Fernando Molica: O crime da madrugada de sábado
Rio - O aborto é proibido entre nós, os partidos comunistas foram, por muito tempo, impedidos de atuar, a escravidão era permitida por lei. Bebidas alcoólicas chegaram a ser banidas dos Estados Unidos, país onde, não faz tanto tempo assim, havia racismo oficial. Cigarros, há até alguns anos, podiam ser anunciados na TV.
Leis não são imutáveis, variam de acordo com a época, com os hábitos de cada povo. O que era impensável há algumas décadas hoje é considerado normal. Todos mudamos ao longo da vida, é natural que as normas que regem a sociedade também variem.
O bom da democracia é que nossas divergências podem e devem ser explicitadas. Há os que defendem o casamento gay e os que são contra; muitos querem a liberação do aborto, outros nem querem ouvir falar nisso. Isto vale para a pena de morte, para a redução da maioridade penal, para as cotas em universidades, para a limitação da publicidade de alimentos que fazem mal à saúde. As discussões nos fazem crescer, nos obrigam a pensar, permitem que os argumentos sejam expostos, mostram quem defende o quê.
Isso tudo é para ressaltar a absurda prisão, na madrugada de sábado, de manifestantes que divulgavam um ato em defesa da liberação da maconha. Pelo que os jornais publicaram, os sujeitos não estavam fumando maconha e — ao contrário do que fazem anunciantes de bebidas alcoólicas ao falar de seus produtos — não alardeavam supostos benefícios e prazeres relacionados ao uso da erva. Eles apenas exerciam o direito de defender mudanças na lei — o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o governador Sérgio Cabral fizeram o mesmo e, ainda bem, não foram em cana. Já os manifestantes acabaram presos, acusados de apologia às drogas.
Deu trabalho conquistarmos o direito à liberdade de expressão, é fundamental mantê-lo. Não adianta garantirmos apenas a propagação de ideias com as quais concordamos, isto não tem graça. O legal na democracia está na obrigação de respeitarmos as opiniões contrárias. A Constituição garante a todos a liberdade de expressão e de pensamento e este princípio não pode ser atropelado pelo guarda da esquina e/ou pelo delegado de plantão. Eles não podem decidir o que pode e o que não pode ser dito em praça pública. No caso da madrugada de sábado, a única provável ilegalidade foi a prisão dos manifestantes, um aparente abuso de autoridade que merece ser investigado e punido.
Fernando Molica é jornalista e escritor
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Então, não siau como eu imaginava, no de ontem, mas saiu muito melhor no de hoje.
Valeu galera