Os Sete Profetas Canábicos
(Terceira Parte)
Jeová
Jeová falava funkês, falava no ritmo, gestos e gírias funkeadas, parecia música, sua fala.
“Alô cumpadi, num tem caô neste mistério, vem de baixo das unhas, fuma que é papo sério...” Dizia contorcendo-se e balançando freneticamente seus dreads, era um mecânico biscateiro, a graxa fazia parte de seus cabelos tofudos, não tinha oficina, fazia os consertos na rua. Suas unhas sempre sujas, de desbelotar a ganja e da graxa dos carros; talvez isto explique alguma coisa.
Jeová, como quase todos os brasileiros, vivia de subemprego, biscates, bicos, e sempre dando um “jeitinho brasileiro” nos carros velhos que apareciam para ele consertar, engatilhar, armengar, remendar, adaptar, acochambrar. Gostava de dançar nos bailes funks; no início bebia álcool e tinha ressaca, não trabalhava bem no outro dia, depois passou a ficar só na maconha, a erva santa, no outro dia estava em forma, e rendia melhor na noite que rolava um “broto no amasso”, o matadouro era a Brasíllia Amarela, estranho, um carro praticamente com o nome da capital do país (um presidente, garotão da terceira idade, O Fusca, relança, realce!). Sua vida girava em torno de brasas, um verdadeiro “brasil”, A BrasA (Brasíllia Amarela) virava sauna, principalmente agora, que colhera sua primeira guerrilla, umas sementes de um “prensadinho de responsa” foram colhidas nesta primavera, e ele iria “até a última ponta da primeira colheita”, ascenderam?
“Jeová, meu nobre, que parada é esta que ocê fumou sujeira de unha e ficou doidão, tá pagando mico?”
“Aí, se liga, na parada, é de baixo pra cima, e de cima pro lado, se poesia não rima, parece esculacho. Agora não contradiz, fuma aí, e depois me diz...”
Jesus e Javé, ironicamente, foram aproximados pela polícia, e agora estavam realizando um movimento social muito interessante, de resgate da infância de rua, das crianças de rua, o apoio social era intenso, o nome “Chacrinha Na Candelária” não resistiu a lembrança da “Chacina da Candelária”, que sobrepunha-se a saudosa lembrança do Chacrinha, então tentou mudar para Candelabradores Mirins, e como algumas leis brasileiras, o nome não pegou, no final o nome eleito pela mídia, Roda Viva, foi o que ficou, e espalhou-se pelo Rio.
Jeová sabia de Jesus e Javé, sabia que fazia parte daquilo, mas ficava no “sapatinho”, só “os chegados”, tudo “sujeito homem”, “sangue bom”, de confiança, sabiam e fumaram a “sujeira da unha”, ou a unha “sujeira”, e todos sonharam, na noite em que experimentaram, com o portal interdimensional, mas na hora não sentiam nada, porém Jeová sentia, ficava transcendente ao fumar a “cerinha”, as vezes coçava a cabeça para “fortalecer” o cerume, pois sempre faltava “cerinha” pra ele, tudo mundo queria ter o tal sonho, e mesmo sendo somente pros chegados, “rolou uma explanação”, estava usando unhas mais compridas para um maior rendimento. Ao invés de ser chamado à delegacia, o delegado foi visitá-lo, queria saber e experimentar o “milagre do sonho”. Jeová pega um clipe, abre-o, raspa embaixo das unhas até que se forme uma bolinha, amassa um pouco esta bolinha e passa uma “goma” para dar melhor consistência e queimar mais lentamente, aproxima o isqueiro da bolinha equilibrada na ponta do arame, acende e em seguida apaga o fogo, deixando apenas uma brasa acesa, e uma fumaça saindo do braseiro, “Brasil da Paz”.
“Alô, alô, vai dar uma cafungada, aí, no Brasil da Paz, doutor? Alô!?”
macerai o hemp 4nov2005