Caros amigos,
Fui detido e maltratado pela polícia no Planeta Atlântida. O motivo: portar duas gramas de cannabis. Assim como Gilberto Gil em 1978, também fui preso e submetido a humilhações, assim como a amiga que me acompanhava.
Sou estudante da UFSC desde 2002, onde cursei química e hoje curso economia. Tenho 27 anos, aparento classe média, com cabelos louros e olhos azuis; uso óculos e, apesar de esguio, pratico esporte, faço academia, cuido da alimentação — até por ter tido um câncer de tiróide, que me obriga tomar levotiroxina sódica diariamente — não fumo cigarro e não costumo beber álcool por não gostar de passar mal; aparento um estudante saudável. Digo isso, porque logo em seguida começou a chegar mais e mais jovens, e assim a noite inteira, a maioria negros, com tatuagem, cabelo raspado, calça larga, tênis de sk8 etc… o público de Marcelo D2, do Rappa, do Skank!!!
Eu demonstrei conhecimento e por isso não fui submetido ao mesmo tratamento. Mas os negros ajoelharam no chão de cara pra parede, tiveram o asqueroso gritando na orelha, ameaçando lamber o pescoço (?!!). Abuso de poder? Vai reclamar. Tenho know how acerca do Delta 9 tetrahidrocannabinol, sua história, sua aplicação econômica, sua química, suas propriedades farmacológicas, as reais razões de sua perseguição e endemonizamento. Mesmo assim, tive que ouvir em silêncio um comandante semiobeso mórbido de cerveja, com os dentes pretos e amarelos de cigarro, gritando comigo tons chulos e erros grotescos de português, ameaçando obrigar-me a comer merda. Minha amiga também teve que se submeter a tirar a roupa e agachar.
Este tratamento desumano não pode prosseguir. Precisamos urgentemente de uma política de tolerância, como na Europa. Os jovens ali foram pra ouvir músicas que defendem isso, a legalização, D2, Skank, Rappa, o que são estas palavras, meu Deus! O que se espera que as pessoas façam? Que público se espera que vá lá?
No meio daquela loucura, olhei para um jovem que chorava desesperado… só queria ficar feliz, comemorar, vivenciar a VERDADE da festa, que lucrou dos tabagistas de maconha e se dirigiu para ele buscando bandas afins. Seria uma ratoeira?
É impossível ficar feliz com medo o tempo todo. A segurança de festas assim, tem que saber dialogar com a juventude. O fato de um ministro fumar, ter sido preso no passado e ser muitíssimo bem sucedido não ensinou nada em Santa Catarina?
Por fim, incorreram em uma grosseria jurídica, abuso de poder, referindo-se à lei 9099/95, desrespeitando a nova lei que a substituiu, lei 11343/2008 (que garante o tratamento digno e humano, proibindo coação neste caso, como detenção temporária, podendo apenas pedir o comparecimento a um juizado competente, no caso deste não existir no local). Os praças, pude perceber, ficaram com dó de mim, me trataram com dignidade, mas o comandante parecia, ele sim, ter usado alguma droga, transtornado, bufando, exalando seu pulso de morte. Me expulsaram do Planeta, mas comprei outro ingresso e voltei, porque não ia deixar eles estragarem minha noite. A alegria e a arte é mais forte que a violência. Me diverti demais (apesar de ficar sempre com medo dos pelotões que atemorizava a multidão, valeu a pena, parabéns à RBS e Atlântida). A sensação de impotência e indignação vão morrer dentro de mim, porque sei que nada acontecerá e ao escrever isso só aumento o risco de repressão.
Mas o meu grito é para vocês, porque vocês são jovens do bem como eu. Quem sabe vocês não me ajudam a desabafar em nome de centenas de jovens que sofrem isso todos os dias.
Lucas de Oliveira
Presidente da Juventude Socialista do PDT
Florianópolis
Fonte: Blog do Cacau Menezes