegada. - É um estado de guerra, pensei eu, entre mim e as ficções sociais. Muito bem. O que posso eu fazer contra as ficções sociais? Trabalho sozinho, para não poder, de modo nenhum, criar qualquer tirania. Como posso eu colaborar sozinho na preparação da revolução social, na preparação da humanidade para a sociedade livre? Tenho que escolher um de dois processos, dos dois processos que há; caso, é claro, não possa servir-me de ambos. Os dois processos, são a ação indireta, isto é, a propaganda, e a ação direta, de qualquer espécie. ``Pensei primeiro na ação indireta, isto é, na propaganda. Que propaganda poderia eu fazer só por mim? À parte esta propaganda que sempre se vai fazendo em conversa, com este ou aquele, ao acaso e servindo-nos de todas as oportunidades, o que eu queria saber era se a ação indireta era um caminho por onde eu pudesse encaminhar a minha atividade de anarquista energicamente, isto é, de modo a produzir resultados sensíveis. Vi logo que não podia ser. Não sou orador e não sou escritor. Quero dizer, sou capaz de falar em público, se for preciso, e sou capaz de escrever um artigo de jornal; mas o que eu queria averiguar era se o meu feitio natural indicava que, especializando-me na ação indireta, de qualquer das duas espécies ou em ambas, eu poderia obter resultados mais positivos para a idéia anarquista que especializando os meus esforços em qualquer outro sentido. Ora a ação é sempre mais proveitosa que a propaganda, exceto para os indivíduos cujo feitio os indica essencialmente como propagandistas - os grandes oradores, capazes de eletrizar multidões e arrastá-las atrás de si, ou os grandes escritores, capazes de fascinar e convencer com os seus livros. Não me parece que eu seja muito vaidoso, mas, se o sou, não me dá, pelo menos, para me envaidecer daquelas qualidades que não tenho. E, como lhe disse, nunca me deu para me julgar orador ou escritor. Por isso abandonei a idéia da ação indireta como caminho a dar à minha atividade anarquista. Por exclusão de partes, era forçado a escolher a ação direta, isto é, o esforço aplicado à prática da vida, à vida real. Não era a inteligência, mas a ação. Muito bem. Assim seria.'' ``Tinha eu pois que aplicar à vida prática o processo fundamental de ação anarquista que eu já tinha esclarecido - combater as ficções sociais sem criar tirania nova, criando já, caso fosse possível, qualquer coisa da liberdade futura. Ora como diabo se faz isso na prática?'' ``Ora o que é combater na prática? Combater na prática é a guerra, é uma guerra, pelo menos. Como é que se faz guerra às ficções sociais? Antes de mais nada, como é que se faz guerra? Como é que se vence o inimigo em qualquer guerra? De uma de duas maneiras: ou matando-o isto é, destruindo-o; ou aprisionando-o, isto é, subjugando-o, reduzindo-o à inatividade. Destruir as ficções sociais não podia eu fazer; destruir as ficções sociais só o podia fazer a revolução social. Até ali, as ficções sociais podiam estar abaladas, cambaleando, por um fio; mas destruídas, só o estariam com a vinda da sociedade livre e a queda positiva da sociedade burguesa. O mais que eu poderia fazer nesse sentido era destruir - destruir no sentido físico de matar - um ou outro membro da classes representativas da sociedade burguesa. Estudei o caso, e vi que era asneira. Suponha V. que eu matava um ou dois, ou uma dúzia de representante da tirania das ficções sociais... O resultado? As ficções sociais ficariam abaladas? Não ficariam. As ficções sociais não são como um situação política que pode depender de um pequeno número de homens, de um só homem por vezes. O que há de mau nas ficções sociais são elas, no seu conjunto, e não os indivíduos que as representam senão por serem representantes delas. Depois, um atentado de ordem social produz sempre uma reação; não só tudo fica na mesma, mas, as mais das vezes, piora. E, ainda por cima, suponha, como é natural, que, depois de um atentado, eu era caçado; era caçado e liquidado, de uma maneira ou outra. E suponha que eu tinha dado cabo de uma dúzia de capitalistas. Em que vinha isso tudo dar, e resumo? Com a minha liquidação, ainda que não por morte, mas por simples prisão ou degredo, a causa anarquista pedia um elemento de combate; e os doze capitalistas, que eu teria estendido, não eram doze elementos que a sociedade burguesa tinha perdido, porque os elementos componentes da sociedade burguesa não são elementos de combate, mas elementos puramente passivos, pois o `combate' está, não nos membros da sociedade burguesa, mas no conjunto de ficções sociais, em que essa sociedade assenta. Ora as ficções sociais não são gente, em quem se possa dar tiros... V. compreende bem? Não era como o soldado de um exercito que mata doze soldados de um exército contrário; era como um soldado que mata doze civis da nação do outro exército. É matar estupidamente, porque não se elimina combatente nenhum... Eu não podia portanto pensar em destruir, nem no todo nem em nenhuma parte, ficções sociais. Tinha então que subjugá-las, que vencê-las subjugando-as, reduzindo-as à inatividade.'' Apontou para mim o indicador direito súbito. - Foi o que eu fiz! Retirou logo o gesto, e continuou. - Procurei ver qual era a primeira, a mais importante, das ficções sociais. Seria a essa que me cumpria, mais que a nenhuma outra, tentar subjugar, tentar reduzir à inatividade. A mais importante, da nossa época pelo menos, é o dinheiro. Como subjugar o dinheiro, ou, em palavras mais precisas, a força, ou a tirania do dinheiro? Tornando-me livre da sua influência, da sua força, superior portanto à influência, reduzindo-o à inatividade pelo que me dizia respeito a mim. Pelo que me dizia respeito a mim, compreende V.?, porque eu é que o combatia; se fosse reduzi-lo à inatividade pelo que respeita a toda a gente, isso não seria já subjugá-lo, mas destruí-lo, porque seria acabar de todo com a ficção do dinheiro. Ora eu já lhe provei que qualquer ficção social só pode ser ``destruída'' pela revolução social, arrastada com as outras na queda da sociedade burguesa. ``Como podia eu tornar-me superior à força do dinheiro? O processo mais simples era afastar-me da esfera da sua influência, isto é, da civilização; ir para um campo comer raízes e beber água das nascentes; andar nu e viver como animal. Mas isto, mesmo que não houvesse dificuldade em fazê-lo, não era combater uma ficção social; não era mesmo combater: era fugir. Realmente, quem se esquiva a travar um combate não é derrotado nele. Mas moralmente é derrotado, porque não se bateu. O processo tinha que ser outro - um processo de combate e não de fuga. Como subjugar o dinheiro, combatendo-o? Como furtar-me à sua influência e tirania, não evitando o seu encontro? O processo era só um - adquiri-lo, adquiri-lo em quantidades bastante para lhe não sentir a influência; e em quanto mais quantidade o adquirisse, tanto mais livre eu estaria dessa influência. Foi quando vi isto claramente, com toda a força da minha convicção de anarquista, e toda a minha lógica de homem lúcido, que entrei na fase atual - a comercial e bancária, meu amigo - do meu anarquismo.'' Descansou um momento da violência, novamente crescente, do seu entusiasmo pela sua exposição. Depois continuou, ainda com um certo calor, a sua narrativa. - Ora V. lembrasse daquelas duas dificuldades lógicas que eu lhe disse que me haviam surgido na princípio da minha carreira de anarquista consciente?... E V. lembra-se de eu lhe dizer que naquela altura as resolvi artificialmente pelo sentimento e não pela lógica? Isto é, V. mesmo notou e muito bem, que eu não as tinha resolvido pela lógica... - Lembro-me, sim... - E V. lembra-se de eu lhe dizer que mais tarde, quando acertei por fim com o verdadeiro processo anarquista, as resolvi então de vez, isto é, pela lógica? - Sim. - Ora veja como ficaram resolvidas... As dificuldades eram estas: não é natural trabalhar por qualquer coisa, seja o que for, sem uma compensação natural, isto é, egoísta; e não é natural dar o nosso esforço a qualquer fim sem ter a compensação de saber que esse fim se atinge. As duas dificuldades eram estas; ora repare como ficam resolvidas pelo processo de trabalho anarquista que o meu raciocínio me levou a descobrir como sendo o único verdadeiro... O processo dá em resultado eu enriquecer; portanto, compensação egoísta. O processo visa ao conseguimento da liberdade; ora eu, tornando-me superior à força do dinheiro, isto é, libertando-me dela, consigo liberdade. Consigo liberdade só para mim, é certo; mas é que como já lhe provei, a liberdade para todos só pode vir com a destruição das ficções sociais, pela revolução social. O ponto concreto é este: viso liberdade, consigo liberdade: consigo a liberdade que posso... E veja V.: à parte o raciocínio que determina este processo anarquista como o único verdadeiro, o fato que ele resolve automaticamente as dificuldades lógicas, que se podem opor a qualquer processo anarquista, mais prova que ele é o verdadeiro. ``Pois foi este o processo que eu segui. Meti ombros à empresa de subjugar a ficção dinheiro, enriquecendo. Consegui. Levou um certo tempo, porque a luta foi grande, mas consegui. Escuso de lhe contar o que foi e o que tem sido a minha vida comercial e bancária. Podia ser interessante, em certos pontos sobretudo, mas já não pertence ao assunto. Trabalhei, lutei, ganhei dinheiro; trabalhei mais, lutei mais, ganhei mais dinheiro; ganhei muito dinheiro por fim. Não olhei o processo - confesso-lhe, meu amigo, que não olhei o processo; empreguei tudo quanto há - o açambarcamento, o sofisma financeiro, a própria concorrência desleal. O quê?! Eu combatia as ficções sociais, imorais e antinaturais por excelência, e havia de olhar a processos?! Eu trabalhava pela liberdade, e havia de olhar as armas com que combatia a tirania?! O anarquista estúpido, que atira bombas e dá tiros, bem sabe que mata, e bem sabe que as suas doutrinas não incluem a pena de morte. Ataca uma imoralidade com um crime, porque acha que essa imoralidade pede um crime para se destruir. Ele é estúpido quanto ao processo, porque, como já lhe mostrei, esse processo é errado e contraproducente como processo anarquista; agora quanto à moral do processo ele é inteligente. Ora o meu processo estava certo, e eu servia-me legitimamente, como anarquista, de todos os meios para enriquecer. Hoje realizei o meu limitado sonho de anarquista prático e lúcido. Sou livre. Faço o que quero, dentro, é claro, do que é possível fazer. O meu lema de anarquista era a liberdade; pois bem, tenho a liberdade, a liberdade que, por enquanto, na nossa sociedade imperfeita, é possível ter. Quis combater as forças sociais; combati-as, e, o que é mais, venci-as.'' - Alto lá! Alto lá! disse eu. Isso estará tudo muito bem, mas há uma cousa que V. não viu. As condições do seu processo eram, como V. provou, não só criar liberdade, mas também não criar tirania. Ora V. criou tirania V. como açambarcador, como banqueiro, como financeiro sem escrúpulos - V. desculpe, mas V. é que disse -, V. criou tirania. V. criou tanta tirania como qualquer outro representante das ficções sociais, que V. diz que combate. - Não, meu velho, V. engana-se. Eu não criei tirania. A tirania, que pode ter resultado da minha ação de combate contra as ficções sociais, é uma tirania que não parte de mim, que portanto eu não criei; está nas ficções sociais, eu não ajuntei a elas. Essa tirania é a própria tirania das ficções sociais; e eu não podia, nem me propus, destruir as ficções sociais. Pela centésima vez lhe repito: só a revolução social pode destruir as ficções sociais; antes disso, a ação anarquista perfeita, como a minha, só pode subjugar as ficções sociais, subjugá-las em relação só ao anarquista que põe esse processo em prática, porque esse processo não permite uma mais larga sujeição dessas ficções. Não é de não criar tirania que se trata: é de não criar tirania nova, tirania onde não estava. Os anarquistas, trabalhando em conjunto, influenciando-se uns aos outros como eu lhe disse, criam entre si, fora e à parte das ficções sociais, uma tirania; essa é que é uma tirania nova. Essa, eu não a criei. Não a podia mesmo criar, pelas próprias condições do meu processo. Não, meu amigo; eu só criei liberdade. Libertei um. Libertei-me a mim. É que o meu processo, que é, como lhe provei, o único verdadeiro processo anarquista, me não permitiu libertar mais. O que pude libertar, libertei. - Está bem... Concordo... Mas olhe que, por esse argumento, a gente quase que é levado a crer que nenhum representante das ficções sociais exerce a tirania... - E não exerce. A tirania é das ficções sociais e não dos homens que as encarnam; esses são, por assim dizer, os meios de que as ficções se servem para tiranizar, como a faca é o meio que se pode servir o assassino. E V. decerto não julga que abolindo as facas abole os assassinos... Olhe... Destrua V. todos os capitalistas do mundo, mas sem destruir o capital... No dia seguinte o capital, já nas mãos de outros, continuará, por meio desses, a sua tirania. Destrua, não os capitalistas, mas o capital; quantos capitalistas ficam?... Vê?... - Sim; V. tem razão. - Ó filho, o máximo, o máximo, o máximo que V. me pode acusar de fazer é de aumentar um pouco - muito muito pouco - a tirania das ficções sociais. O argumento é absurdo, porque como já lhe disse, a tirania que eu não devia criar, e não criei, é outra. Mas tem mais um ponto fraco: é que, pelo mesmo raciocínio, V. pode acusar um general, que trava combate pelo seu país, de causar ao seu país o prejuízo do número de homens do seu próprio exercito que teve que sacrificar para vencer. Quem vai à guerra, dá e leva. Consiga-se o principal; o resto... - Está muito bem... Mas olhe lá outra coisa... O verdadeiro anarquista quer a liberdade não só para si, mas também para os outros... Parece-me que quer a liberdade para a humanidade inteira... - Sem dúvida. Mas eu já lhe disse que, pelo processo que descobri que era o único processo anarquista, cada um tem de libertar-se a si próprio. Eu libertei-me a mim; fiz o meu dever simultaneamente pra comigo e para com a liberdade. Por que é que os outros, os meus camaradas, não fizeram o mesmo? Eu não os impedi. Esse é que teria sido o crime, se os tivesse impedido. Mas eu nem sequer os impedi ocultando-lhes o verdadeiro processo anarquista; logo que descobri o processo, disse-o claramente a todos. O próprio processo me impedia de fazer mais. Que mais podia fazer? Compeli-los a seguir o caminho? Mesmo que o pudesse fazer, não o faria, porque seria tirar-lhes a liberdade, e isso era contra os meus princípios anarquistas. Auxiliá-los? Também não podia ser, pela mesma razão. Eu nunca ajudei, nem ajudo, ninguém, porque isso, sendo diminuir a liberdade alheia, é também contra os meus princípios. V. o que me está censurando é eu não ser mais gente que uma pessoa só. Por que me censura o cumprimento do meu dever de libertar, até onde eu o podia cumprir? Por que não os censura antes a eles por não terem cumprido o deles? - Pois sim, homem. Mas esses homens não fizeram o que V. fez, naturalmente, porque eram menos inteligentes que V., ou menos fortes de vontade, ou... - Ah, meu amigo: essas são já as desigualdades naturais, e não sociais... Com essas é que o anarquismo não tem nada. O grau de inteligência ou de vontade de um indivíduo é com ele e com a Natureza; as próprias ficções sociais não põem praí nem prego nem estopa. Há qualidade naturais, como eu já lhe disse, que se pode presumir que sejam pervertidas pela longa permanência da humanidade entre ficções sociais; mas a perversão não está no grau da qualidade, que é absolutamente dado pela Natureza, mas na aplicação da qualidade. Ora uma questão de estupidez ou de falta de vontade não tem que ver com a aplicação dessas qualidade, mas só com o grau delas. Por isso lhe digo: essas são já absolutamente as desigualdades naturais, e sobre essas ninguém tem poder nenhum, nem há modificação social que a modifique, como não me pode tornar a mim alto ou a V. baixo... ``A não ser... A não ser que, no caso desses tipos, a perversão hereditária das qualidades naturais vá tão longe que atinja o próprio fundo do temperamento... Sim, que um tipo nasça para escravo, nasça naturalmente escravo, e portanto incapaz de qualquer esforço no sentido de se libertar... Mas nesse caso..., nesse caso..., que têm eles que ver com a sociedade livre, ou com a liberdade?... Se um homem nasceu para escravo, a liberdade, sendo contrária à sua índole, será para ele uma tirania''' Houve uma pequena pausa. De repente ria alto. - Realmente, disse eu, V. é anarquista. Em todo o caso, dá vontade de rir, mesmo depois de o ter ouvido, compara o que V. é com o que são os anarquistas que praí há... - Meu amigo, eu já lho disse, já lho provei, e agora repito-lho... A diferença é só esta: eles são anarquistas só teóricos, eu sou teórico e prático; eles são anarquistas místicos, e eu científico; eles são anarquistas que se agacham, eu sou um anarquista que combate e liberta... Em uma palavra: eles são pseudo-anarquistas, e eu sou anarquista. E levantamos-nos da mesa Lisboa, janeiro de 1922.1 point
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Salve GR, Infelizmente a lista que postei está um pouquinho desatualizada (2010). Pra suprir essa falha já entrei em contato com a Strom, autora da lista, e ela me informou que em breve (até o fim de janeiro) estará pronta a lista de 2012. Assim que ela enviar a nova lista eu atualizo este tópico e aproveito pra fazer um sumário na tentativa de facilitar a busca de acordo com o tema pesquisado. Ainda, a Storm teve o cuidado de dar uma voltinha aqui pelo Grow Room e mandou lembranças pro GatoHaxixado: "Tell GatoHaxixado that he gave me a good laugh! : Never heard that expression before!" Abraços1 point
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povo loco mano! jah ouviram falar de Redução de Danos??? -.- isso foge completamente do espírito da coisa mete logo uma bala na cabeça q é mais rápido1 point
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Yes!!! FLASHBACKS do guru timmy leary é mesmo dez em guedzillaz!!!!! Já li várias vezes e ainda vou ler, este foi o livro que me guiou na minha época de desbunde e as minhas experiências psicodélicas, me fazendo um militante do movimento psicodélico, isso a 11 anos atrás. A edicão que eu tenho é ainda da extinta editora brasiliense que só publicava livros da hora, vários com temas underground, muito bom. Não li ainda a nova edição SURFANDO NO CAOS, não sei como está a tradução mas é um livro que eu recomendo a todos. Os anos 60 foram únicos e Timothy Leary foi um dos principais personagens desta época (Ken Kesey também) sendo o papa do movimento psicodélico, o apóstolo do LSD. TURN IN! TURN ON! AND DROP OUT!1 point