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Audiência Pública Interativa


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Audiência Pública Interativa
CCJ : Comissão de Constituição e Justiça
Descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal
20/05/2014 - 09:00 - Sala de Reuniões nº 3, da Ala Senador Alexandre Costa, Anexo II, Senado Federal.
Debater a descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal e a constitucionalidade do art. 28 da Lei nº 11.343, de 2006.

Convidados

Antônio Geraldo da Silva

Presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria

Beatriz Vargas Ramos

Professora da Universidade de Brasília

Dráuzio Varella

Médico

José Alexandre de Souza Crippa

Professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto

José Henrique Torres

Juiz de Direito do Tribunal de Justiça de São Paulo

Maria Lúcia Karam

Presidente da LEAP

Renato Malcher Lopes

Professor Adjunto do Departamento de Ciências Fisiológicas

Ronaldo Laranjeira

Psiquiatra

Rubem César Fernandes

Diretor Executivo da ONG Viva Rio



FONTE

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  • Usuário Growroom

Porte de drogas para consumo pessoal: crime?

A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado (CCJ) se debruçará sobre o tema em audiência pública interativa na próxima terça-feira (20), às 9h.

Proposta por meio do Portal e-Cidadania e apoiada por 10 mil cidadãos, a audiência deve abordar ainda a constitucionalidade do art. 28 da Lei 11.343, de 2006, que instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas. O artigo penaliza "quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar".

O autor da proposta defende que "a lei de drogas criminaliza conduta que não extravasa a vida privada do cidadão. O art. 28 da lei fere o inciso X do art. V da Constituição Federal, que garante como invioláveis a intimidade e a vida privada. Se o cidadão ofende tão somente bens jurídicos pessoais, não há crime".

Logo que soube da proposta, o Senador Valadares, relator do PLC 37, de 2013, apresentou requerimento para realizar a audiência e instruir o projeto. Segundo o Senador, "a proposição é veiculada por meio de um instrumento de participação direta dos cidadãos nas atividades da Casa, o que fortalece a aproximação da sociedade com o Senado Federal. É significativo que, em apenas onze dias, a sugestão de audiência pública tenha recebido mais de dez mil apoiamentos individuais. É uma demonstração de que a sociedade está atenta às matérias que são discutidas e votadas por esta Casa. Ainda que seja um tema polêmico, é preciso reconhecer que ele merece ser objeto do debate público. Consideramos oportuno que esta Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania realize o debate pretendido, especialmente no momento em que analisa e prepara-se para votar o Projeto de Lei da Câmara nº 37, de
2013, que promove alterações extensas e profundas na legislação sobre drogas".

E você, o que acha? Venha participar do debate encaminhando suas sugestões e perguntas por meio do Portal e-Cidadania, em:

http://bit.ly/DrogaCrime

Já é possível participar desde já e, no dia 20, a partir das 9h, faremos a transmissão ao vivo da audiência. No site, você se informa sobre o assunto e conhece a relação de convidados.

Participe também pelo telefone, ligando para o Alô Senado, no 0800 61 22 11.

Fonte: https://www.facebook.com/eCidadaniaSF?fref=photo

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  • Usuário Growroom

Realmente a Maria mandou muitooo bem.

O pessoal do forum não assistiu a audiência? foi muito produtiva! espero que o arquivo de gravação saia para download, estou doido para rever alguns pontos que perdi e espalhar para os amigos.

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  • Usuário Growroom

20/05/2014 - 16h55 Comissões - Constituição e Justiça - Atualizado em 20/05/2014 - 16h55

Apoio à descriminalização do porte de droga para consumo pessoal prevalece em debate

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A descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal foi defendida pela maioria dos convidados reunidos em debate nesta terça-feira (20) na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), em especial por aqueles ligados ao Direito. Já especialistas da área médica pediram cautela e apontaram a possibilidade de aumento do consumo de drogas pela redução da percepção de risco.

Para Maria Lúcia Karam, da entidade Law Enforcement Against Prohibition (LEAP), a criminalização do porte de droga, prevista na Lei 11.343/2006, fere a Constituição Federal. Ela argumenta que a prática oferece perigo apenas à saúde do usuário, dizendo respeito às suas opções pessoais, à sua intimidade e liberdade.

– Em uma democracia, o Estado não está autorizado a intervir em condutas dessa natureza. O Estado não pode tolher a liberdade dos indivíduos sob o pretexto de protegê-los. Enquanto não atinja concreta, direta e imediatamente um direito alheio, o indivíduo é e deve ser livre para pensar, dizer e fazer o que bem quiser — afirmou.

Na avaliação de Maria Lúcia Karam e de Ubiratan Araújo, da ONG Viva Rio, a guerra aos traficantes causa mais prejuízos ao país do que o consumo de entorpecentes. Conforme afirma, não seriam as drogas, mas a proibição do uso das mesmas que causa violência.

– É preciso legalizar a produção, o comércio e o consumo de todas as drogas para, assim, pôr fim ao mercado ilegal e devolver ao Estado o poder de regular, limitar, controlar, fiscalizar e taxar tais atividades, da mesma forma que o faz em relação às drogas já lícitas, como o álcool e o tabaco – disse a representante do LEAP.

Também a professora Beatriz Vargas Ramos, da Universidade de Brasília (UnB), criticou a criminalização do porte de entorpecentes e a ineficiência da política de combate às drogas.

— Em nome de uma abstrata saúde pública, os que defendem a criminalização do uso das drogas, por meio da prisão, têm produzido cadáveres, pessoas que morrem em nome dessa bandeira que é a guerra ao tráfico.

Ela citou estudo feito no Distrito federal, mostrando que 98,7% dos processos que geraram condenação por tráfico dizem respeito a apreensões de até dez quilos de maconha, cocaína e craque. Para a professora, os recursos e o tempo investido no combate às drogas chegam apenas aos “varejistas”, nome dado por ela a pequenos traficantes.

A opinião foi compartilhada pelo juiz José Henrique Torres, do Tribunal de Justiça de São Paulo, para quem a política antidrogas fere diversos princípios constitucionais, como o da racionalidade.

— Gastamos bilhões de dinheiro público, prendemos milhões de pessoas e essas medidas são ineficazes, são pífias – disse, ao ressaltar que as medidas até hoje adotadas não conseguiram conter o narcotráfico ou reduzir os níveis de consumo de drogas.

Riscos

A médica Analice de Paula Gigliotti, representante da Associação Brasileira de Psiquiatria, reconheceu os custos da criminalização, entre eles os gastos para o combate a traficantes e o estigma social do usuário de drogas, mas também apontou custos da descriminalização.

– [Pode haver] um possível aumento do consumo pela redução da percepção de risco e, com isso, o aumento dos danos à saúde. Se há redução na percepção de risco, há aumento de consumo principalmente pelos adolescentes – afirmou.

Em analogia ao cigarro, ela observou que, em 1998, 35% dos brasileiros eram fumantes, índice que caiu para 13% hoje, resultado das medidas restritivas adotadas, como a proibição de fumar em locais públicos, e de campanhas antitabagismo.

Analice Gigliotti disse não haver informações suficientes para embasar mudanças na legislação e sugeriu a realização de pesquisas que possam subsidiar as decisões.

— Afinal, a melhor abordagem para o assunto não é a liberalizante ou a restritiva, mas a certa, e esta nós ainda precisamos descobrir qual é — frisou, ao apontar os diversos prejuízos à saúde pelo uso de entorpecentes.

Também o médico e pesquisador José Alexandre de Souza Crippa, da Faculdade de Medicina da USP, analisou os riscos do consumo da maconha. Ele citou estudo feito na Suécia, que acompanhou 50 mil pessoas por 35 anos e concluiu que o uso de maconha pode aumentar em 370 vezes as chances esquizofrenia. Destacou ainda pesquisas científicas mostrando efeitos negativos sobre áreas cerebrais de usuários da droga, mais evidentes nos jovens.

O professor Renato Malcher Lopes, da UnB, concordou que a maconha pode causar danos irreversíveis ao cérebro dos jovens, mas contestou dados de que o consumo da planta aumentaria o risco de esquizofrenia. Ele é favorável à descriminalização, mas com proibição de consumo para pessoas ainda em desenvolvimento, exceto em casos médicos.

Uso medicinal

Alexandre Crippa defendeu a legalização do uso medicinal de substâncias existentes na plantacannabis sativa, nome científico da maconha. Ele citou o caso da substância canabidiol, que não provoca efeitos psicoativos e reúne propriedades analgésicas e anticonvulsivantes, entre outras. O pesquisador citou as dificuldades dos pais da menina Anny, de cinco anos, em importar medicamento com a substância, para controlar crises convulsivas da filha. O caso foi noticiado pelo programa Fantástico, da TV Globo.

Substitutivo

Na presidência do debate, o senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE) detalhou mudança que apresentou ao artigo 28 da Lei 11.343/2006, que criminaliza o porte de droga. O parlamentar é relator do PLC 37/2013, que reformula a lei. O texto tramita na CCJ.

Conforme explicou, o artigo estabelece que, para determinar se a droga se destina a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.

– Nós achamos que esta redação, quando fala em "circunstâncias sociais e pessoais", é um tanto quanto discriminatória, preconceituosa, dando margem a subjetivismo.

No substitutivo que apresentou ao projeto, ele exclui a expressão e determina que, “salvo prova em contrário, presume-se a destinação da droga para uso pessoal, quando a quantidade apreendida for suficiente para o consumo médio individual por cinco dias, conforme limites definidos pelo Poder Executivo da União”.

Ao final da audiência pública, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) disse que as opiniões apresentadas no debate serão consideradas no relatório que o parlamentar prepara sobre a Sugestão 8/2014, encaminhada por meio do Portal e-Cidadania e que sugere a regulamentação do uso recreativo, medicinal e industrial da maconha.

A sugestão será analisada pela Comissão de Direitos Humanos, Defesa do Consumidor e Legislação Participativa (CDH) e, se acolhida, será transformada em projeto de lei, que passará a tramitar no Senado.

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  • Usuário Growroom

Depoimento de Renato Malcher

O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. PSB - SE) Agradeço as palavras e os esclarecimentos contundentes que foram aqui prestados pelo Dr. José Henrique Torres, juiz de direito do Tribunal de Justiça de São Paulo.Agora, eu passo a palavra ao Dr. Renato Malcher Lopes, neurocientista e professor adjunto do Departamento de Ciências Fisiológicas da Universidade de Brasília.O SR. RENATO MALCHER LOPES Bom dia a todos. É uma honra ter sido convidado e ter a oportunidade de trocar ideias aqui, de conhecer pessoas que eu admiro muito, e avançar, no sentido de esclarecer questões dentro da minha alçada do conhecimento que, certamente, envolve uma perspectiva também como cidadão. Mas eu sou da mesma linha de pesquisa do Dr. Alexandre Crippa. É uma honra especial para mim estar aqui do lado dele, porque é uma referência internacional neste assunto.Vai ser especialmente interessante poder refutar as coisas que ele falou aqui e mostrar que um dos grandes problemas da proibição e da estigmatização que é necessária para mantê-la politicamente foi criar uma tendência de interpretação de resultados na ciência que mais ou mesmo corrobora a essência do que o Dr. Crippa falou de que existe uma influência grande eu não diria de uma visão ideológica, mas de um contexto em que o foco sobre a questão da maconha concentra-se em prestar uma certa sintonia a esse medo de que a maconha faça mal, que é um medo real, mas que não pode nos seduzir a ponto de desviar o nosso olhar de determinados detalhes da pesquisa, que podem ser interpretados de maneira diferente, mas, que, em geral, acabam caindo no que é o menos agressivo para a expectativa que as pessoas têm, sobretudo porque as acusações que pesam sobre o uso da maconha são graves e as pessoas responsáveis, como o Dr. Crippa, estão preocupadas em não errar e em guiar as pessoas pelo caminho errado, como é o meu caso também.Então, eu trouxe um resumo muito curto sobre a essência do que eu acho importante falar, e, no final desse resumo, eu falo um pouco rapidamente sobre as questões que tangem a parte que eu vou contestar um pouco a interpretação do Dr. Crippa. E eu espero que eu tenha bastante tempo para desenvolver isso, até porque eu não trouxe eslaides. Mas eu trouxe algumas referências aqui comigo que vão me ajudar.Então, vou fazer uma leitura um pouco rápida para adiantar então a essência do que eu vou falar; e, depois, eu vou entrar em detalhes da reinterpretação dessa discussão sobre a interpretação da ciência.Bom, (...)11:16

Bom, todos nós sabemos que existe uma certa disparidade entre o senso comum de que as drogas proibidas são necessariamente as que fazem mais mal. Mas essa discussão realmente não é uma discussão tão relevante, porque o fato é que a pior droga é aquela com a qual a pessoa tem problemas, a despeito de a droga ser considerada proscrita ou não. É importante levar em conta que a maioria das pessoas que usam drogas não têm problemas de abuso, e aquelas que têm problemas causados pelo abuso precisam de ajuda e, obviamente, não de punição.Em geral é importante ressaltar , as pessoas que desenvolvem dependência problemática são pessoas que possuem um histórico de vida sofrido e são privadas de estrutura familiar e oportunidades, ou são pessoas que sofrem de problemas psico ou neuropsiquiátricos subjacentes e que encontram na droga uma situação que complica o seu quadro, mas que as diferencia de outros usuários e que as torna mais propensas a ter esse uso complicador.A criminalização do uso simplesmente não inibe o uso. Não faz diferença criminalizar essas pessoas, já que elas fazem uso de droga para aliviar sofrimentos mentais e físicos intensos, imediatos e constantes. Quando se vê um cara na rua, na miséria, fumando crack, o crack não foi a causa da miséria dele. O crack é um anestésico existencial de dores psíquicas e físicas. Todas as drogas que causam dependência e abuso são substâncias que aliviam dores físicas e psíquicas. O crack não é a causa da desgraça daquela pessoa. Ele é um remédio mal usado por aquela pessoa, um remédio que tem uma série de efeitos colaterais, mas não é a causa. Então, precisamos entender que aquela pessoa acorda num pesadelo. A vida dela é muito melhor quando ela está dormindo do que quando ela acorda. Quando ela acorda num pesadelo, a droga é o que ela encontra para aliviar o seu sofrimento. Portanto, não adianta criminalizar essa pessoa. Não é isso que vai mudar a situação dela.Então, criminalizá-las amplia esse sofrimento, porque vai se estigmatizar por prejudicar a sua autoestima, o que, por conseguinte, amplia a sensação de exclusão, rejeição social e revolta, que são sensações que, obviamente, favorecem a manutenção do abuso da droga e não a inibem. Além disso, criminalizar afasta as pessoas do tratamento.Em relação especificamente à maconha eu vou aqui falar de uma forma sucinta e, depois, vou pormenorizar em função do que o Dr. Crippa detalhou, mas interpretando de uma forma bem diferente da dele , os problemas, em geral, estão associados, sobretudo, á composição da planta, à idade de quem usa e à condição neuropsicológica da pessoa que usa.O excesso de THC e a baixa concentração de canabidiol podem levar a estados de ansiedade e paranoia em qualquer pessoa. Na grande maioria das pessoas, esses efeitos são passageiros e sem maiores consequências. Entretanto, entre adolescentes que possuem histórico familiar de esquizofrenia ou que estão na fase inicial da doença, quando ela ainda não é diagnosticada, mas já existem sintomas que podem levar a pessoa a usar a droga, esse estado de ansiedade exacerbada causado pelo excesso de THC pelo desencadear um surto, que pode ser o primeiro surto da pessoa. Mas é errado dizer que a maconha causa esquizofrenia.(Palmas.)Essa possibilidade de desencadear o surto é um problema sério sobre o qual nós temos que atuar, e não podemos ignorá-lo isso é óbvio. Mas as pessoas das quais estamos falando são pessoas que fazem parte de um grupo de risco. Existe um artigo de Harvard, que vou citar daqui a pouco e que foi publicado neste ano, que mostra que a associação do uso de maconha com esquizofrenia tem a ver apenas com pessoas que têm histórico de esquizofrenia na família; não é uma coisa causada pela maconha. Há uma tendência de que a própria esquizofrenia leva ao uso da maconha, porque a maconha, dependendo da concentração de canabidiol, pode aliviar a ansiedade. Portanto, pessoas na fase prodrômica da doença que têm ansiedade podem gostar de usar maconha por causa disso. Então, é comum, é esperável que pessoas que tenham ansiedade, usem maconha e sintam alívio de ansiedade tendam a continuar a usar e fazer até um uso pesado. Quando isso acontece nesses adolescentes, isso é um problema. É uma automedicação feita de uma forma... (...)11:21

a indicação feita de uma forma inapropriada porque complica a situação deles. Agora, esse é um universo de pessoas que corresponde mais ou menos ao máximo que a gente pode esperar de incidência de esquizofrenia no mundo, que é em torno de 1%. Não é que mereçam menos atenção, mas merecem uma atenção focada.Então, do ponto de vista da saúde pública, o ideal, portanto, tendo uma perspectiva bastante objetiva e não ideológica, como falou o Dr. Crippa, é que as pessoas adultas saibam o conteúdo de canabinóides do que estão consumindo, que haja um teto máximo para a proporção de THC e que as vendas sejam impedidas para adolescentes, a não ser no caso do uso médico dos seus derivados, quando haja a recomendação e o acompanhamento de um médico.E eu quero colocar uma coisa que foi falada pelo Dr. Crippa e foi um exemplo muito bom de um de um dos grandes impactos da proibição, ou seja, o prejuízo sobre a ciência, sobre a subjetividade a qual todos nós, cientistas, estamos sujeitos. Nós vivemos num contexto social, nós ouvimos coisas dos nossos pais, da nossa família, da sociedade que influenciam a nossa formação moral, nossas preocupações com o bem-estar das pessoas, da mesma forma que qualquer pessoa. Não é porque somos cientistas que o nosso cérebro passa a funcionar como um computador. Portanto, é importante, no meio acadêmico, termos consciência disso, termos consciência que os dados podem ser interpretados de formas diferentes e é por isso que existe uma ampla discussão sempre em torno da interpretação dos dados.Já quase entrando na questão com o Dr. Crippa, quero colocar aqui algo que eu acredito que vai espantar a todos vocês da mesma forma que me espantou e me comoveu também.O Dr. Crippa falou do caso da Katiele e da filha dela, Ane, que tem um caso grave de epilepsia. A Katiele ficou sabendo, através da Internet, que uma família nos Estados Unidos estava usando clandestinamente um óleo de maconha rico em canabidiol. Ainda que tenha os outros componentes, ele era especialmente rico em canabidiol com pouca concentração de THC. E ela viu que esse uso clandestino surtiu efeito nesse caso. Assim, após um tempo com os vários estados americanos regulamentando o uso médico, surgiu um comércio regular dessa substância e ela conseguiu trazer ilegalmente para o País, experimentou e deu certo. E a vida da filha dela simplesmente deixou de ser um pesadelo rumo a uma possível morte para ser uma outra história. Ela renasceu praticamente. Isso não é um caso isolado, existem muitos casos de epilepsia adulta e infantil, existem muitos casos de epilepsia parecidos com o dela. E para vocês terem uma ideia, eles são tratados com remoção do hemisfério inteiro do cérebro, certo? E vou falar aqui para vocês o que há de mais chocante nisso. Vou aproveitar tomar água para retomar a atenção do Prof. Cristovam, porque é muito importante que ele ouça isso. O primeiro caso, o primeiro artigo científico do mundo ocidental formal, relatando os efeitos medicinais da maconha foi escrito por um médico irlandês que estava fazendo serviço na Índia, na época em que a Inglaterra estava colonizando a Índia. O nome dele é um nome esquisito que não sei pronunciar direito até hoje, William Brooke O'Shaughnessy. Esse artigo data gente, preste atenção de 1843. Exatamente no dia 4 de fevereiro de 1843, ele publicou um artigo descrevendo os usos de tintura de cannabis indica. Ele fez um extrato alcoólico de cannabis indica e um dos casos que ele relata em 1843 é de uma menina recém-nascida que estava padecendo a ponto de quase morrer de convulsões intratáveis. Eles tentavam usar opióides e outras coisas na época e nada dava certo. E ele usou tintura de cannabis indica e curou, curou não, interrompeu essa série de epilepsia.Parem para pensar nisso. Em 1843, já se conhecia algo que poderia ter salvo tantas e tantas vidas, poderia ter se evitado tanto sofrimento e não se fez por causa da proibição. (...)11:26

por causa da proibição. Esse surgimento de toda essa questão em torno do uso para a epilepsia fez com que algumas mães participassem da marcha da maconha no Rio de Janeiro, e uma dessas mães falou o seguinte em O Globo, em declaração pessoal, que algumas pessoas dizem que o movimento pela legalização, regulamentação da maconha está abusando desses casos. Ela falou: "Não, nós é que estamos agradecendo a eles por expor essa aberração". Isso porque foi a proibição que impediu o desenvolvimento da ciência em torno do uso da maconha desde então e não há nada que justifique uma guerra para impedir que se administre uma questão que pode ser administrada de forma racional e não ideológica, não pela ideologia da guerra.Vou agora detalhar sobre as coisas que o Dr. Crippa falou para mostrar o exemplo muito interessante de como o contexto influencia na interpretação das coisas. Nós somos cientistas, não somos robôs. O artigo que ele citou e que argumenta sobre a relação da maconha com a esquizofrenia afirma que aumenta em 370 vezes a chance de relação da maconha com a esquizofrenia. Eu queria esclarecer exatamente do que ele está falando para vocês verem que a coisa pode ser vista de uma forma muito diferente. Esse artigo mostrou o seguinte: se você pegar e olhar o histórico de pessoas que usaram maconha aos 15 anos e for ver o grupo dessas pessoas que desenvolveram esquizofrenia e comparar com o grupo de pessoas que nunca usaram maconha e ver o número delas que desenvolveram esquizofrenia, você vaio ver que, entre o grupo das pessoas que usaram maconha, em torno de 12% delas foram diagnosticadas, eventualmente, com esquizofrenia, enquanto que no grupo dos que nunca usaram maconha, cerca de 3,5% tiveram esquizofrenia. Ou seja, o valor que ele falou que tem 3,5% mais chances, na verdade, é que tem 3,5% mais pessoas que tiveram esquizofrenia no grupo dos que usaram maconha do que no que não usaram.Vou repetir: dentre as pessoas que usaram maconha com 15 anos, na idade adulta, 12% foram diagnosticados como esquizofrênicas. Dentre as que não usaram, apenas 3,5% foram diagnosticadas como esquizofrênicas. Ele falou de um jeito que parece que se conclui, diretamente, que há causalidade. Mas não há causalidade; há correlação.Vou falar uma coisa para vocês que é muito clara da influência do contexto estigmatizado sobre a interpretação de correlação na pesquisa de canábis. Correlação não indica causalidade. Um exemplo disso é que existe um estudo que mostra correlação estatisticamente comprovada de que em países onde se consome mais chocolate per capta são os países que tem mais Prêmio Nobel per capta. Ninguém aqui acha que chocolate causa ganho de Prêmio Nobel. Existe uma correlação mas não existe uma causalidade.O resultado do trabalho que o Dr. Cripper expor, na verdade, apresenta duas hipóteses. A primeira hipótese de que a maconha pode causar esquizofrenia quando as pessoas a usam aos 15 anos. A segunda hipóteses é que pessoas que têm tendência a esquizofrenia podem ter mais chances de gostar de usar maconha e aderir ao seu uso a partir dos 15 anos. O interessante é que o próprio artigo que ele citou tem uma análise que é a seguinte: essas pessoas também tinham uma detecção dos seus quadros de saúde mental aos 11 anos de idade no mesmo artigo que ele mostrou. Quando eles pegam... O Dr. Crippa quer responder, vai ser ótimo.Quando eles pegam e tiram do grupo das pessoas que usaram maconha aos 15 anos aquelas que já tinham problemas psiquiátricos aos 11, a diferença deixa de ser significativa. Ou seja, isso implica que a hipótese de causalidade está sendo enfrentada por uma outra hipótese, a hipótese de comorbidade, isto é, que as pessoas que têm algum problema (...)11:31

que antecede o diagnóstico de esquizofrenia pode levá-los a usar maconha.Esse conceito foi comprovado pelo seguinte, a interpretação que ele deu gerou a hipótese de que se aumentasse o uso de maconha numa população, aumentar-se-ia o número de esquizofrênicos, essa é a hipótese que deriva da conclusão dele. E o engraçado é que essa hipótese foi testada várias vezes. Um dos artigos eu trouxe aqui para mostrar foi feito pela Schizophrenia Research, em 2009. Eles verificaram um aumento muito grande de uso de maconha entre a década de 70 e a década de 90. Eles foram estudar se o que o Dr. Crippa postulou é verdade ou não, ou seja, se esse aumento causava um aumento na quantidade de esquizofrenia. A conclusão é a seguinte. Vou ler em inglês para depois traduzir: "In conclusion, this study did not find any evidence of increasing schizophrenia or psychoses in the general population from 1996 to 2005." Ou seja, a despeito de um aumento no uso... (Soa a campainha.)O SR. RENATO MALCHER LOPES ... de maconha, não houve um aumento... Todo mundo teve mais tempo. Esse sinal é para eu parar de falar?Desculpa. Todo mundo teve mais tempo.O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. PSB - SE) O senhor teve um tempo bastante razoável.O SR. RENATO MALCHER LOPES Tudo bem.O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. PSB - SE) Só falta um orador.O SR. RENATO MALCHER LOPES Estou acabando, então.O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. PSB - SE) Depois o Dr. Crippa quer responder...O SR. RENATO MALCHER LOPES Claro.Esse mesmo artigo que estou citando cita outros artigos que corroboram essa hipótese, ou seja, outros lugares onde houve aumento do uso da maconha, mas não houve aumento de incidência de esquizofrenia.Mas há um caso interessante em Zurique. Nesse caso, se verificou que havia, antes da década de 70, uma tendência de queda nos diagnósticos de psicose na cidade de Zurique, que fica na Suíça. Eles viram que essa queda foi revertida na década de 90. Eles perceberam que essa reversão na queda não de diagnóstico de psicose, mas de entrada no hospital com os sintomas de psicose, ou seja, com surtos ou com outros sintomas paranoicos , uma reversão nessa tendência de queda. Eles associaram isso a algo que é o foco que temos que ter, que é a comercialização ilegal de maconha com excesso de THC. Então, a maneira realmente não ideológica, realmente objetiva, preocupada com a questão da saúde pública em relação à possibilidade de antecipar um evento psicótico em pessoas que tenham tendência à psicose, é controlar a quantidade de canabinoides para que os adultos conheçam o que estão consumindo, para que o Estado impeça o excesso de THC. Se vocês forem ao mercado e procurarem, acho que ninguém vai achar uma bebida alcoólica...(Soa a campainha.)O SR. RENATO MALCHER LOPES ... com 50% de álcool. É importante que os adolescentes não usem.Eu queria falar sobre mais duas coisas com relação ao Q.I.(Soa a campainha.)O SR. RENATO MALCHER LOPES ... eu li o artigo que o Dr. Crippa...O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. PSB - SE) Para finalizar, professor.O SR. RENATO MALCHER LOPES É?O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. PSB - SE) Já estamos bastante adiantados...O SR. RENATO MALCHER LOPES Eu falei tanto assim? Eu acho que o outro pessoal falou mais do que eu.(Soa a campainha.)O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. PSB - SE) Vamos encerrar?O SR. RENATO MALCHER LOPES Posso só concluir? É que em relação...O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. PSB - SE) No debate, V. Sª vai ter toda oportunidade de falar.O SR. (Não Identificado) (Fora do microfone.) Só mais um pouco, Senador.O SR. RENATO MALCHER LOPES Tudo bem.O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. PSB - SE) Mais dois minutos para V. Sª concluir.O SR. RENATO MALCHER LOPES Tudo bem, mais dois minutos.Em relação ao Q.I., é importante dizer que as pessoas que estão em fase de desenvolvimento não devem usar a maconha, a não ser que haja uma relação custo-benefício num contexto controlado de uso médico, que é diferente do...(Interrupção do som.)O SR. RENATO MALCHER LOPES ... porque o cérebro dela está (Fora do microfone.) em desenvolvimento, certo? Agora, a gente tem que ter a medida certa da verdade, para tomar os caminhos corretos. O Dr. Crippa citou um artigo que ganhou manchetes, dizendo que o uso de maconha diminuía o Q.I. em oito pontos, certo? Esse artigo foi refutado na própria Proceedings of the National Academy of Sciences, o jornal que o publicou, porque eles verificaram que essa diferença de oito pontos, na verdade, se devia a fatores socioeconômicos. O que é o Q.I.? O Q.I. não é o modelo do chip do nosso cérebro, o Q.I. é um teste de desempenho intelectual. Sabe-se que se você pegar uma pessoa que ficar um ano a mais no colégio em relação a outra que ficar um ano a menos, pode ter três pontos a menos de Q.I. Se ela ficar dois anos a mais (...) (...)11:36

Se ela ficar dois anos a mais, ela pode ter sete pontos a mais de QI. Então se verificou que, na verdade, era uma questão socioeconômica. Em relação às alterações de estrutura do cérebro, é importante dizer que pessoas que têm ansiedade, depressão, que passaram por algum período de estresse crônico possuem alterações no cérebro que são semelhantes às alterações encontradas em artigos que olham para o cérebro das pessoas quando elas já abusam da maconha. Não quer dizer que a maconha causou essa alteração. Essa alteração pode ser um diagnóstico de uma condição subjacente que pode causar ansiedade e leva as pessoas ao abuso de drogas. Mas não descarta a possibilidade. O abuso deve ser evitado e tem que ser evitado com um discurso realmente objetivo, cristalino, profundo na análise dos dados. A gente tem um compromisso muito grande na ciência de não guiar as pessoas para o caminho errado. Então, falar sobre os limites do que é bom e ruim sobre a maconha é importante para que as pessoas saibam a verdade e não que fiquem assustadas, porque a educação é feita com consciência, não com medo. (Palmas.)O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. PSB - SE) Agradeço ao Sr. Relator Malcher Lopes, Neurocientista e Professor Adjunto da Universidade de Brasília.

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