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Drauzio Varella Dependência De Heroína


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DRAUZIO VARELLA Dependência de heroína

Jornal Folha de São Paulo, 24 de abril de 2010

A HEROÍNA vicia mais que a cocaína, a maconha e as anfetaminas; só perde para a nicotina. As primeiras doses deixam um bem-estar desconhecido, profundo e duradouro, sensação cada vez mais fugaz à medida que se instala a tolerância causada pelo uso repetitivo.

Brasil, o custo desse derivado do ópio faz com que o número de usuários seja restrito, comparado com o dos dependentes de crack/cocaína. Na Europa são centenas de milhares; na América do Norte somam mais de 1 milhão, contingente trágico que desintegra famílias e comunidades e contribui para a disseminação da Aids, das hepatites virais e da criminalidade.

Historicamente, o tratamento da dependência de heroína seguiu duas estratégias opostas.

Adotado em torno de 1920, o modelo britânico preconizava a prescrição da droga para os usuários de classe média que se dispusessem a seguir orientação médica, método que permaneceu em vigor até os anos 1960.

O modelo americano, ao contrário, seguiu o Harrison Narcotics Act, promulgado em 1914, que ameaçava de processo judicial todo médico que prescrevesse a droga.

Abordagens antagônicas como essas nada tinham a ver com as propriedades farmacológicas da heroína, nem com a busca de evidências para encontrar a forma mais eficaz de livrar-se dela, refletiam apenas a postura de cada sociedade em relação ao consumo de drogas ilícitas.

Vieram os anos 1960 e o dilema foi resolvido graças a um trabalho conduzido em Nova York que propunha o uso da metadona, um derivado da morfina, para tratar os usuários. A estratégia consistia em trocar a dependência de uma droga ilícita por outra, produzida pela indústria farmacêutica. A figura do traficante substituída pela do médico; em vez do dinheiro para a compra nas ruas, a receita gratuita aviada nos postos de atendimento público.

Programas de metadona por via oral se disseminaram pelo mundo. Na Inglaterra, substituíram os de prescrição de heroína, porque a classe médica considerou que finalmente havia uma opção terapêutica mais respeitável do que receitar uma droga ilícita para os usuários dela.

Mais uma vez, os interesses profissionais e políticos se sobrepunham às evidências científicas baseadas em análises racionais.

A metadona teve dois méritos: colocou os dependentes em contato com o sistema de saúde e demonstrou ser capaz de diminuir os riscos do abuso de heroína, entre aqueles decididos a mudar de vida. Cerca de 15% a 25% dos usuários inscritos nesses programas, entretanto, abandonam o acompanhamento e voltam a injetar o opioide ilícito.

Pesquisadores canadenses acabam de publicar um estudo no qual 226 usuários crônicos de heroína (caracterizados pelo uso diário, por mais de cinco anos), que já tinham feito pelo menos duas tentativas fracassadas de tratamento com metadona, foram divididos em dois grupos: metade recebeu metadona novamente; os demais receberam injeções diárias de diacetilmorfina, o componente ativo da heroína.

Depois de 12 meses, 46% daqueles que tomaram metadona e apenas 12% dos que receberam diacetilmorfina tinham abandonado o estudo. Os índices de retorno à heroína e de envolvimento em outras atividades ilegais foram de 52% e de 32%, respectivamente.

Entre os 115 pacientes medicados com diacetilmorfina, ocorreram 11 crises de convulsão ou de overdose. Como as injeções foram administradas em ambulatórios médicos, nenhum dos casos resultou em morte. Não houve episódios de overdose entre os que tomaram metadona.

Esses resultados confirmam aqueles obtidos em estudos realizados na Holanda, na Espanha, na Alemanha e na Suíça, país com mais de dez anos de experiência com a prescrição de heroína, programa que, submetido a referendo popular em 2008, recebeu 68% dos votos.

A conclusão dos autores é a de que metadona ainda é o medicamento de escolha, mas que o subgrupo resistente a ela pode se beneficiar da injeção do componente ativo da heroína, como alternativa ao abandono de tratamento e à perda de contato com o sistema de saúde.

Tratar dependência de drogas ilícitas é tema controverso. Alguns países europeus têm enfrentado esse desafio com estratégias menos radicais do que as adotadas nos Estados Unidos.

Em plena epidemia de crack/cocaína, o Brasil mal ensaia os primeiros passos; entre nós, droga ilícita ainda é caso de polícia.

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    • Salve galera, tudo certo?! Alguns anos sem entrar aqui na casinha, mas como eu vi que tem alguns Growers retornando à casa e outros novos chegando, resolvi postar uma "atualização jurídica" (que não é tããão atual assim) para todos os usuários que já "rodaram/caíram" nesses anos todos de cultivo!!  Todos nós sabemos do julgamento do RE 635.659 (Recurso no STF para descriminalização do porte de maconha), agora chegou o momento de revisar as antigas condenações.  Sabe aquela transação penal assinada? Aquela condenação pelo 28 (que não foi declarada inconstitucional na época)?? Aquela condenação do seu amigo pelo 33, mas que se enquadrava nos parametros de um grower??? Pois então, chegou o momento de revisar todos esses processos para "limpar" a ficha de todos(as) os(as) manos(as) jardineiros(as)!! "O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) dará início, em 30 de junho, ao mutirão nacional para revisar a situação de pessoas presas e/ou condenadas por porte de até 40 gramas de maconha ou seis plantas fêmeas. A realização do mutirão cumpre determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) ao julgar recurso sobre o tema em junho de 2024, que resultou na fixação de parâmetros para diferenciar o porte de maconha para uso pessoal do tráfico. Entre o dia 30 de junho e 30 de julho, os tribunais da Justiça Estadual e regionais federais farão um esforço concentrado para rever casos de pessoas que foram condenadas por tráfico de drogas, mas que atendam aos critérios do STF: terem sidos detidos com menos 40 gramas ou 6 pés de maconha para uso pessoal, não estarem em posse de outras drogas e não apresentem outros elementos que indiquem possível tráfico de drogas. De acordo com da Portaria CNJ n. 167/2025, os tribunais atuarão simultaneamente para levantar os processos que possam se enquadrar nos critérios de revisão até o dia 26 de junho. Este é o primeiro mutirão realizado no contexto do plano Pena Justa, mobilização nacional para enfrentar a situação inconstitucional dos presídios reconhecida em 2023 pelo STF. O CNJ convidará representantes dos tribunais que atuarão diretamente na realização do mutirão para uma reunião de alinhamento na próxima semana, além de disponibilizar o Caderno de Orientações." LINK DO CNJ Caso o seu caso se enquadre, ou conheça alguém que também passou por essas situações, sugerimos buscar um Advogado de confiança ou entrar em contato aqui neste tópico mesmo com algum dos Consultores Jurídicos aqui da casinha mesmo!! Bless~~
    • Curitiba é sempre pior parte hahahaha!
    • o teu chegou? o meu já passou por Curitiba mas tá devagar (pelo menos o pior já passou) kkkkkkkkkk
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